O presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, acaba de anunciar um aumento de 8 milhões de hectares nas zonas protegidas da Amazônia, oficialmente, como parte de um esforço para proteger os ecossistemas locais do desmatamento agrícola.
O anúncio foi feito em Leticia, na fronteira com o Brasil, em companhia da primeira-ministra da Noruega, Erna Solberg, em 10 de abril, em visita oficial ao país. Na pauta da visita, a primeira de um chefe de governo norueguês à Colômbia, estavam o apoio ao processo de paz com a narcoguerrilha e ao mirabolante plano ambiental de Santos, que parece querer passar à História como o presidente que fez a paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), ou pelo menos uma parte delas, e como o grande protetor da Amazônia, com o notório Corredor Andes-Amazônia-Atlântico (AAA ou Triplo A).
Para Santos, o desmatamento agrícola “é uma triste realidade, mas estamos totalmente comprometidos a detê-la e a revertê-la”.
Segundo ele, as novas áreas protegidas deverão ser anunciadas até o final de abril e a Colômbia deverá ter “desmatamento zero” até 2020.
Em termos brasileiros, a área equivale a quase duas vezes a do estado do Rio de Janeiro.
Presente ao evento, o ministro de Clima e Meio Ambiente norueguês, Ola Elvestuen, afirmou: “Isso não tem precedentes e não aconteceu em nenhum outro lugar, ao menos que eu saiba (RT, 13/04/2018)”.
Durante a visita, a mandatária norueguesa anunciou a concessão de uma linha de apoio de 250 milhões de dólares para o plano de desmatamento zero colombiano, a serem dispendidos até 2025, em um esquema de pagamento por resultados. O arranjo é semelhante ao adotado com o Fundo Amazônia brasileiro, que gerou o pito de Solberg no presidente Michel Temer, durante a visita deste a Oslo, em junho do ano passado, por conta do alegado aumento da taxa de desmatamento na Amazônia brasileira (Alerta Científico e Ambiental, 22/06/2017 e 29/06/2017).
Com o tom de superioridade moral característico das lideranças dos países do Hemisfério Norte que controlam e financiam o movimento ambientalista, Solberg explicitou os vínculos entre as agendas ambientais dos países industrializados e dos detentores de grandes áreas florestais: “A Colômbia tem realizado grandes progressos. A Noruega continuará sendo um aliado próximo e a longo prazo, na medida em que a Colômbia vá progredindo. Hoje, concordamos em estender a nossa aliança pelo clima e as florestas além de 2020. Esta será a primeira aliança pelo clima e as florestas no marco do Acordo de Paris e confio em que esta aliança constituirá um alto padrão para a colaboração interinstitucional em matéria de clima.”
A declaração conjunta de hoje com a Colômbia envia uma forte mensagem, de que preservar as florestas tropicais é fundamental para alcançar as metas mundiais em relação ao clima. Não é possível lutar contra as mudanças climáticas, se não levarmos tudo em conta. É por isso que decidimos criar um programa que nos permita trabalhar com países aliados, entre eles a Colômbia, e o que queremos é pagar pelos resultados para apoiar o desenvolvimento e a vida das comunidades (El Espectador, 10/04/2018).
Para a Noruega e seus demais sócios industrializados que controlam o aparato ambientalista-indigenista, os investimentos “a fundo perdido” na preservação de florestas são compensados nos esquemas de créditos de carbono da União Europeia, que, na prática, funcionam como “licenças para poluir”. A Noruega tem um interesse especial nisto, pois já anunciou a pretensão de tornar-se “neutra em carbono” até 2030, apesar de ter na indústria petrolífera a sua principal fonte de receitas. Com a sua “generosidade” ambiental, o país pode continuar desfrutando dos lucros da venda de hidrocarbonetos, “compensando” as emissões decorrentes da sua queima com a preservação de florestas em países ávidos por recursos a fundo perdido para as suas políticas ambientais, como a Colômbia, Brasil e muitos outros.
Pouco antes da visita de Solberg, a Colômbia, que já tem 30 milhões de hectares de áreas protegidas, tomou duas medidas para reforçar a sua agenda ambientalista-indigenista, na linha dos compromissos internacionais assumidos pelo governo de Santos.
Uma delas foi a inacreditável decisão da Corte Suprema de Justiça de considerar a Amazônia colombiana como uma entidade de direito próprio. A medida obriga todas instâncias federativas a atuar com a devida urgência para apresentar, no prazo máximo de quatro meses, um plano de ação para combater o desmatamento e as mudanças climáticas. A decisão foi tomada em resposta a uma ação nominalmente apresentada por 25 crianças e jovens colombianos assessorados pela ONG Dejusticia, que se apresenta como um centro de estudos jurídicos e sociais dedicado ao “fortalecimento do Estado de Direito e a promoção dos direitos humanos na Colômbia e no Sul global” (El Espectador, 05/04/2018).
Em um artigo publicado no sítio da ONG, em 13 de abril, um de seus dirigentes, César Rodríguez Garavito, explicitou alguns dos possíveis desdobramentos da decisão: “Reconhecer que a Amazônia tem direitos (por exemplo, à sobrevivência e à integridade) é dizer que todos os cidadãos podemos exigir a sua proteção, inclusive perante os tribunais, sem importar se somos habitantes da região. E mais: não é preciso mostrar que o desmatamento afeta os direitos dos seres humanos, porque, em si mesmo, ele viola os direitos de uma entidade (a Amazônia) que os detém. Outra das novidades mais alentadoras do caso é o apoio entusiasta e maciço que recebeu de milhares de jovens de todo o país, a quem convidaremos agora a construir o Pacto Intergeracional pela Amazônia ordenado pela Corte Suprema, em colaboração com outras comunidades e atores. Eles e elas são os que sofrerão os piores impactos das mudanças climáticas. E quem serão os protagonistas de uma plataforma de redes sociais e meios de comunicação, que estamos construindo para dar seguimento à decisão e evitar que fique no papel.”
A tradução é evidente: com a medida, qualquer cidadão ou grupo de cidadãos colombianos ou até mesmo estrangeiros poderão acionar judicialmente o governo por conta de ações e empreendimentos que, na visão do aparato ambientalista-indigenista, colocarão em risco os “direitos” existenciais da Amazônia colombiana, uma área de 483 mil quilômetros quadrados, equivalente a 42% do território nacional.
A outra medida foi o reconhecimento dos direitos de 36 comunidades indígenas ao governo dos territórios que ocupam, que somam 26 milhões de hectares na região amazônica. A decisão, tomada por decreto presidencial, é decorrente de um processo que se arrastava há mais de duas décadas, desde que a Constituição de 1991 passou a considerar a Colômbia como uma nação multiétnica e pluricultural. Com ela, os territórios indígenas passam a ser considerados como governos locais (El Espectador, 09/04/2018).
Embora a decisão não seja intrinsecamente negativa, inclusive, com a perspectiva de os governos desses territórios virem a ser gradativamente incorporados à estrutura administrativa do Estado colombiano, por outro lado, o aparato ambientalista-indigenista poderá também encontrar mais facilidades e legitimidade jurídica em suas ações junto às comunidades indígenas.
De forma emblemática, o diretor fundador da Fundación Gaia Amazonas (FGA), o antropólogo Martín von Hildebrand, saudou a medida como “o mais importante que aconteceu para os indígenas amazônicos nos últimos 30 anos (Gaia Amazonas, 13/04/2018)”.
Hildebrand é o criador do Corredor Triplo A abraçado pelo governo de Santos, que o anunciou ao mundo em fevereiro de 2015. Na ocasião, o então ministro do Meio Ambiente, Gabriel Vallejo, assim o descreveu: “Esse pode ser um dos legados mais importantes do governo do presidente Santos e é um dos seus sonhos: construir o que ele denomina um Corredor Triplo A – pelos Andes, a Amazônia e o Atlântico – que consistirá em unir em um só corredor, do ponto de vista bioambiental-ecossistêmico, 135 milhões de hectares. Seria o maior corredor ambiental do mundo. Requereria o aprte de três países: a Colômbia, com 34% [da área]; a Venezuela, com 4%; e o Brasil, que tem um dos maiores ecossistemas do mundo, com 62% (El Tiempo, 16/02/2015).”
Na edição de 30 de abril de 2015, este Alerta reproduziu a descrição do Corredor, como então constava no sítio da FGA: “Este corredor visa fazer uma significativa contribuição para a mitigação dos impactos das mudanças climáticas, preservação da diversidade biológica e cultural e a conexão dos ecossistemas, andinos, amazônicos e atlânticos. Martín, fundador da Gaia Amazonas, tem trabalhado junto com o governo nacional desde a década de 1980, no reconhecimento bem-sucedido de 26 milhões de hectares da Amazônia colombiana, que foram protegidos sob a figura [jurídica] de “resguardos” (territórios) indígenas. Esta mesma visão está por trás do que está sendo chamado “Corredor Triplo A”. É um plano viável, dado que 80% do corredor já existem, como um mosaico de áreas protegidas e territórios indígenas. Dos 20% remanescentes, 10% estão ao redor do Parque Natural Nacional Chiribiquete, na Colômbia, e os outros 10%, na região de Roraima, no Brasil, e ambos poderiam ser protegidos por uma figura [jurídica] especial de gerenciamento flexível que harmonize as necessidades socioeconômicas com a conservação dos ecossistemas.”
Desde então, o projeto engordou em ambição e escopo. Anteriormente restrito à Colômbia, Venezuela e Brasil, a versão mais recente do Corredor, como consta do sítio da FGA, passou também a incorporar territórios amazônicos do Equador, Peru, Guiana, Suriname e Guiana Francesa, com uma extensão aproximada de 265 milhões de hectares, dos quais 80% (180 milhões de hectares) conformam um contínuo de conservação de diversidade biológica e salvaguarda da diversidade cultural, composto por um total de 222 Áreas Naturais Protegidas de uso direto e indireto e 2.003 territórios indígenas, que conectam a Amazônia com os ecossistemas dos Andes e o Oceano Atlântico (FGA, Boletín de Notícias, “Corredor Andes Amazonas Atlântico”).
O mapa abaixo dá uma ideia do alcance do programa.
Hildebrand e a FGA são típicos operativos do aparato ambientalista-indigenista criado pelo eixo oligárquico anglo-americano. Cidadão estadunidense naturalizado colombiano, ele foi diretor de Assuntos Indígenas no governo do presidente Virgílio Barco (1986-1990) e desempenhou um papel de grande relevância durante as negociações da Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), nas quais representou a Colômbia. A partir de 1990, tornou-se militante em tempo integral do aparato indigenista internacional, com a criação da FGA. A fundação é um braço da Gaia Foundation, estreitamente vinculada à Casa de Windsor, a família real britânica.
Pelo seu escopo e abrangência, o Corredor é um dos projetos mais ambicioso já implementados pelo aparato ambientalista-indigenista, principalmente, por contar com o endosso institucional do Estado colombiano. De acordo com a FGA, o apoio financeiro específico para o programa vem das seguintes fontes: Rainforest Concern (Reino Unido); Threshold Foundation (EUA); Peter Fy Foundation (EUA); Nelson Family Foundation (EUA); Tallberg Prize (Suécia); Nature and Culture International (EUA); e Alejandro Santo Domingo, um financista bilionário colombiano.
Nos demais países, a FGA coordena o programa com uma rede de ONGs que são chamadas “pontos focais”: Instituto Socioambiental-ISA e Instituto de Pesquisa e Formação Indígena-Iepé (Brasil); Ecociencia (Equador); Sociedad Peruana de Derecho Ambiental (Peru); Fundación Wataniba (Venezuela); Guyana Society for Biodiversity and Environment-GSBE (Guiana); Tropenbos Suriname (Suriname); e Parc Amazonien de Guyanne (Guiana Francesa).
Da mesma forma, Hildebrand tem procurado engajar o interesse de organizações religiosas. Em fevereiro de 2017, apresentou o projeto à Pontifícia Academia de Ciências e à Rede Eclesial Pan-amazônica (RePam). Em junho, foi um dos participantes da Iniciativa Interconfessional para as Florestas Tropicas, pajelança ambientalista-indigenista organizada pelo governo norueguês e para coincidir com a visita de Temer a Oslo e pressioná-lo ainda mais sobre o desmatamento na Amazônia. A presença do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) entre os participantes indicou que se tratava de uma iniciativa do “Estado-Maior” do ambientalismo-indigenismo internacional (Alerta Científico e Ambiental, 22/06/2017).
Pode-se presumir que Hildebrand fará o possível para que o Corredor seja um dos temas tratados no vindouro Sínodo Extraordinário de Bispos sobre a Amazônia, que se realizará em Roma, em outubro de 2019.
No Brasil, o ISA e o Iepé têm se reunido com outras ONGs com o intuito de engajá-las na iniciativa, como a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Rede de Cooperação Amazônica (RCA) e o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS).
Apesar do endosso do governo colombiano ao programa, o esquema de Hildebrand depende fundamentalmente da participação do Brasil. Em uma entrevista ao sítio O Eco, ele mesmo admite: “O corredor ecológico que estamos propondo existirá só se o Brasil entrar na iniciativa. Sem o Brasil, seria muito difícil de acontecer (O Eco, 23/10/2017).”
Segundo ele, um terço da Amazônia brasileira é ocupada por terras indígenas e um quarto reúne áreas protegidas: “Por que não somar todas estas áreas e conectá-las em um grande eixo até o Atlântico?” O Brasil, afirmou, nunca pensou em um corredor até os Andes, porque “nunca olhou para além de suas fronteiras”.
Porém, a reação inicial brasileira foi fria, pois o projeto, divulgado por este Alerta, chegou ao conhecimento das autoridades nacionais antes que qualquer proposta oficial fosse apresentada pelo governo colombiano, causando espécie nos altos escalões diplomáticos e nas Forças Armadas.
Em julho, em uma audiência pública realizada pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, para analisar o controle de fronteiras e o combate ao tráfico de drogas e armas na região, o comandante do Exército, general Eduardo Villas-Bôas, destacou a necessidade de se ter uma maior atenção com a atuação das ONGs internacionais que operam no País e ressaltou a ameaça representada pelo projeto do Corredor.
Villas-Bôas observou que os militares estavam apreensivos em relação a situações que limitam a autoridade do País em relação a questões estratégicas para o desenvolvimento da região, além de atender às aspirações dos brasileiros, em especial os da população da Região Amazônica. Segundo ele, a eventual criação do Corredor inviabilizaria a exploração de recursos naturais avaliados em mais de 23 trilhões de dólares, como reservas de minérios raros e biodiversidade. Ele aproveitou para se posicionar contra as propostas de se manterem os recursos naturais amazônicos “congelados” para sempre, e disse acreditar ser possível conciliar a preservação ambiental com o uso racional das riquezas da região. Para ele, tal condição configura um “déficit de soberania”: “Esse déficit de soberania, esse processo todo é como combater fantasmas, porque a gente não sabe de onde vêm, o que são, o que fazem e quais são os seus objetivos, mas o resultado geral a gente pode verificar (Agência Senado, 16/07/2015).”
Além disso, Villas Bôas criticou o modelo atual de demarcação de terras indígenas, com grande concentração na Amazônia, inclusive, em áreas com forte concentração de riquezas minerais: “Não sou contra unidades de conservação em terras indígenas. (…) mas temos que compatibilizar esse objetivo com a exploração dos recursos naturais.”
Entretanto, após a recusa inicial, o Brasil passou a mostrar-se mais receptivo. Em outubro de 2017, a Colômbia sediou o Fórum de Ministros e a Consulta Regional para a Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o governo anfitrião inseriu o Corredor na pauta de discussões. O Brasil foi representado pelo chefe da assessoria de Assuntos Internacionais do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Fernando Coimbra, que disse à imprensa: “Esta reunião permitiu aos países da bacia amazônica discutir suas diferentes perspectivas sobre a conectividade de ecossistemas. Para a conservação e uso sustentável dos recursos naturais é importante identificar maneiras de assegurar a conectividade dos ecossistemas (O Eco, 23/10/2017).”
O secretário de Biodiversidade do MMA, José Pedro de Oliveira Costa, um veterano operativo do aparato ambientalista, afirma que há interesse na participação, mas de forma voluntária. Para ele, a proposta “é apetitosa”, mas “temos que sentar e discutir”.
O coordenador executivo do Iepé, Luís Donisete, também adotou um tom cauteloso: “Não há nenhuma intenção de criar uma gestão internacional da Amazônia ou questionar a soberania dos países. Se propõe ações colaborativas entre os governos da região que, voluntariamente, congregariam esforços para manter a floresta e buscar seu desenvolvimento sustentável, respeitando os povos que lá vivem e buscando a conectividade dos ecossistemas e os serviços climáticos que esta região presta ao continente americano e ao resto do mundo.”
A despeito de tais cautelas, a posição mais adequada para o País continua sendo a das Forças Armadas, manifestada pelo general Villas-Bôas, as quais demonstram um conhecimento preciso do alcance da agenda ambientalista-indigenista.
Principalmente, pelo fato de a Noruega ser uma das principais financiadoras desse aparato intervencionista e refratário aos interesses brasileiros.
Posted by: Geraldo Luís Lino in Ambientalismo 3 de maio de 2018 – Noruega lidera avanço do Corredor AAA – Msia Informa
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