Em audiência na Câmara dos Deputados, Victoria Tauli-Corpuz ouviu relatos e recebeu denúncias sobre o ataque aos direitos indígenas no Brasil.
A relatora especial sobre direitos dos povos indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU), Victoria Tauli-Corpuz, chegou no Brasil na última segunda-feira (07) para verificar e coletar dados sobre as violações aos direitos e outras dificuldades enfrentadas pelos povos indígenas do Brasil nas diferentes regiões do país. Nesta terça-feira (08), ela participou de uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados. Na ocasião, ela recebeu em mãos documentos-denúncia e ouviu de lideranças indígenas as situações trágicas em que suas comunidades se encontram. Além de parlamentares e organizações indígenas e indigenistas, também estavam presentes representantes dos movimentos quilombola e dos pequenos agricultores rurais.
Em depoimento emocionado, Rosane Kaingang contou sobre os ataques mais recentes às aldeias nos estados do Rio Grande do Sul e lembrou o assassinato do pequeno Vitor Pinto, Kaingang de apenas dois anos degolado em Imbituda (SC), em dezembro de 2015. Ela também criticou o arquivamento dos inquéritos não concluídos sobre os indígenas mortos em conflitos e a impunidade. “Quero dizer à ONU: chega de fazer recomendações, o Brasil precisa ser punido! A corte internacional precisa tomar uma decisão imediatamente”, exigiu.
Paulino Montejo, da coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), discursou mais amplamente sobre o ataque sistemático de todos os poderes do Estado contra os direitos indígenas, “na perspectiva de um assustador plano etnocida e, quem sabe, genocida”. Ele falou também que a situação atual de decisões políticas não agrada os povos indígenas e as bases de atuação estão preocupadas e desamparadas. A exemplo disso, o movimento divulgou recentemente um manifesto contra a política anti-indígena do governo Dilma. A Rede de Cooperação Amazônica também publicizou no último mês uma nota de repúdio ao veto da presidência ao projeto que fortalece línguas indígenas no ensino fundamental.
Em tramitação na Casa, a PEC 215, proposta de Ementa Constitucional que transfere do Executivo para o Legislativo o poder de decisão sobre as demarcações de terras indígenas e territórios quilombolas, também foi pauta da audiência. Tauli-Corpuz questionou as consequências da aprovação da proposta.
“Quais são as chances de essas populações terem seus títulos territoriais se essa responsabilidade passar ao Legislativo? Se o Congresso é dominado por parlamentares que gostariam de adquirir as terras para seus próprios interesses, então eu avalio que seria apenas uma vaga chance. Isso é uma preocupação muito séria. Defender o direito à terra é defender o direito à vida. É responsabilidade do Estado proteger e garantir os direitos dos povos tradicionais”, declarou.
Ela também mostrou preocupação com outros projetos em tramitação no Congresso que ameaçam os direitos indígenas, como o Projeto de Lei do Senado (PLS) 654, que flexibiliza e fragiliza o licenciamento ambiental, e o PL 1.610, que pretende liberar a mineração em terras indígenas.
A reunião faz parte da agenda de atividades previstas até o dia 17 de março. Além da capital, Brasília, ela visitará comunidades indígenas nos estados de Mato Grosso do Sul, Bahia e Pará. A visita terá como resultado a produção de um relatório, com recomendações, a ser apresentado à Comissão de Direitos Humanos da ONU e ao governo brasileiro, em setembro.
Relatoria da ONU
A Relatoria Especial sobre Direitos dos Povos Indígenas da ONU foi criada em 2001 pela Comissão de Direitos Humanos da organização em virtude das inúmeras formas de discriminação e violações de direitos dos povos indígenas ao redor do mundo. Victoria Tauli-Corpuz é uma liderança indígena do povo Kankanaey Igorot, das Filipinas. Ela presidiu o Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Questões Indígenas entre 2005 e 2010 e, há trinta anos, seu trabalho tem como foco a criação de organizações e movimentos envolvidos com povos indígenas, mulheres, o aumento da consciência social e mudanças climáticas.
Mariana Azevedo
FONTE: CTI
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