Uma equipe do Instituto Mamirauá resgatou uma fêmea de boto-vermelho, conhecido na região como boto cor-de-rosa, presa em uma rede de pesca no início de agosto, no lago Jutaí, estado do Amazonas. Uma das pesquisadoras registrou o momento em que o boto foi desenrolado da rede e solto, assista ao vídeo a seguir:
Daiane da Rosa, pesquisadora do Instituto Mamirauá, conta que na manhã de sábado, dia 4, a equipe finalizava um trabalho de monitoramento de botos na hora do ocorrido. Ao atravessar o lago, avistaram um animal da espécie Inia geoffrensis, o boto cor-de-rosa, com um comportamento que chamou a atenção.
“O boto estava sempre ‘subindo’ no mesmo lugar, perto ou quase em cima daquela malhadeira (tipo de rede de pesca), na hora suspeitamos que ele estivesse enrolado”, aponta Daiane, que é membro do Grupo de Pesquisas em Mamíferos Aquáticos Amazônicos (Mamaq) do Instituto Mamirauá. A pesquisadora se refere à rotina de respiração dos botos, mamíferos aquáticos que precisam subir à superfície da água em busca de oxigênio para respiração.
“Quando chegamos perto vimos que realmente era um boto vermelho jovem, fêmea, e que estava muito enrolada na malhadeira. Então começamos o processo de organização na voadeira (barco a motor) para tirarmos ela da rede”.
No barco do grupo, não havia tesouras, facas ou qualquer objeto cortante para romper a malhadeira, uma grande rede que, segundo calculam, tinha entre 4 e 5 metros de comprimento. O primeiro passo então foi retirar a rede de pesca do ponto onde estava amarrada, para soltar o boto com mais facilidade, trabalho feito pelos assistentes de pesquisa Joney Carvalho e Alcibdes Martins.
Aparentando cansaço e com dificuldades de respirar, a fêmea de boto cor-de-rosa se mexia inquieta durante todo o salvamento. “O Alcibdes foi essencial para conseguirmos salvar o boto. Ele teve a calma e paciência para soltar a rede manualmente e em um tempo curto, de mais ou menos quinze minutos”, informa a pesquisadora Thayara Carrasco.
“Quando terminamos o resgate, a fêmea de boto sumiu e demorou a subir de novo à superfície, chegamos a temer que o animal tivesse afogado, mas depois de um tempo ela voltou a aparecer próximo a um monte de capim flutuante”, relembra Daiane da Rosa.
Apesar de relatos de botos presos em redes de pesca serem comuns entre pescadores e moradores de comunidades ribeirinhas, essa foi a primeira vez que os pesquisadores se depararam com um caso de boto acidentalmente enredado na região.
Por mais de dois anos, o grupo do Instituto Mamirauá tem realizado trabalhos periódicos em setores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, no Amazonas, como o lago Jutaí, onde a fêmea de boto cor-de-rosa foi encontrada. O objetivo das expedições, que acontecem a cada dois meses, é fazer a contagem de tucuxis, de coloração cinza, e botos vermelhos em porções de lagos e rios da reserva para fazer uma estimativa populacional, pensando na conservação das espécies.
O Instituto Mamirauá é uma unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
Redes de pesca são grandes ameaças a botos e outros mamíferos aquáticos
“A captura acidental em redes de pesca é, nesse momento, a maior ameaça para todos os cetáceos no mundo inteiro. Botos, baleias, golfinhos e outros”, afirma Miriam Marmontel, pesquisadora líder do Grupo de Pesquisas em Mamíferos Aquáticos Amazônicos (Mamaq) do Instituto Mamirauá. “É um assunto muito preocupante que, infelizmente aqui na Amazônia, não temos quantificação”.
A especialista indica que botos e pescadores dividem áreas de interesse, com grande presença de peixes. Atraídos pelo pescado capturado nas malhadeiras, os botos acabam também se tornando prisioneiros das redes. “Geralmente o pescador fica com raiva dos botos por terem comido o peixe da rede, muitas vezes eles prejudicam a malhadeira, destroem, a rede tem que ser consertada, então tudo isso gera conflitos entre pescadores e botos”, ressalta Miriam.
“Os pescadores que usam a malhadeira precisam estar atentos e checar suas redes de maneira mais frequente possível, para evitar que animais se emalhem e, no caso do boto, afoguem, porque são mamíferos e precisam do ar para respirar. E que, em caso de emalhe, que o pescador possa socorrer o boto e soltá-lo, sem agredir ou matar”, recomenda.
A pesquisadora Daiane da Rosa também reforça a importância de ações de educação ambiental em comunidades pesqueiras. “É fundamental informar o que pode ser feito em caso de emalhe, para evitar a mortalidade dos botos. Educar, conscientizar e informar, são pilares para conseguirmos o apoio daqueles que estão lá no dia a dia da pesca”.
O boto-vermelho ou boto cor-de-rosa já foi considerado um animal vulnerável, segundo a Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e hoje consta na classificação como “dados insuficientes” (data deficient), passando por nova avaliação por conta da quantidade limitada de dados abrangentes sobre a ecologia, populações e ameaças à espécie na Amazônia.
Texto: João Cunha
FONTE: INSTITUTO MAMIRAUÁ – https://www.mamiraua.org.br/pt-br/comunicacao/noticias/2018/8/16/boto-cor-de-rosa-e-salvo-por-equipe-do-instituto-mamiraua-apos-ficar-preso-em-rede-de-pesca-no-amazonas-assista-video/
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