Evento ouviu representantes indígenas sobre as mudanças climáticas. Resultados serão enviados para a delegação brasileira que vai participar da COP 23, a nova conferência internacional do clima.

Lideranças indígenas de todo o País defenderam o uso dos conhecimentos tradicionais como forma de preservar o meio ambiente e se contrapor aos efeitos do aquecimento global. Elas participaram do seminário “Percepções e Experiências dos Povos Indígenas no Contexto das Mudanças Climáticas”, promovido pela Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, em parceria com o Instituto Socioambiental e a Rede de Cooperação Amazônica.

O presidente da comissão, deputado Nilto Tatto (PT-SP), lembrou que o Brasil assumiu um compromisso internacional de zerar o desmatamento até 2030, mas alertou que falta previsão de orçamento para a política indigenista.

“A tendência é diminuir mais ainda o orçamento, desestruturar mais ainda a Funai como órgão responsável do estado brasileiro para implementação do direito indígena que está lá na Constituição, e que é uma demanda da maioria do povo brasileiro e que o governo não atende”, afirmou Tatto.

Relatórios do IPCC
Um dos líderes indígenas mais conhecidos do país, Ailton Krenak, doutor honoris causa da Universidade Federal de Juiz de Fora, lembrou que os conhecimentos tradicionais dos índios são fundamentais para a preservação das florestas.

Segundo ele, os povos indígenas, por antiguidade, desenvolveram formas de percepção do ecossistema e dos ambientes onde vivemos. Essa memória, disse Krenak, confere com os relatórios do IPCC (sigla em inglês para o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) e está muito presente no pensamento, mas pouco no nosso coração.

“As pessoas estão tomando esses relatórios como se fossem só estatísticas e não um indicador de que estamos perdendo qualidade de vida, e perdendo também a nossa profunda relação com a terra”, afirmou Krenak.
Conhecimento tradicional

Para Davi Kopenawa, as mudanças do clima são como uma epidemia, chamada de ‘xauara’ na visão de mundo do povo Yanomami. “A mudança climática, será que o homem da cidade tem remédio para ela? Para curar a nossa terra planeta? Eu acho que não. Nós, pajés Yanomami, sabemos entrar em contato com lua, com trovão, vento, ele que manda chuva para nós, para nossa mãe terra tomar água, para ficar úmida. Então esse é nosso conhecimento tradicional yanomami, nascido aqui no nosso país”, afirmou Kopenawa.

Mas, segundo os debatedores, não é só a floresta amazônica que merece ser preservada. O coordenador da Apoinme (Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo), Francisco Dipeta, lembrou das ameaças aos biomas da Caatinga e do Cerrado.

“As fronteiras do clima ultrapassam biomas, nações e países. O rio São Francisco tem sofrido anualmente, sido atacado com sedimentos, por conta da ‘desmatação’. Esse velhinho abastece água para 13 milhões de pessoas, corre uma extensão de 2.900 quilômetros. O Velho Chico preserva a caixa d’água do Brasil, o Cerrado. Se vocês não preservarem o Cerrado, pode esquecer (da) água nesse país”, observou Dipeta.

Agrotóxicos
Já o deputado Roberto Balestra (PP-GO) lamentou as divergências políticas que separam os povos indígenas e o agronegócio. “Eu lamento profundamente quando se quer dizer aqui que o agrotóxico, ora, o agrotóxico é remédio como qualquer outro. Apenas o que muda é a dose. Nós temos que ter verdadeiro respeito uns pelos outros, vamos levar a coisa sem o sentimento político”, afirmou.

Ao todo, mais de quinze indígenas foram ouvidos na audiência pública, que servirá de subsídio para a delegação brasileira que vai participar da COP 23, a nova conferência internacional do clima, prevista para novembro deste ano, na Alemanha.

Reportagem – Cynthia Sims
Edição – Roberto Seabra

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