São duas Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) e dois Refúgios de Vida Silvestre (RVS), que protegem os ambientes naturais, a vida silvestre e populações ribeirinhas. Duas delas, a RVS Tabuleiro do Embaubal e a RDS Vitória de Souzel estão na área de influência da usina de Belo Monte.
No dia 17 de junho último o governo do Estado do Pará publicou os decretos que criam a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Vitória de Souzel e o Refúgio de Vida Silvestre Tabuleiro do Embaubal, no município de senador José Porfírio e a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Campo das Mangabas e o Refúgio de Vida Silvestre Padre Sérgio Tonetto, no município de Maracanã. Havia seis anos que o governo estadual não criava nenhuma nova Unidade de Conservação.
A estratégia de conservação utilizada foi a combinação das categorias e sua disposição territorial – uma Reserva de Vida Silvestre mais central, unidade de proteção integral, circundada em grande parte por uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável, unidade de uso sustentável destinada a salvaguardar o modo de vida de populações tradicionais. Todas se destacam pela rica biodiversidade e há muito tempo, em alguns casos desde a década de 1970, se discutia a necessidade de criar Ucs na região do Tabuleiro do Embaubal para a proteção dos ambientes naturais, da vida silvestre e do modo de vida das populações ribeirinhas.
Para o diretor de Gestão da Biodiversidade do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-Bio), responsável pelo processo de criação de Ucs, Crisomar Lobato, foi uma grande vitória, criar essas quatro Ucs na Amazônia depois de seis anos”.
Refúgio de Vida Silvestre Tabuleiro do Embaubal e a RDS Vitória de Souzel
Criadas pelo decreto nº 1566/2016, o Refúgio de Vida Silvestre Tabuleiro Embaubal, com 4.034 hectares, e a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Vitória de Souzel, com 22 957 hectares têm relação com o cumprimento das condicionantes das licenças ambientais da usina de Belo Monte. O Tabuleiro, considerado berço dos quelônios na Amazônia, recebe anualmente mais de 20 mil tartarugas que ali depositam seus ovos. Muitas viajam até 400 quilômetros para encontrar as praias de bancos de areia altos da região, ideais para o nascimento dos filhotes (veja box no final do texto sobre os impactos de Belo Monte). Esse território, também chamado de Tabuleiro das Tartarugas, foi seriamente impactado pela construção da usina. Além das tartarugas, abriga outros quelônios como os tracajás e pitiús ou iaçás, duas espécies de boto, peixes-boi, jacarés, aves aquáticas e a floresta de ilha. Na região amazônica o grupo composto por tartarugas, cágados, tracajás, jabutis e outros répteis com carapaça, são de extrema importância para as comunidades locais por questões culturais, alimentares, nutricionais e ecológicas.
Para advogada do ISA Biviany Rojas, que acompanha de perto o cumprimento de condicionantes da usina de Belo Monte, a criação do Refúgio e da RDS demorou. “Mas essas Unidades são importantes para proteger as áreas da intensificação da pressão fundiária na região após o enchimento dos reservatórios e a desativação dos canteiros de obras da usina. Entretanto, elas precisam ser implementadas, sair do papel”, adverte. Biviany lembra ainda que já existem famílias ribeirinhas e de pescadores na região do Tabuleiro e que a pressão dos que foram expulsos por conta do enchimento do reservatório, sem um processo adequado e digno de reassentamento, pode gerar conflitos.
Os limites do Refúgio de Vida Silvestre Tabuleiro do Embaubal e da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Vitória de Souzel, que o circunda, já constavam no estudo técnico que fundamentou a proposta de criação: “Diagnóstico Ambiental, Socioeconômico e Fundiário para a Criação de Ucs de proteção integral e uso sustentável Tabuleiro do Embaubal, município de José Porfírio/PA – 2013”. O diretor do Ideflor-Bio, Crisomar Lobato, avalia que as Ucs do Rio Xingu são de extrema importância para proteger o maior ninhal de postura das tartarugas da Amazônia, local da maior concentração da espécie na América Latina. E que criar a RDS no entorno teve como objetivo trabalhar ações de desenvolvimento sustentável com as cerca de 100 famílias ribeirinhas da região. (Clique para ver a localização no mapa).
É necessário garantir a proteção dos recursos ambientais e sócio-culturais existentes na área, assegurar sua integridade e a manutenção do equilíbrio ecológico, garantir o desenvolvimento de projetos alternativos que proporcione renda às famílias, promover a educação ambiental para diminuir a pressão humana sobre a biodiversidade aquática e terrestre do local, incentivar as comunidades locais a proteger os quelônios e demais espécies existentes na região, e também melhorar a qualidade de vida dessa população.
RDS Campo das Mangabas e Refúgio de Vida Silvestre Padre Sérgio Tonetto
RDS Campo das Mangabas e Refúgio de Vida Silvestre Padre Sérgio Tonetto Criadas pelo decreto 1567/2016, a RDS Campo das Mangabas, com 7062 hectares, e o Refúgio de Vida Silvestre Padre Sérgio Tonetto, com 339 hectares, se localizam no município de Maracanã, na região do Salgado Paraense, próximo à foz do Rio Amazonas. A solicitação de criação foi feita à Secretaria Estadual de Meio Ambiente pela Associação de Pescadores e Agricultores da Comunidade de Aricuru e pela Comissão Pastoral da Terra, embasada no “Estudo Técnico para a criação de UC na categoria RDS Campo das Mangabas no município de Maracanã/PA (2013)”. Pediam que fossem tomadas providências para evitar a continuidade das ações predatórias em curso no Campo das Mangabas como a ocupação desordenada, derrubada da vegetação nativa para plantio de espécies exóticas e queima constante na época de estiagem, entre outros. (Clique para ver a localização no mapa).
O destaque dessa região é a ocorrência de um ecossistema único e bem pouco representado no Pará: uma combinação de floresta ombrófila densa de terras baixas e campo cerrado, distintas em composição de espécies da flora, fauna e importância ecológica. Também nesse caso, como nas Ucs de Senador José Porfírio, a RDS foi delimitada englobando parcialmente a RVS. De acordo com Crisomar Lobato, todas as comunidades que reivindicavam a criação da Reserva foram contempladas: 13 estão diretamente beneficiadas pela criação – três delas localizadas no entorno e 10 em seu interior. As atividades extrativistas das comunidades incluem coleta e venda de frutas como mangaba, murici e bacuri.
Os impactos de Belo Monte no Tabuleiro
Há exatos quatro anos, em junho de 2012, o Ministério Público Federal abriu uma investigação sobre a Norte Energia, empresa responsável pela construção da hidrelétrica de Belo Monte, por causa de denúncias de imperícia de uma empresa subcontratada, a Biota Soluções Ambientais. Segundo o MPF, entre as condicionantes previstas estava o manejo correto dos ninhos de tartaruga evitando as ameaças, mitigando os impactos das obras de Belo Monte e salvando os filhotes ameaçados para garantir a reprodução da espécie. Em vez disso as ações causaram a morte de milhares de filhotes por total desconhecimento dos métodos de manejo adequados no Tabuleiro.
Além disso, durante a construção da usina, essa área registrava tráfego intenso de barcos e balsas que transportavam materiais causando a morte de tartarugas. Praias importantes para a desova foram dragadas para utilização de areia na construção da usina. Com a entrada em funcionamento de Belo Monte, hoje o tráfego diminuiu, mas alterações no ambiente de desova ainda permanecem. Daí a necessidade de se adotar novas medidas de proteção e conservação durante a fase de operação.
“O Ibama há três anos não faz a proteção no período reprodutivo das tartarugas”, alerta a pesquisadora da Universidade Federal do Pará, Cristiane Costa”. Estes são alguns dos desafios que a Secretaria do Meio Ambiente do Pará irá enfrentar a partir de agora.
Entre as condicionantes específicas da Licença de Operação de Belo Monte, há duas diretamente relacionadas ao ecossistema do Refúgio de Vida Silvestre Tabuleiros do Embaubal: o Projeto de Monitoramento Hidrossedimentológico (condicionante 2.15); e a continuidade das atividades do Projeto Pesquisa sobre Ecologia e Manejo de Quelônios para mensurar e mitigar impactos (condicionante 2.23).
Por: Marina Spindel, Silvia Futada
Fonte: ISA
Edição: Inês Zanchetta
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