A matéria orgânica que é convertida em metano vem de fontes em dois grupos: os estoques iniciais, tais como as folhas das árvores na área inundada e o carbono no solo inundado, e os estoques renováveis, tais como as macrófitas que crescem na água e as ervas que crescem na zona de deplecionamento, ou seja, o grande lamaçal que forma anualmente quando o nível da água é rebaixado no reservatório. A vegetação que cresce nesta zona é mole, principalmente composta de gramíneas, que apodrecem rapidamente abaixo d’água (bem diferente da madeira, que se decompõe de forma muito lenta).
A vegetação na zona de deplecionamento é enraizada no fundo, onde, na hora que o nível da água sobe, ela se decompõe na zona sem oxigênio e gera metano. Quando crescem, as plantas tiram carbono do ar em forma de CO2 pela fotossíntese, e, quando morrem inundadas, elas devolvem este carbono em forma de CH4. Por ser uma emissão que se repete todo ano de forma sustentável, a hidrelétrica funciona como uma “fábrica de metano” [1].
A ELETRONORTE (a empresa paraestatal dona da usina de Tucuruí) reagiu ao meu uso da expressão “fábrica de metano” da seguinte forma em um texto intitulado “Eletronorte responde ao New York Times”:
“Finalmente, a Eletronorte não aceita mais, após 20 anos de exaustivas e repetidas explicações como esta, que “cientistas” continuem afirmando sem qualquer comprovação que “Tucuruí é virtualmente uma fábrica de metano”. Virtuais têm sido essas previsões catastróficas que apenas corroboram a opinião de quem, quer esteja bem informado ou não, deseja nada mais do que falar mal do Brasil.” [2]. [5]
NOTAS
[1] Fearnside P.M. (2008) “Hidrelétricas como ‘fábricas de metano’: O papel dos reservatórios em áreas de floresta tropical na emissão de gases de efeito estufa” O ecologia Brasiliensis, 12(1) 100-115. doi: 10.4257/oeco.2008.1201.11
[2] Brasil, ELETRONORTE (Centrais Elétricas do Norte do Brasil, S.A) (2004) “Eletronorte responde ao The New York Times” Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. ELETRONORTE, Brasília, DF. Postado em: http://www.eln.gov.br/ de 2004 até aproximadamente 2007). Disponível aqui: http://philip.inpa.gov.br/publ_livres/Other%20side-outro%20lado/Hydroelectric%20emissions/Eletronorte%20em%20resposta%20ao%20artigo%20publicado%20na%20NY%20Times.pdf
[3] Fearnside P.M. (2017) “Planned disinformation: The example of the Belo Monte Dam as a source of greenhouse gases”. In: Liz-R. Issberner & P. Lena (eds.) Brazil in the Anthropocene: Conflicts between Predatory Development and Environmental Policies. Routledge, Taylor & Francis Group, New York, E.U.A., pp. 125-142.
[4] Fearnside P.M. (2012) “Desafios para midiatização da ciência na Amazônia: O exemplo da hidrelétrica de Belo Monte como fonte de gases de efeito estufa” In: Fausto Neto A. (ed.) A Midiatização da ciência: Cenários, desafios, possibilidades, Editora da Universidade Estadual da Paraíba (EDUEPB), Campina Grande, Paraíba. pp. 107-123.
[5] Este texto é traduzido e atualizada de [3], que foi adaptado de [4]. As pesquisas do autor são financiadas pelo Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq: proc. 304020/2010-9; 573810/2008-7), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM: proc. 708565) e Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA: PRJ15.125).
Leia os artigos da série:Desinformação no EIA de Belo Monte: 1 – Resumo da série
Desinformação no EIA de Belo Monte: 2 – Barragens como a “única opção”
Desinformação no EIA de Belo Monte: 3 – A energia que “precisamos”
Desinformação no EIA de Belo Monte: 4 – Barragens como “energia limpa”
Philip M. Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências e também coordena o INCT (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia) dos Serviços Ambientais da Amazônia. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 500 publicações científicas e mais de 200 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis neste link.
FONTE: Amazônia Real – http://amazoniareal.com.br/
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