A pedido do Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM), a Justiça determinou o bloqueio de bens em nome da Cooperativa Extrativista Mineral Familiar do Garimpo do Rio Juma (Cooperjuma), responsável pelo garimpo do Juma, situado entre os municípios de Novo Aripuanã e Apuí, interior do Amazonas, e da empresa Embloco Indústria e Comércio de Exploração e Beneficiamento de Minerais Ltda., que comprou posteriormente o direito de explorar minérios na área. A empresa e a cooperativa devem, ainda, apresentar plano emergencial de manutenção e recuperação das barragens de rejeitos deixadas no local no prazo máximo de 90 dias.
A decisão atende a pedidos do MPF/AM em ação civil pública ajuizada para exigir a recuperação de todos os danos causados ao meio ambiente pelas atividades de exploração de minério de ouro no garimpo do Juma. Para garantir o custeio das medidas de recuperação que poderão ser determinadas na sentença, a Justiça também obrigou a cooperativa e a empresa a realizarem caução real, respectivamente, dos valores de R$ 110 milhões e R$ 55 milhões, mesmos valores a serem bloqueados pela Justiça.
Aos órgãos de fiscalização, a decisão da Justiça determina abstenção de concessão ou renovação de licenças ou autorizações para qualquer atividade de extração mineral em toda a região do garimpo do Juma, sob pena de multa diária de R$ 10 mil a ser aplicada ao patrimônio pessoal dos gestores do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). As atividades de exploração de minérios e reprocessamento de rejeitos minerais na área do garimpo e em seu entorno foram proibidas pela Justiça.
Os órgãos processados devem ainda elaborar plano de fiscalização na área explorada para vistorias periódicas a cada três meses, com apresentação dos relatórios detalhados à Justiça para permitir o acompanhamento dos riscos e monitoramento de possível agravamento de danos ambientais. Caso descumpram a determinação judicial, os gestores podem ser multados pessoalmente em R$ 100 mil.
Na decisão, a Justiça reconhece o descaso do poder público no acompanhamento e fiscalização da atividade que levou à devastação do local e chama a atenção para o risco de rompimento das barragens lá deixadas, sem qualquer manutenção. “Não é preciso ser perito para saber dos graves danos decorrentes do rompimento de barragens de rejeitos minerais, independentemente do tamanho ou volume destas barragens. Basta pensarmos no desastre ecológico de Mariana-MG, quando do rompimento de barragem de rejeitos minerais da empresa Samarco”, cita trecho do documento.
A ação civil pública segue em tramitação na 7ª Vara Federal do Amazonas, sob o número 2733-78.2017.4.01.3200. Cabe recurso em relação à decisão.
Descaso e prejuízos – Considerando a estimativa feita pelo Ipaam (dez toneladas de ouro retiradas do local), supõe-se que o bem da União obtido ilicitamente na exploração dos recursos minerais então existentes foi de R$ 1,1 bilhão. A Cooperjuma, portanto, teria recebido R$ 1,1 milhão desse valor. No entanto, seus representantes atualmente alegam que a mesma não possui recursos para realizar as medidas compensatórias a que se comprometeu no licenciamento ambiental e no acordo assinado com os órgãos ambientais, tendo inclusive celebrado contrato de arrendamento com a empresa Embloco – também processada pelo MPF – para tentar se livrar das responsabilidades ambientais.
Para a Justiça Federal, o total descontrole na exploração de minério no garimpo do Juma é resultado de descaso do poder público, que tratou o caso com “displicência”, ao autorizar o empreendimento de exploração mineral sem ter conhecimento das regras de funcionamento, dos componentes e patrimônio da cooperativa responsável. “A falta de compromisso, organização, controle e planejamento para permitir atividades desta envergadura pode resultar em ausência absoluta de meios para responsabilizar aqueles que tenham se beneficiado, de fato, com a exploração do minério de ouro na região”, alertou trecho da decisão.
Unidade de conservação – Na ação, o MPF/AM menciona manifestação do Instituto Chico Mendes de Preservação da Biodiversidade (ICMBio) de que a área do garimpo coincide em sua maior parte com uma Unidade de Conservação Federal, a Floresta Nacional Aripuanã. A questão envolvendo a criação dessa unidade de conservação federal e outras do Sul do Estado do Amazonas tem sido alvo de pressão por parlamentares do Amazonas, que querem a revisão dos decretos de criação de áreas protegidas editados pela ex-presidente Dilma Rousseff antes de deixar o governo, para reduzir o tamanho das reservas.
Nos pedidos finais, o MPF quer ainda que os processados sejam obrigados a realizar ações educativas sobre a necessidade de compatibilizar a atividade garimpeira com a preservação ambiental e que o Estado do Amazonas realize estudos de viabilidade para criação e implementação de unidade de conservação na região onde funcionou o garimpo do Juma. O órgão quer ainda obrigar o Estado do Amazonas a reconhecer publicamente a violação de direitos humanos ocorrida no garimpo, decorrente da omissão dos órgãos em fiscalizar as irregularidades e as condições desumanas vivenciadas no local.
Devastação – A exploração de ouro no local esteve no auge entre 2007 e 2012, quando milhares de trabalhadores foram à região em busca da promessa de enriquecimento rápido no chamado “Eldorado do Juma”. Distante da presença do Estado, já que a área de garimpo fica a centenas de quilômetros da sede urbana do município de Novo Aripuanã, a paisagem no local foi transforada em poucos anos: assoreamento do rio Juma por rejeitos de barragens rompidas – que afetam também a bacia do rio Madeira, grandes clareiras abertas na mata, lençóis freáticos e rios contaminados. As condições precárias de sobrevivência no local levaram à morte dezenas de pessoas que se arriscaram, com a anuência dos órgãos do Estado, a trabalhar no local. Estimativas do Ipaam dão conta de que foram retiradas em torno de dez toneladas de ouro da área.
Na avaliação do MPF/AM, os fatos demonstrados pela ação causaram grave dano social e violações a direitos humanos, como o direito à saúde dos garimpeiros e pessoas afetadas pela atividade e o direito à dignidade, dentre outros. Por isso, o órgão pediu à Justiça que condene os processados ao pagamento de danos morais coletivos em valor não inferior a R$ 1 milhão, a ser determinado pela Justiça, devendo o valor ser destinado à melhoria da qualidade socioeconômica e socioambiental da região do garimpo do Juma e aos cidadãos dos municípios de Novo Aripuanã e Apuí.
Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no Amazonas
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