Foi publicada, no Diário Oficial da União desta quarta-feira (27), a Instrução Normativa (IN) 7 que estabelece novas regras para elaboração e revisão de planos de manejo de unidades de conservação federais. Elaborada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o regulamento uniformiza a abordagem entre as diferentes categorias de unidades de conservação existentes em todo o Brasil.
Por suas características naturais relevantes, a unidade de conservação é protegida pelo Poder Público. De acordo com a Lei 9.985/2000, existem unidades de proteção integral, como a reserva biológica e o parque nacional, onde é admitido apenas o uso indireto dos recursos naturais, e outras de uso sustentável, como a área de relevante interesse ecológico e a reserva extrativista. O plano de manejo é o documento que define os usos que serão desenvolvidos na unidade e formas de manejo dos recursos naturais.
Dados do ICMBio apontam que 173 unidades de conservação federais têm plano de manejo, o equivalente a 53% do total. Ao longo da elaboração da norma, o órgão defendeu que a mudança poderia acelerar o processo de criação de unidades. Isso porque a regra facilitará a gestão do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, ao uniformizar procedimentos, a exemplo das etapas de revisão, e conceitos.
A advogada integrante da Rede Nacional de Advogados Populares (Renap), Talita Furtado, explica que, antes, havia normas fragmentadas sobre criação de unidade de conservação federal das categorias reserva extrativista e reserva de desenvolvimento sustentável, elaboração de planos de manejo e gestão das unidades, entre outros temas. Em relação à nova instrução, a especialista em direito ambiental observa que “aspectos gerais que são importantes estão mantidos, como a iniciativa das populações tradicionais para começar o plano de manejo, o reconhecimento e a valorização dos seus conhecimentos e o seu direito de participação nos conselhos gestores”. Ela destaca, contudo, que é importante garantir a efetividade dessa participação.
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Comunidades
Coordenador da Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas (Confrem), Carlinhos Canes concorda. Ele aponta que o plano de manejo e os instrumentos de gestão da unidade de conservação ganham efetividade somente quando a comunidade se sente dona deles. “Se não, cai na vala comum das leis que existem e não são cumpridas porque o Estado não tem condições de efetivar”. Integrante da Reserva Extrativista Canavieiras, na Bahia, ele defende que “o processo de empoderamento perpassa por toda a construção, para que as comunidades possam exercer o papel de colocar essas regras em prática e de exigir também que outros entes e parceiros cumpram o que for definido”.
Partindo desse pressuposto é que ele tece críticas à nova instrução. Ele diz que as organizações só foram convidadas para participar de duas reuniões, embora as discussões sobre a norma estejam ocorrendo desde 2015. Ao longo da construção da norma, havia preocupação com a possibilidade de a uniformização reduzir a atenção às peculiaridades de unidades, especialmente das que contam com a presença de populações tradicionais, que defendem seu protagonismo na gestão desses territórios.
Como reflexo disso, a instrução normativa traz um capítulo com especificidades das reservas extrativistas (Resex) e reservas de desenvolvimento sustentável (RDS), além de outras onde essas populações estão presentes. O texto afirma que a elaboração do plano de manejo nesses casos deve considerar princípios e diretrizes adicionais, tais como o respeito à diversidade socioambiental e cultural das populações tradicionais e seus sistemas de organização econômico, social e cultural; a garantia de meios para a efetiva participação das populações nos processos decisórios; a valorização de diferentes formas de saberes e o dever de buscar a melhoria da qualidade de vida dessas pessoas, bem como o acesso aos serviços básicos e aos direitos.
O artigo que trata dessas reservas define que o plano de manejo em Resex e RDS será aprovado em assembleia intercomunitária antes de seu encaminhamento à aprovação do conselho deliberativo da unidade e pelos demais órgãos. Acrescenta que, “no sentido da promoção da autonomia das comunidades locais e da garantia de condições adequadas à realidade local, a definição dos métodos e o provimento dos meios para a realização da assembleia a que se refere o inciso V desse artigo será de responsabilidade das entidades representativas da população tradicional”.
Para Carlinhos, esse artigo é “muito problemático”, pois “viola os princípios do direito à participação”. Ele cita como exemplo a situação da Reserva Extrativista Marinha do Iguape, na Bahia, que reúne aproximadamente 92 comunidades, somando 8 mil beneficiários. “Como a comunidade vai ter condições financeiras para prover os meios para realizar uma assembleia intercomunitária? É o Estado que tem que prover os meios para que essas comunidades participem. Às comunidades cabe a mobilização”, defende.
A Agência Brasil entrou em contato com o ICMBio e enviou pedido de detalhamento sobre a instrução normativa, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Helena Martins – Repórter da Agência Brasil
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