Ação Civil Pública foi proposta em face do IBAMA para que fosse realizada a consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas Kayabi, Munduruku e Apiaká, potencialmente afetados pela usina a ser construída na bacia do Rio Teles Pires

Imagem: Secom/PGR

 

O Ministério Público Federal (MPF) em Mato Grosso (MT), por meio do Ofício de Populações Tradicionais e Comunidades Indígenas, garantiu junto à Justiça Federal o direito à consulta livre, prévia e informada aos indígenas dos povos Kayabi, Muduruku e Apiaká, sobre a edificação da Usina Hidrelétrica (UHE) São Manoel, na bacia do Rio Teles Pires, situada entre os estados de Mato Grosso e Pará. A ação civil pública foi proposta em face do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Durante o curso do Inquérito Civil Público, o MPF identificou que não havia sido realizada a consulta prévia sobre a edificação da UHE São Manoel, desrespeitando assim o que está previsto no artigo 6º da Convenção 169/89 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A consulta se faz necessária pois o empreendimento causará interferência direta nos povos indígenas e, ainda, trará danos iminentes e irreversíveis para a qualidade de vida dessa população, e de seu patrimônio cultural. “(…) O procedimento de licenciamento das obras em São Manoel está em curso, sem que uma etapa essencial, isto é, a consulta aos povos acima referidos, tenha se efetivado”.

Em sua decisão, o juiz federal da 1ª Vara de Mato Grosso, Ciro José de Andrade Arapiraca, enfatiza que, no processo em questão, “não há desenvolvimento sem ou contra os índios. O Estado brasileiro decidiu construir a UHE São Manoel e, por seu turno, o Ibama concedeu a licença de operação e instalação. Contudo, antes dessa decisão, manifestamente relevante para as comunidades afetadas, não houve a observância do direito de consulta, o que evidencia o descumprimento do direito de consulta livre, prévia e informada e que pode, inclusive, proporcionar a condenação da República Federativa do Brasil em instâncias internacionais”.

O magistrado também julgou descabida a alegação feita pelo Ibama no sentido de que havia dado publicidade do empreendimento aos indígenas por meio de audiências públicas, pois considera que “um amplo processo democrático de participação popular convive não apenas com a possibilidade de ouvir, mas, também, de ter a participação efetiva nas soluções que emergirão da soma de estudos técnicos completos, o que ocorre, dentre outras medidas, com a efetivação do direito de consulta”, completou.

De acordo com o magistrado, a consulta prévia deve ser tida como um instrumento substancial de harmonização dos valores do desenvolvimento, levando-se em consideração todos os direitos das comunidades impactadas, e não como mera formalidade. As fases do processo de licenciamento também não devem ser invertidas, apesar de dinâmicas e maleáveis, no sentido de avançar para próxima fase sem que sejam cumpridos os requisitos da anterior. “Ocorre que, no dia 05/09/2017, foi expedida, pelo Ibama, Licença de Operação 1404/2017, com validade de 04 (quatro) anos, sendo que as obras da usina, neste momento, já se encontram praticamente finalizadas”, destacou o juiz.

Direito à consulta prévia – O direito das comunidades indígenas de serem consultadas quanto ao aproveitamento dos recursos hídricos em suas terras também tem previsão constitucional, no artigo 231 da Constituição Brasileira. A mesma previsão consta na Declaração da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos dos Povos Indígenas, nos seus artigos 19 e 32, em que é reiterada a necessidade do consentimento livre, prévio e informado dos povos antes de os Estados tomarem decisões que possam afetar seus interesses.

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