Desmatamento, agricultura e pecuária modificam composição química do solo e levam micro-organismos a se adaptarem para manter equilíbrio do ecossistema.
A forma como é preparado o solo tem ligação direta com as respostas das comunidades microbianas na região amazônica, atesta pesquisa realizada pelo Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP, em Piracicaba. O estudo do biólogo Lucas William Mendes demonstra que a substituição da floresta nativa por áreas de agricultura e pecuária tem modificado a composição química do solo e levado os micro-organismos a se adaptarem para sobreviver e manter o equilíbrio do ecossistema. O conhecimento dessas adaptações pode ajudar a encontrar maneiras sustentáveis de melhorar a fertilidade do solo.
Para a pesquisa foram coletadas amostras de solo em áreas de floresta nativa, área desmatada, agricultura (plantio de soja) e pastagem. “As coletas foram realizadas na região Centro-Oeste do Brasil, no Estado do Mato Grosso, numa região conhecida como ‘arco do desmatamento’, devido ao intenso processo de conversão da floresta em agricultura”, conta o pesquisador. “Foram realizadas quatro coletas durante o período de 2009 a 2011, compreendendo o período de chuva e seca da região.”
O estudo avaliou o efeito das mudanças do uso do solo, ou seja, a conversão de áreas de floresta em agricultura e pastagem, sob as comunidades de micro-organismos. “Como as comunidades microbianas têm papel fundamental na manutenção da qualidade do solo, é de suma importância entender sua resposta aos distúrbios da paisagem ocasionados pelo crescimento da agricultura na região amazônica”, afirma Mendes.
Para a análise da diversidade microbiana foi feito o sequenciamento massivo (metagenômica) a partir de DNA extraído das amostras do solo. “As comunidades microbianas estão envolvidas em processos biogeoquímicos, ciclagem de nutrientes e até mesmo emissão de gases do efeito estufa, tendo um papel considerável na manutenção da qualidade do solo”, aponta o pesquisador.
A conversão da floresta em áreas de agricultura ou pastagem é feita por meio do “corte e queima”, seguidos pelo preparo do solo para o plantio. “Essa atividade tem grande efeito sobre o solo, alterando drasticamente sua composição física e química”, aponta Mendes. Segundo o biólogo, alguns grupos microbianos respondem a alterações em parâmetros específicos, como pH, sódio, alumínio, entre outros. Portanto, é possível afirmar que a alteração química do solo, provocada pelo tipo de manejo, é o principal fator que afeta o microbioma presente ali.
Ao avaliar a diversidade em detalhes, a pesquisa concluiu que o aumento da diversidade nas áreas alteradas levou a uma redundância funcional, ou seja, diferentes grupos de micro-organismos realizando uma mesma função. “A redundância funcional é importante para manter o funcionamento do sistema, uma vez que drásticas alterações do solo podem eliminar alguns grupos”, explica o cientista. “Dessa forma, o ambiente em equilíbrio é mantido por uma baixa diversidade, mas alta abundância microbiana, enquanto um desequilíbrio leva a um aumento da diversidade para que funções importantes do ecossistema não sejam perdidas.”
Premiado na categoria Ciências Agrárias do Prêmio Tese Destaque USP deste ano, o trabalho foi orientado pela professora Siu Mui Tsai, no Laboratório de Biologia Celular e Molecular do Cena. Parte do estudo aconteceu no Netherlands Institute of Ecology (NIOO-KNAW), em Wageningen (Holanda), sob a supervisão de Eiko Eurya Kuramae.
O próximo passo, ele anuncia, é identificar os grupos de micro-organismos que promovam benefícios às plantas, de modo a auxiliar a produção agrícola, melhorando a fertilidade do solo e promovendo um uso mais sustentável do meio ambiente. Um exemplo prático seria estimular o aumento dos grupos microbianos que fixam nitrogênio no solo, diminuindo assim o uso de insumos artificiais.
Por Júlio Bernardes – Editorias: Ciências Agrárias, Ciências Ambientais, Ciências Biológicas – Jornal da USP – Substituição de floresta altera comunidades de micro-organismos no solo da Amazônia – Jornal da USP