A Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (6CCR/MPF) é contra a Proposta de Emenda Constitucional 187/2016, que busca acrescentar parágrafo de autorização expressa a atividades agropecuárias e florestais nas terras indígenas. Nesta terça-feira, 4 de abril, o órgão divulgou nota técnica com argumentos pela rejeição imediata da PEC, que atualmente tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados. Para o MPF, a proposta é inconstitucional.

A proposta pretende acrescentar o parágrafo 8º ao art. 231 da Constituição da República Federativa do Brasil com a seguinte redação: “As comunidade indígenas podem, de forma direta e respeitada a legislação pertinente, exercer atividades agropecuárias e florestais nas terras mencionadas no § 1º deste artigo, sendo autônomas para praticar os atos necessários à administração de seus bens e comercialização da produção”. A 6ª Câmara do MPF alerta para a inconstitucionalidade dessa modificação. Segundo a nota, além de violar a autonomia dos povos indígenas, a proposta também contraria normas internacionais causando riscos concretos de responsabilização do Brasil.

O MPF ressalta que a autonomia dos povos indígenas e o direito de usufruto exclusivo de suas terras têm natureza de direito fundamental. Segundo a nota, o Estado tem o dever constitucional de proteger e apoiar as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras. Além disso, as formas de expressão e os modos de viver dos grupos formadores da sociedade brasileira constituem patrimônio cultural. O reconhecimento da autonomia dos povos indígenas guarda, portanto, “intrínseca relação com os direitos à vida, à igualdade e com a dignidade da pessoa humana”. Para a 6CCR, qualquer fragilização do conteúdo de tais direitos configura violação ao art. 60 da Constituição – que enquadrou os direitos e garantias individuais como cláusulas pétreas.

Retrocesso – O MPF defende que a PEC 187/2016 restabelece uma visão “integracionista” já superada pela legislação brasileira com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Antes, “a cultura dos indígenas e de outras minorias estava fadada à extinção mediante assimilação à cultura e ao modo de vida da maioria nacional”. Hoje, o Brasil assume a postura de Estado “pluriétnico e multicultural, em que cada grupo assume as rédeas de sua própria história”.

A 6CCR é taxativa ao afirma que a proposta não traz qualquer pretensão de avanço ou benefício aos povos indígenas. Uma pretensa interação com os povos indígenas já está garantida no texto constitucional vigente, segundo a nota. Para o MPF, “a interação constante dos povos ocorre sem a necessidade de interferência ou medidas como a ora proposta, sob pena de se reestabelecer o viés integracionista, fundado em interesse de terceiros, e não no fluxo natural de interculturalidade e dentro da própria organização social do grupo”.

Diversidade Segundo a nota, a PEC 187desconsidera as diferenças culturais das populações indígenas do Brasil, que conta com 305 etnias e 274 línguas de acordo com o censo do IBGE de 2010 – “diversidade que impõe ainda maior cautela em qualquer tipo de regra a ser estabelecida de maneira uniforme a todos os grupos”.

A Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF ressalta ainda a necessidade de evitar mudanças que signifiquem a redução de garantias: “a União está impedida de retroceder em matéria de direitos humanos, reduzindo o âmbito de proteção e amplitude de tais garantias”.

A Convenção 169 da OIT, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro, é destacada na nota técnica. A convenção impõe, entre outras obrigações, a necessidade de consulta prévia, livre e informada, para a adoção de quaisquer medidas legislativas ou administrativas que afetem diretamente os povos indígenas. A norma internacional também determina que os governos adotem medidas em cooperação com os povos interessados para proteger e preservar o meio ambiente dos territórios que eles habitem.

A 6CCR ainda refuta a compreensão de que as terras indígenas não geram lucros. Só no Brasil as terras indígenas demarcadas geram uma quantia líquida de U$ 26 bilhões por ano, referentes a redução de emissão de CO2. De acordo com o MPF, portanto, é equivocada a noção de que as terras indígenas devam se submeter a todo custo à ótica da exploração máxima do capital e da devastação ambiental.

Leia a íntegra da Nota Técnica.

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