Uma nova globalização está nascendo com a transformação digital, fenômeno que produz profundas mudanças na forma como a tecnologia é criada, gerenciada e consumida. O resultado é que estamos sendo surpreendidos por múltiplas rupturas, à medida que inovações como big data, inteligência artificial, realidade virtual, robótica, internet das coisas, entre muitas outras, alteram as formas de trabalho, com impactos para trabalhadores, fornecedores e clientes de todas as organizações, públicas ou privadas, em todos os cantos do globo. Esses fenômenos já estão derrubando velhos modelos de negócios e colocando em xeque as organizações que não conseguem se ajustar, anunciando uma nova era na história econômica, social e política.

É, pois, imperativo que pensemos nas nossas crianças e jovens diante dessa realidade de transformações profundas que vive a sociedade. A indústria 4.0, baseada na proliferação de dispositivos inteligentes e interconectados nas cadeias de produção e de logística, chega avassaladora e ninguém consegue antever quantos empregos serão perdidos ou criados na medida em que robôs e algoritmos ganham espaço no nosso dia a dia. Que impactos terão na formação e na motivação das novas gerações as insistentes notícias de que a inteligência artificial e a automação destruirão empregos ao redor do mundo? Teremos, nós, a capacidade de alcançar um futuro tecnológico que nos sirva ao invés de nos escravizar?

O pesquisador da Universidade de Harvard David Deming nos traz um alento com o estudo publicado em 2017, A crescente importância de habilidades sociais no mercado de trabalho, que demonstra, ao contrário de muitas previsões catastróficas, um aumento na oferta de empregos para funções que requerem alto grau de interação humana. Ele mostra ser pouco provável que softwares e sistemas inteligentes se tornem mais capazes que nós, humanos, na execução de tarefas que envolvam relações complexas e dependam de empatia, como ensinar, aconselhar e cuidar, por exemplo. E mesmo as profissões baseadas na transformação digital, na inteligência artificial, na robótica e afins exigirão habilidades de relacionamento e cooperação cada vez mais sofisticadas e necessárias ao trabalho em equipes, que, por sua vez, serão cada vez mais diversificadas.

Portanto, será fundamental que os jovens tenham a mente aberta e busquem ser muito bons no trabalho coletivo e na colaboração com outras pessoas. Um enorme desafio considerando que a sociedade moderna caminha na direção inversa, com crescente número de jovens que dedicam cada vez mais tempo aos computadores, TVs e smartphones que às relações e interações diretas com outras pessoas. E, pior, muitos tem sido capturados pela polarização e pelos embates, muitas vezes agressivos, que emergem da Internet e das mídias sociais.

Sebastian Gallander, que é diretor-executivo da Fundação Vodafone, na Alemanha, organização dedicada a fortalecer a coesão social na era digital, destaca o Movimento Escoteiro por se constituir em um caminho para o fortalecimento das habilidades dos nossos jovens, em especial as aptidões que não são inatas e precisam ser adquiridas e desenvolvidas desde a mais tenra idade. Interessantemente, escolas inglesas já desenvolvem programas-piloto que buscam sinergia e complementaridade com o Movimento Escoteiro, com resultados muito positivos, como melhorias na liderança, na comunicação e no relacionamento geral dos alunos com a escola.

O Movimento Escoteiro foi fundado em 1907 pelo general inglês Robert Baden-Powell que, sem incorporar a rigidez militar ao movimento, aproveitou os elementos positivos de fomento à camaradagem, iniciativa, coragem e autodisciplina para consolidar um movimento juvenil mundial, sem fins lucrativos e fortemente fundado na educação e no voluntariado. Por meio desse Movimento, meninos e meninas aprendem o que importa na vida em geral, de que maneira se organizar em pequenos grupos, como lidar com conflitos e ajudar os outros, práticas que conduzem a compreender e gradualmente incorporar valores como solidariedade, perseverança e resiliência, essenciais numa sociedade em transformação, repleta de desafios.

Trata-se, na verdade, de um fenômeno global, como demonstram os números antecipados para o seu próximo encontro — denominado Jamboree Mundial— a ser realizado em julho/agosto de 2019 nos EUA. Ali estarão reunidos 50 mil jovens de mais de 160 organizações escoteiras nacionais representando mais de 200 nações e territórios, em uma celebração única de intercâmbio cultural, compreensão mútua, paz e amizade. No Brasil, o Movimento Escoteiro conta com mais de 105 mil participantes – entre jovens e cerca de 25 mil adultos voluntários, em mais de 600 cidades.

O escotismo é, portanto, um dos melhores exemplos de esforço coletivo para promover habilidades sociais e emocionais nas nossas crianças e jovens. A palavra “escoteiro” significa “explorador”, o que vai na frente, o que dá a notícia do que está para acontecer,  de modo similar aos muitos pioneiros que contribuíram para a construção da nossa história. Neste momento de mudanças profundas que a sociedade vive, é fundamental valorizar e jogar luz nessas experiências exitosas que contribuem para a formação e crescimento das nossas crianças e jovens, que precisam ser norteados a se tornarem cidadãos ativos e agentes de mudança positiva neste mundo mutável e desafiador à nossa frente.

Maurício Antônio Lopes 

Presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária e membro voluntário do Grupo Escoteiro Gavião Real

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