A agência Amazônia Real procurou o Exército Brasileiro para falar sobre o conflito territorial entre a instituição e a comunidade quilombola localizada no entorno do Real Forte Príncipe da Beira, em Rondônia. Perguntas foram enviadas por e-mail ao Centro de Comunicação Social do Exército (Cecomsex), em Brasília. Em resposta à reportagem, o Exército disse que a área em questão é de jurisdição militar, localizada em área de fronteira do Brasil com a Bolívia. Disse que “realiza esforços para manter um excelente relacionamento com a comunidade” e que fez acordos com os moradores sobre os procedimentos de acesso e mobilidade na área.
O Exército disse que realiza ações sociais nas comunidades e negou que proíbe os moradores a cultivarem roças. “O Comandante do 1º PEF tem realizado esforços para manter um excelente relacionamento com a comunidade autodeclarada quilombola do Real Forte Príncipe da Beira em Costa Marques, em Rondônia. Essa comunidade se instalou no entorno do Forte em 1942, ano posterior à instalação do Pelotão naquela área (década de 1930)”. Leia abaixo as respostas do Exército:
Amazônia Real – Por que o Exército Brasileiro defende a posse da área de entorno do Real Forte Príncipe da Beira onde está instalado o quartel do 1º PEF, Costa Marques, em Rondônia?
Exército – O quartel do 1º Pelotão Especial de Fronteira (1º PEF), instalado no município de Costa Marques, RO, possui no seu entorno o Real Forte Príncipe da Beira. Trata-se de uma área sob jurisdição militar, localizada na linha/faixa de fronteira com a Bolívia, região de constantes episódios de apreensão de drogas, armas e outros ilícitos, decorrentes das ações de repressão planejadas e executadas pelo Exército Brasileiro na calha do Rio Guaporé, sempre que possível em parceria com outros órgãos federais e/ou estaduais para a manutenção de nossa soberania, conforme preveem a Constituição Federal do Brasil e a Lei Complementar 97/1999, e suas atualizações.
No interior dessa área militar encontra-se o Real Forte Príncipe da Beira, fortaleza do final do século XVIII (1776/83), tida como uma das maiores construções portuguesas fora de Portugal. Erguida em plena floresta amazônica, é considerada uma das mais desafiadoras construções realizadas no final de 1700 no Brasil. Sua importância para a história do País e para a formação do atual território nacional foi reconhecida inclusive por meio de tombamento promovido pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) no ano de 1950.
Apesar dos constantes desmatamentos e invasões de terras da União, destaca-se que o Exército Brasileiro sempre esteve disposto a solucionar qualquer conflito com moradores locais. Para tanto apresentou, em 2014/15, àquela comunidade uma proposta de Concessão de Direito Real de Uso Resolúvel (CDRUR), contrato administrativo não oneroso, o qual não foi aceito pelas lideranças locais.
Amazônia Real – A região do entorno do Forte é rica em minerais e também representa um valioso sítio arqueológico e histórico, além de ser detentora de uma beleza natural. O que o EB pretende fazer na área, caso a Justiça decida pela posse da mesma para esta instituição?
Exército – O Exército Brasileiro continuará a preservar a área e a coibir a prática de delitos transfronteiriços e crimes ambientais na região, como faz em todo o Comando Militar da Amazônia. Desde a década de 1930, o Exército Brasileiro tem a posse e guarnece aquela área, por meio da instalação de um Contingente Especial de Fronteira do Real Forte Príncipe da Beira, que em 1954 teve a sua designação mudada para 7º Pelotão de Fronteira, e, em 1977, para 1º Pelotão Especial de Fronteira (1º PEF), subordinado ao 6º Batalhão Especial de Fronteira (6º. BIS), este sediado em Guajará-Mirim, RO.
Amazônia Real – Como está o andamento de recuperação do entorno do Forte Príncipe da Beira?
Exército – O 1º PEF realiza trabalhos rotineiros para manutenção e limpeza do Real Forte Príncipe da Beira, tais como corte de grama e remoção de lixo, além de patrulha diária para a segurança do Pelotão e a proteção da comunidade e do Forte. Este ano, o 5º Batalhão de Engenharia de Construção (5º BEC), sediado em Porto Velho, RO, realizou trabalhos de escoramento do Real Forte Príncipe da Beira com madeira, sob supervisão da Superintendência do Iphan Rondônia, que aprovou todos os trabalhos de escoramento realizados pelos militares.
Para 2018, os trabalhos serão finalizados por meio do emprego de material de alvenaria para escorar algumas estruturas que requerem esse tipo de material.
Também, o Exército Brasileiro vem estudando o estabelecimento de uma parceria com o próprio Iphan e o Governo do estado de Rondônia para a execução de um projeto maior de revitalização do Real Forte Príncipe da Beira, possivelmente até 2020, que possibilitará a fomentação do turismo na área, ocasionando a geração de renda para as famílias do entorno.
Importante destacar que o Real Forte Príncipe da Beira, tombado pelo Iphan, em novembro de 1937, recebe mensalmente cerca de 1.000 (hum mil) visitantes, desde estudantes até estrangeiros, os quais são recebidos por integrantes do 1º PEF e moradores da comunidade, que se encarregam de apresentar aos interessados um pouco da história local.
Amazônia Real – A comunidade quilombola do entorno do Forte faz duras críticas ao comportamento de militares do 1º PEF com relação à comunidade. Os moradores reclamam da necessidade de passar por revistas e apresentar documentos para acesso ao porto e a escola e da proibição de uso de veículo para transportar equipamentos de pesca até o porto. O que tem dizer o EB sobre essas afirmações?
Exército – O Comandante do 1º PEF tem realizado esforços para manter um excelente relacionamento com a comunidade autodeclarada quilombola do Real Forte Príncipe da Beira em Costa Marques, em Rondônia. Essa comunidade se instalou no entorno do Forte em 1942, ano posterior à instalação do Pelotão naquela área (década de 1930). Constantemente, o Comandante do 1º PEF reúne-se com a comunidade para informar todos os procedimentos de acesso ao porto, por se tratar de área sob jurisdição militar localizada em uma região fronteiriça sujeita à prática constante de delitos transnacionais e ambientais.
Por oportuno, cabe esclarecer que o dito porto fluvial nada mais é do que um local de atracamento de embarcações de pequeno porte. O Comandante do 1º PEF acordou com os moradores que a travessia (BRASIL-BOLÍVIA-BRASIL) pode ser realizada sem restrição diariamente até às 18:00 horas. Além desse horário, o trânsito de pessoas interfere diretamente na segurança orgânica do Pelotão. Além disso, o 1º PEF executa rotineiramente a fiscalização e o controle de quem circula na área sob responsabilidade patrimonial do Pelotão.
Amazônia Real – Um levantamento populacional realizado pela associação de moradores da comunidade quilombola indica uma drástica redução do número de moradores do entorno do Forte desde a implantação pelo EB de uma fazenda para criação de gado na década de 1980. Os senhores confirmam essa situação?
Exército – Não há qualquer fazenda para criação de gado na área do 1º PEF.
Amazônia Real – A comunidade também reclama da proibição pelo 1º PEF de cultivar roças, fazer extrativismo, criar animais e melhorar a infraestrutura das suas propriedades, incluindo as residências. Quais são as razões do EB para estas proibições?
Exército – O 1º PEF entrega para a comunidade instalada em seu entorno dignidade e segurança. O Exército Brasileiro naquela localidade é quem provê ações e serviços que melhoram substancialmente a vida dos membros daquela comunidade tais como a coleta do lixo, o atendimento gratuito de saúde, o fornecimento de água e o apoio à escola que se encontra em área do próprio 1º PEF.
Ressalte-se que nenhuma dessas atividades compete ao Pelotão. Entretanto, tal como nos demais pelotões especiais de fronteira na Amazônia, o Exército Brasileiro tem direcionado esforços para que as comunidades que vivem no entorno dos pelotões especiais de fronteira tenham melhorias na sua qualidade de vida.
Nos últimos dois anos, 70% do total de atendimento médico e odontológico, realizado pelo 1° PEF, beneficiou os moradores da área. Nota-se que o Exército Brasileiro emprega recursos próprios no atendimento às comunidades carentes. Observa-se que a água retirada do subsolo exige maquinário e custo com manutenção e energia elétrica; a coleta de lixo depende do fornecimento de combustível e da manutenção das viaturas; a escola pública de ensino fundamental recorre ao 1º PEF para desempenhar as atividades de manutenção.
Uma das atividades de Pelotão, entre outras, é evitar o desmatamento de grandes extensões, dentro dos limites da área da União sob jurisdição do Exército, delito ambiental coibido legalmente pelo 1º PEF.
No entanto, o Exército Brasileiro ressalta, ainda, que não existe qualquer proibição para cultivar roças, extrativismo (criação animais) ou melhora de infraestrutura nas casas de moradores nas áreas do entorno do 1º PEF. Quando o morador deseja realizar o roçado (capoeira), existe um procedimento que é o de informar o Cmt 1º PEF para obter a concessão. Porém, essas áreas de roçado devem ser próximas às residências e não podem ultrapassar 01 (um) alqueire.
Quanto a atuação do Exército Brasileiro em questões de segurança na área, neste ano, em ações isoladas ou interagências, foram apreendidos carregamentos de madeira ilegal, veículos roubados, pasta base de cocaína, produtos e peças para máquinas agrícolas, armas; pessoas foram detidas e encaminhadas às respectivas delegacias por porte ilegal de arma, tráfico de drogas, posse de veículos roubados, desmatamento ilegal, dentre outras situações que configuravam a prática de crimes transnacionais e ambientais na área do 1º PEF. Recentemente, houve, inclusive, o cumprimento de Mandado de Prisão de um morador da comunidade.
Diante dessa realidade fronteiriça, são adotadas medidas de controle de recursos e pessoas que transitam na área do 1º PEF, em especial no dito porto lá existente, com o intuito de proteger e defender as instalações do próprio Pelotão, como também da comunidade que vive em seu entorno. Não são medidas arbitrárias, mas medidas previamente informadas e transmitidas àquelas famílias. Assim, se pretende oferecer segurança aos militares e familiares que lá vivem, bem como à comunidade do Real Forte Príncipe da Beira.
Ana Aranda FONTE: AMAZÔNIA REAL
Leia a reportagem: Exército e remanescentes quilombolas disputam área no Vale do Guaporé (RO)
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