Nota técnica denuncia a inclusão de emendas sem qualquer relação com a crise migratória no texto original da medida com o objetivo de alterar a política nacional do meio ambiente.
O Ministério Público Federal (MPF) defende a rejeição parcial da Medida Provisória (MP) 820/2018, sobre o acolhimento de pessoas em situação de vulnerabilidade resultante de crises humanitárias, em razão de emendas jabuti que visam alterar a política nacional do meio ambiente, tema sem qualquer relação com a crise migratória. O texto está pronto para ser votado pelo Plenário da Câmara dos Deputados. Segundo nota técnica elaborada pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR), o relatório aprovado pela comissão mista que analisou a matéria incluiu no texto legislativo emendas inconstitucionais que, além de não terem qualquer relação com a temática, restringem o direito de consulta aos povos indígenas, garantido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
As emendas questionadas alteram a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) e fixam prazo de 30 dias para que a Funai se manifeste sobre a realização de estudos ambientais nas terras indígenas. Caso não haja parecer, o empreendedor poderá fazer o estudo dos impactos da obra por conta própria. “Sem que a medida traga qualquer benefício concreto aos migrantes venezuelanos, busca restringir direitos indígenas previstos no Direito Internacional dos Direitos Humanos e também em sede constitucional”, alertam os procuradores no documento enviado aos parlamentares.
A nota técnica demonstra que não estão presentes os requisitos de urgência e relevância necessários para tratamento do tema por meio de medida provisória e afirma que, ao suprimir o direito de consulta e das minorias indígenas envolvidas, a proposta legislativa viola os princípios democrático, da igualdade e da auto-organização dos povos indígenas, previstos na Constituição Federal. Além disso, a inclusão de emendas em medida provisória sem pertinência com o objeto tratado atenta contra a separação de poderes e o devido processo legislativo, destaca o documento.
Casuísmo – Segundo o MPF, a manobra legislativa visa agilizar o processo de licenciamento ambiental de uma linha de transmissão de energia elétrica entre Manaus (AM) e Boa Vista (RR), que cruza a terra indígena Waimiri Atroari, com extensão aproximada de 315 km.
Para os procuradores, a escolha do traçado do empreendimento – em meio a terras indígenas, assentamentos rurais e áreas de preservação –, privilegiou exclusivamente o aspecto econômico do projeto, em detrimento das análises socioambientais necessárias. “A prévia definição do traçado da linha de transmissão em terra indígena, sem estudo efetivo das alternativas locacionais e sem a observância da consulta direitos fundamentais dos povos indígenas”, destaca a nota.
O MPF ressalta ainda que texto aprovado pela comissão mista não se apresenta como solução efetiva para o problema de abastecimento energético do estado de Roraima, tampouco tem relação com a questão migratória e o atendimento humanitário dos venezuelanos. “Em vez de adequar e solucionar vícios constitucionais e legais já reconhecidos pela Justiça Federal, [a medida provisória] busca insistir nos equívocos e fomentar a discriminação contra os povos indígenas, que jamais foram responsáveis pelas falhas no projeto de construção do linhão Manaus – Boa Vista”, conclui a nota.
Nota Técnica 3/2018 da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF.
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Procuradoria-Geral da República
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