Estudo acompanhou comunidades pesqueiras em uma área de proteção ambiental no estado do Amazonas.

A pesca é ofício e universo de saberes aprendidos entre pais, mães e filhos. Habitantes, seja das águas doces ou salgadas, de mares, lagos, rios e igarapés, as pescadoras e pescadores produzem e compartilham conhecimentos em comunidade e com atenção aos sinais da natureza. Um estudo conduzido pelo Instituto Mamirauá acompanhou a produção e reprodução de técnicas ligadas à atividade, a partir dos conhecimentos de pescadores que vivem em uma área de proteção ambiental no estado do Amazonas.

“A pesca está entre as atividades mais praticadas na região amazônica e sua produção é voltada tanto para o autoconsumo, quanto para venda, e sua realização depende do profundo conhecimento/habilidade dos pescadores”, afirmam os autores. O trabalho científico é assinado pelos pesquisadores Rônisson de Oliveira, do Instituto Mamirauá, Nelissa Peralta, da Universidade Federal do Pará e José Cândido Ferreira, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O trabalho científico conta com financiamento de bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e tem apoio, para as atividades de campo, da Fundação Gordon and Betty Moore.

O foco da pesquisa esteve em três comunidades ribeirinhas na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã, região central do Amazonas. A reserva é uma das maiores unidades de conservação no Brasil, com mais de 2 milhões de hectares. Em Amanã, a pesca está entre as atividades mais praticadas pelos moradores, ao lado da agricultura e do extrativismo.

As comunidades escolhidas para a análise foram Nova Macedônia, Vila Nova e São Paulo, todas pertencentes ao setor Coraci, no interior da reserva. Para entender melhor as práticas e como são construídos os saberes entre pescadores da região, o pesquisador Rônisson de Oliveira coletou imagens, anotações, realizou entrevistas e fez um trabalho etnográfico, acompanhando de perto as atividades que fazem parte da rotina local de pesca.

Iniciação na pesca é feita por pescadores mais velhos

Entre os entrevistados, todos relataram que o ingresso no mundo da pesca foi cedo na vida, partindo de membros mais velhos da família (avô, pai, irmão). A figura do pescador experiente é fundamental para guiar o novato no uso das ferramentas e pelos caminhos dos furos, paranás e lagos da Reserva Amanã.

“Ou seja, para se tornar um pescador a pessoa precisa dominar as técnicas de captura e as técnicas de circulação no ambiente. É a partir da interação entre as gerações nos ambientes de pesca que os pescadores produzem e reproduzem seus conhecimentos”, indicam os pesquisadores.

Uma relação íntima entre humano e natureza no ofício da pesca, o que inclui a “observação ao nível e cor da água, às árvores frutíferas, ao comportamento dos peixes e aspectos éticos de não matar peixes pequenos ou em desova”.

As ferramentas de pesca

A pesquisa também levantou um conjunto de 21 itens que compõe o “kit” do pescador de águas doces da região. Entre as ferramentas, estão apetrechos como o caniço e zagaia (espécie de lança), e objetos de auxílio, a exemplo da canoa, remos e cuias.

Habilidade e equilíbrio na pesca

A execução caprichada das técnicas da pesca depende do domínio e habilidades de cada pescador. Habilidades que são também corporais. “As malhadeiras e arrastões são postos em lugares estratégicos no rio, pois sabe-se que é passagem de peixe.  O corpo tem que ter equilíbrio para fazer os lances e os fachos. A armação de espinhéis (tipos de isca) no igapó também é em lugares estratégicos, com armação específica para a captura dos peixes maiores”, observa o estudo.

Estudo em destaque em simpósio de conservação na Amazônia

A pesquisa, chamada “Produção e reprodução de conhecimentos na pesca, setor Coraci – RDSA”, será apresentada durante os próximos dias 3 a 6 de julho em evento especializado do Instituto Mamirauá. O Simpósio sobre Conservação e Manejo Participativo na Amazônia (Simcon) chega à 15ª edição no município de Tefé, Amazonas, com apresentações e oficinas que dão foco a iniciativas de pesquisa e extensão para a conservação do meio ambiente e desenvolvimento sustentável da região.

Saiba mais em https://www.mamiraua.org.br/simcon

Texto: João Cunha – FONTE: INSTITUTO MAMIRAUÁ