Quando a água é liberada a partir das turbinas está sob pressão considerável – por exemplo, no caso Tucuruí, a pressão é de aproximadamente quatro atmosferas devido ao peso da água no nível das entradas das turbinas (atualmente em 40 m de profundidade), além de uma atmosfera de pressão devido ao peso do ar acima do reservatório. Esta pressão é reduzida de repente para uma atmosfera na hora que a água emerge das turbinas, causando uma imediata emissão de gases. Grande parte desta emissão ocorrerá quase que imediatamente.
Muitas estimativas das emissões de hidrelétricas simplesmente ignoram as emissões das turbinas e dos vertedouros, inclusive as estimativas no primeiro inventário nacional do Brasil de emissões de gases de efeito estufa [1]. O Segundo Inventário Nacional Brasileiro e o relatório sobre emissões que foi lançado como prelúdio ao terceiro inventário nacional ignoraram as emissões de hidrelétricas por completo [2, 3]. A maioria dos outros países também tem ignorado essas emissões, sendo que reportá-las é, atualmente, opcional.
Outra fonte de emissão, muitas vezes ignorada é dióxido de carbono (CO2) da decomposição de madeira de árvores em pé deixadas acima da água no reservatório (por exemplo, nas comparações no relatório especial do IPCC sobre as energias renováveis). Isto pode ser substancial em reservatórios amazônicos (e.g., [4-6]).
As emissões provenientes da decomposição de árvores ocorrem nos primeiros poucos anos da vida do reservatório, fazendo com que esta emissão seja particularmente importante do ponto de vista dos interesses da sociedade humana [7].
NOTAS
[1] Brasil, MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia). 2004. Comunicação Nacional Inicial do Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. MCT, Brasília, DF. 276 p. [Disponível em: http://www.mct.gov.br/upd_blob/0005/5586.pdf].
[2] Brasil, MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia). 2010. Segunda Comunicação Nacional do Brasil à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. MCT, Brasília, DF, 2 Vols., 520 p. [Disponível em: http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/326751.html].
[3] Brasil, MCTI (Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação). 2013. Estimativas Anuais de Emissões de Gases de Efeito Estufa no Brasil. MCTI, Brasília, DF, 76 p. [Disponível em: http://www.mct.gov.br/upd_blob/0226/226591.pdf].
[4] Abril, G., Parize, M., Pérez, M.A.P., Filizola, N. 2013. Wood decomposition in Amazonian hydropower reservoirs: An additional source of greenhouse gases. Journal of South American Earth Sciences 44: 104–107. doi: 10.1016/j.jsames.2012.11.007.
[5] Fearnside, P.M. 1995. Hydroelectric dams in the Brazilian Amazon as sources of ‘greenhouse’ gases. Environmental Conservation 22: 7-19. doi: 10.1017/S0376892900034020.
[6] Fearnside, P.M. 2009. As hidrelétricas de Belo Monte e Altamira (Babaquara) como fontes de gases de efeito estufa. Novos Cadernos NAEA 12(2): 5-56.
[7] Isto é uma tradução parcial atualizada de Fearnside, P.M. 2015. Emissions from tropical hydropower and the IPCC. Environmental Science & Policy50: 225-239. http://dx.doi.org/10.1016/j.envsci.2015.03.002. As pesquisas do autor são financiadas por: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (processos nº305880/2007-1, nº304020/2010-9, nº573810/2008-7, nº575853/2008-5), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM) (processo nº 708565) e Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) (PRJ13.03).
A fotografia do lago de Tucuruí acima é de autoria de Alberto César Araújo/2017.
Leia os artigos da série: Hidrelétricas e o IPCC
Hidrelétricas e o IPCC: 2 – Barragens nos relatórios e diretrizes
Hidrelétricas e o IPCC: 3 – Escolha enviesada de literatura
Hidrelétricas e o IPCC: 4 – Barragens tropicais emitem mais
Hidrelétricas e o IPCC: 5 – Emissões de gases nos inventários nacionais
Hidrelétricas e o IPCC: 6 – As diretrizes de 2006
Hidrelétricas e o IPCC: 7 – Reservatórios como “áreas úmidas”
Philip M. Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências e também coordena o INCT (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia) dos Serviços Ambientais da Amazônia. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 500 publicações científicas e mais de 200 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis neste link.
Por: Philip Martin Fearnside | 01/03/2017 às 19:37
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