Representantes do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU) propuseram às famílias desassentadas pelo projeto Portal da Amazônia, de revitalização da orla de Belém (PA), que mantenham um contato mais frequente com as duas instituições, para possibilitar uma melhor fiscalização da atuação dos órgãos responsáveis pelo reassentamento das famílias.

Imóvel que deveria ter sido entregue em 2010 para família desalojada: abandono (foto: Ascom MPF/PA)

A proposta foi apresentada pelo Procurador Regional dos Direitos do Cidadão no Pará, Felipe de Moura Palha e Silva, e pela defensora pública da União Mayara Barbosa Soares em vistoria realizada nesta quinta-feira, 2 de fevereiro, nas construções inacabadas que deveriam ter sido entregues às famílias em 2010, no trecho da orla localizado no bairro do Jurunas.

O MPF e a DPU convidaram as lideranças locais a participarem de uma rotina de reuniões periódicas com as duas instituições para discussão dos problemas, monitoramento das soluções e estabelecimento de demais estratégias para que as famílias tenham seus direitos respeitados.

O Procurador Regional dos Direitos do Cidadão destacou que, mais que buscar a punição dos responsáveis pelos atrasos no atendimento às famílias, o objetivo do MPF e da DPU é buscar uma solução definitiva para o reassentamento desses cidadãos.

Felipe de Moura Palha também anunciou que o MPF vai promover uma audiência pública para que o tema seja diretamente e amplamente discutido entre as famílias impactadas e os agentes públicos responsáveis pelo projeto Portal da Amazônia.

O objetivo da audiência será o de cobrar dos agentes públicos a inclusão dos cidadãos nas definições relativas ao planejamento e execução das soluções, além de reforçar a necessidade de estabelecimento de um diálogo sólido e transparente com as famílias, com dados confiáveis e não contraditórios.

A data e local da audiência pública serão divulgados pelo MPF assim que estiver concluída a etapa de planejamento do evento.

No último dia 26, o MPF e a DPU fizeram inspeção na Vila da Barca, onde famílias enfrentam uma situação bastante semelhante, e lá também foi anunciado a realização de audiência pública (confira aqui detalhes sobre a vistoria na Vila da Barca).

Só 4% atendidos – Lideranças das famílias ainda não reassentadas pelo projeto Portal da Amazônia  informaram que a retirada das famílias da orla começou em 2008, e que a proposta da prefeitura de Belém era de concluir o reassentamento dessas famílias até 2010.

O plano anunciado da prefeitura, segundo as lideranças entrevistadas na vistoria, era reassentar as famílias em área próxima à área originalmente ocupada pelo grupo, e com infraestrutura adequada de urbanismo e de acesso a políticas públicas de transporte, saúde e educação.

No entanto, das 360 famílias impactadas, apenas 16 (4,4% do total) já estão assentadas em definitivo, em edifício de dois blocos construído próximo à orla. Há vários outros edifícios cujas construções foram interrompidas em suas etapas iniciais, e esses imóveis inacabados estão sendo invadidos, provavelmente, segundo as famílias, por criminosos que utilizam o local como ponto de consumo e de venda de drogas, gerando insegurança para os moradores vizinhos.

Desinformação – Os itens mais criticados pelas famílias ainda não reassentadas foram a falta de transparência e de diálogo, por parte do poder público municipal, sobre o destino delas. Há uma série de informações desencontradas sobre como e quando essas famílias serão atendidas.

Há moradores, por exemplo, que receberam a informação de que as famílias serão deslocadas para a Pratinha II, bairro distante do bairro de origem, o Jurunas. De acordo com algumas famílias, essa mudança de área de reassentamento seria para possibilitar a instalação de uma unidade de saúde no terreno anteriormente reservado para instalação das famílias impactadas.

Outros receberam a informação de que os novos edifícios para as famílias no bairro do Jurunas não estão sendo construídos porque os agentes participantes do projeto de reurbanização – Caixa Econômica Federal, prefeitura de Belém e Ministério das Cidades – não estariam fazendo adequadamente o repasse de recursos.

Por outro lado, há quem tenha sido informado que a paralisação das obras é provocada por irregularidades ou descaso das empresas contratadas ou por questionamentos feitos por empresas nos processos licitatórios.

Outra questão bastante criticada pelas famílias ainda não reassentadas é que o poder público não abre oportunidades para que as próprias famílias apresentem propostas de soluções ou sugestões às decisões tomadas. Parte das famílias, por exemplo, prefere receber cheque-moradia, para que elas mesmas providenciem a construção de suas casas, a serem realocadas em conjuntos habitacionais.

As famílias também destacam que o número de casas a serem construídas não é suficiente para atender todas as famílias desalojadas para a construção do projeto.

Dúvidas – Mesmo em relação ao trabalho já concluído, de reassentamento das primeiras 16 famílias, não há certeza, entre as 344 famílias ainda não reassentadas, sobre quais foram os critérios para a seleção desses primeiros beneficiados e se os atuais ocupantes dos apartamentos distribuídos receberam a documentação dos imóveis. Há suspeitas, ainda, de que parte das moradias já prontas tenha sido invadida por famílias que não moravam na região da orla e que, portanto, não foram diretamente impactadas pelo projeto Portal da Amazônia.

Ainda em relação ao início do projeto, as famílias informaram o MPF e a DPU que não houve avaliação do valor financeiro dos imóveis derrubados para dar lugar ao projeto Portal da Amazônia.

Contas caras e repasses atrasados – Além das informações raras, precárias e contraditórias a que as famílias têm acesso, outra grande preocupação das famílias é sobre a enorme dificuldade de conseguirem uma moradia minimamente digna com o valor irrisório do aluguel social pago pelo poder público, de R$ 500, e com o aumento dos valores das contas de água e energia elétrica.

Várias das lideranças entrevistadas pelo MPF e DPU relataram que, para conseguirem pagar aluguéis em Belém, é preciso que as famílias invistam parte da sua baixa renda na complementação do aluguel social. Recursos que antes do remanejamento as famílias aplicavam em saúde e educação hoje acabam indo para o pagamento de aluguéis.

Além de o valor do aluguel social estar defasado em relação aos valores cobrados no mercado imobiliário da capital, a questão é ainda mais grave porque o repasse desses recursos está atrasado.

Quanto ao pagamento das contas de água e luz, antes do remanejamento os valores cobrados eram menores porque as famílias tinham acesso a programas de assistência social do poder público que dão descontos tarifários, benefício que as famílias perderam após a saída das suas moradias originais.

Desagregação – As famílias também reclamam bastante do aumento da desagregação social e da insegurança. Segundo os impactados, antes do remanejamento as famílias se conheciam, tinham profundos laços de vizinhança, de solidariedade e apoio. Depois do lançamento do projeto, a dispersão das famílias para residências quebrou essa possibilidade de coesão e aumentou a vulnerabilidade dos moradores da região, o que aumentou os índices de criminalidade de modo expressivo.

Toda essa situação tem gerado angústia e desespero para esses cidadãos, não sendo raros os casos de relatos de adoecimento entre eles provocados pela depressão, cansaço físico e mental e transtornos psicológicos.

 

Fotos: http://bit.ly/vistoriaportalamazonia

 

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