Árvores localizadas em áreas alagáveis emitem por volta de 15 milhões de toneladas por ano desse gás de efeito estufa.  

Árvores situadas em áreas alagáveis na Amazônia emitem até 20 milhões de toneladas de metano por ano – LUCIANA VANNI GATTI

As árvores situadas em áreas alagáveis na Amazônia emitem por ano entre 15 e 20 milhões de toneladas de metano (CH4), o equivalente ao que é emanado por todos os oceanos juntos. A conclusão é de um grupo de pesquisadores ingleses e brasileiros, entre eles a bióloga Luana Basso, do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), e a química Luciana Vanni Gatti, do Laboratório de Gases de Efeito Estufa do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Em um estudo publicado na edição desta segunda-feira (04/12) na revista Nature, o grupo constatou que essas árvores são uma das principais fontes emissoras do gás. O metano absorve até 23 vezes mais calor do que o dióxido de carbono (CO2), sendo, por isso, um dos três principais gases de efeito estufa. Segundo o grupo, apesar de ser um processo natural da floresta, a quantidade de metano emitida por essas árvores impressiona e, somada à emissão de outras fontes naturais, de proveniente de rebanhos e da queima de biomassa na região, pode ter impactos significativos. 

Há algum tempo os dados sobre a emissão de metano na Amazônia intrigam os pesquisadores. Até então, os números mais recentes disponíveis na literatura especializada, obtidos a partir de observações via satélite por outros grupos de pesquisa, indicavam que a floresta emitia por ano cerca de 30 milhões de toneladas de CH4. Em 2011, Luciana e Luana Basso, à época sua aluna de doutorado no Ipen, verificou que a realidade era diferente. Seus dados indicavam uma emissão quase 50% maior, de 42,7 milhões de toneladas por ano. Apesar de ter verificado na prática uma diferença significativa em relação ao valor até então conhecido, as pesquisadoras não souberam explicar de onde vinha o metano excedente. À época, o grupo coordenado por Luciana estava interessado em obter uma amostra representativa do balanço de carbono de toda a bacia amazônica.

A cada duas semanas, sua equipe sobrevoava as regiões de Santarém, no Pará, Rio Branco, no Acre, Tabatinga, no Amazonas, e Alta Floresta, em Mato Grosso, colhendo amostras de ar, que eram armazenadas em frascos de vidro. Em seguida, analisava os índices de concentração de vários gases, entre eles CO2, monóxido de carbono (CO) e CH4. Dessa forma, obteve medidas que refletiam todo o processo de emissão e absorção de CO e CO2 pela floresta desde o oceano Atlântico até os locais em que colheu as amostras. Assim, pôde medir a reação dos estoques de carbono da floresta à seca em diferentes áreas, concluindo que durante os períodos de estiagem a floresta liberava mais CO2 para a atmosfera do que absorvia (ver Pesquisa FAPESP edição on-line).  

Pesquisadores da Universidade Aberta instalam câmaras em volta do tronco das árvores para medir as emissões de CH4 – UNIVERSIDADE ABERTA

Esse estudo foi publicado em fevereiro de 2014 na revista Nature, e a quantidade excedente de metano emitido pela floresta observado por Luciana – de 30 milhões para os 42,7 milhões de toneladas – permaneceu uma incógnita. Em 2015, Luciana apresentou suas estimativas em uma reunião realizada no Brasil. Entre os presentes, estava o biólogo Vincent Gauci, da Universidade Aberta, no Reino Unido, cuja equipe, trabalhando separadamente, havia acabado de medir as emissões de CH4 diretamente dos troncos das árvores da Amazônia. Eles selecionaram uma amostra de 2.300 árvores em regiões adjacentes aos rios Negro, Solimões, Amazonas e Tapajós. Instalaram pequenas câmaras em volta dos troncos para coletar o ar e, assim, determinaram a quantidade de CH4 emitida pelas árvores. Fizeram medições durante os anos de 2013 e 2014. Em laboratório, após analisar os índices de concentração de CH4, o grupo britânico verificou que a região estava emitindo exatamente a diferença entre o que havia sido registrado na literatura e as estimativas obtidas pela equipe de Luciana.

“Conversamos após aquela apresentação e decidimos escrever um artigo reunindo os dados dos nossos grupos”, explica Luciana. No estudo publicado agora na Nature, os pesquisadores explicam que as árvores funcionam como chaminés, canalizando o metano do solo submerso por meio dos troncos e liberando-o para a atmosfera. “Isso faz das árvores em regiões alagáveis uma das principais fontes emissoras de metano da Amazônia”, explica Luana Basso, que atualmente é professora da Universidade Paulista (Unip), em São Paulo.

Durante a estação seca, entre junho e novembro, as áreas antes alagadas são invadidas por ervas e gramíneas. Na estação chuvosa, entre novembro e abril, as águas voltam a subir e essa vegetação fica submersa. A vegetação no fundo morre, produzindo metano ao se decompor. “O metano é gerado quando uma substância orgânica se decompõe sem oxigênio” explica Luciana Gatti. Desse modo, as ervas, gramíneas, folhas e galhos nas áreas alagada emitem o gás metano em abundância por meio das árvores. “É importante conhecer a dinâmica de produção desse e outros gases de efeito estufa para que possamos prever como a floresta se comportará em diferentes cenários de mudanças climáticas”, destaca a química.  

RODRIGO DE OLIVEIRA ANDRADE | Edição Online 13:37 4 de dezembro de 2017

Projetos
1. Carbon tracker and water availability controls of land use and climate changes (nº 08/58120-3); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsávelHumberto Ribeiro da Rocha (USP); Investimento R$ 1.901.580,15 (FAPESP)
2. UK/Brazil research network for an Amazonian Carbon Observatory (nº 11/51841-0); Modalidade Auxílio à pesquisa; Pesquisadora responsável Luciana Vanni Gatti (IPEN); Investimento R$343.349,20

Artigo científico
PANGALA, Sunitha R. et alLarge emissions from floodplain trees close the Amazon methane budgetNature. On-line. 4 dec. 2017.

 

FONTE: Revista Pesquisa FAPESP