Para enfrentar a seca que castiga Roraima desde setembro do ano passado, o Governo do Estado assinou, na manhã de ontem, dia 22, o decreto que declara situação de emergência em dez dos 15 municípios roraimenses. O objetivo da medida é acelerar as ações de combate à estiagem, que vem trazendo prejuízos ao setor agropecuário e prejudicando até mesmo o fornecimento de água à população em algumas regiões.
O decreto de número 20.368-E contempla os municípios de Amajari, Alto Alegre, Bonfim, Cantá, Caracaraí, Mucajaí, Normandia, Pacaraima, Rorainópolis e São Luiz do Anauá. A partir de agora, todos os órgãos estaduais estão autorizados a atuarem sob a coordenação da Defesa Civil, nas ações de reposta ao desastre.
O documento também determina que ficam dispensados de licitação os contratos de aquisição de bens necessários às atividades de resposta ao desastre, de prestação de serviços e de obras relacionados com a reabilitação dos cenários dos desastres, desde que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 dias. O comandante-geral do Corpo de Bombeiros, coronel Edivaldo Amaral, informou que os outros quatro municípios, fora a Capital, que não foram contemplados no decreto podem ser inclusos na próxima semana.
Ele frisou que uma prática que colabora para o agravamento da situação são as queimadas não autorizadas. “Iremos contratar mais brigadistas para que possam atuar no combate de incêndios em propriedades rurais e demais localidades onde seja necessário”, disse.
A governadora Suely Campos (PP) informou que parte dos R$ 250 milhões destinados ao Estado pelo Fundo de Desenvolvimento da Amazônia (FDA), anunciados ontem pelo ministro da Integração Nacional, Gilberto Occhi (veja matéria na página 02A), serão investidos em ações para o combate à estiagem. “Estamos enfrentando uma situação histórica. A atual estiagem se compara ao que enfrentamos no ano de 1998. Precisamos agir de forma imediata para amenizar os efeitos da seca e impedir que a situação se agrave ainda mais”, declarou.
CAUSAS – A atual situação de estiagem enfrentada em Roraima deve-se às alterações climáticas provocadas pelo fenômeno El Niño, especialmente em sua atual manifestação, elevando a temperatura da superfície do mar nas águas do pacífico a patamares raramente alcançados, afetando consideravelmente o regime climático e, consequentemente, a redução da precipitação pluviométrica na Amazônia.
O quadro atípico vem se prolongando desde o ano de 2014 e, conforme o mais recente Boletim Climatológico do Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam), a previsão para os próximos três meses deste ano é de permanência deste quadro climatológico. (I.S)
Seca já afeta 40% dos produtores rurais
Além do combate aos incêndios florestais, o Governo do Estado terá outra missão a cumprir: atender as localidades que já apresentam problemas de desabastecimento de água potável. Segundo relatório da Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa), a falta de água já está afetando a 40% dos produtores rurais locais.
“Em relação ao combate a incêndios, o Corpo de Bombeiro já está com seus trabalhos em andamento e, sobre a questão do desabastecimento, nós esperávamos por isso, tanto que antes mesmo de iniciar o período de estiagem já estávamos em contato com o Ministério da Integração, justamente para relatar as nossas dificuldades. Repassamos os nossos relatórios, explicamos a eles a nossa realidade, as particularidades da nossa região. Ou seja, já vínhamos nos preparando para esse momento”, relatou o secretário adjunto da Agricultura, Antônio Cabral.
Segundo ele, as conversações com o Ministério da Integração Nacional haviam sido iniciadas desde setembro do ano passado, justamente para que a pasta tivesse conhecimento das dificuldades enfrentadas pelo Estado e agilizar o planejamento das ações para o ano seguinte.
“Nós sabíamos que isso ocorreria, já que os efeitos do El Niño estavam se potencializando desde o ano passado, então era necessário planejar o quanto antes as nossas ações. Pegamos a secretaria em uma situação bastante complicada, colocamos todas as situações em ordem, conseguimos antecipar todo o processo de produção de plano de ação, e agora, a nossa expectativa é atender essas áreas o mais rápido possível”, frisou.
Uma das exigências da comitiva formada pela Seapa, Corpo de Bombeiros e Defesa Civil era de que o próprio ministro da Integração constatasse a situação de calamidade enfrentada pelo Estado. “A grande dificuldade é acumular água e aqui, no nosso Estado. Não se tem o costume de acumular água, de fazer barragem em igarapé. Hoje, quando você faz uma barragem em igarapé, pensa-se em torná-lo algo perene, e a intenção desse plano é justamente fazer com que haja uma segurança maior nessa questão do abastecimento para os produtores rurais, principalmente para os criadores de bovinos, já que o gado já está sendo afetado”, destacou.
No levantamento da Seapa, os municípios de Alto Alegre, Amajari, Mucajaí, Iracema e Cantá estão entre as localidades mais prejudicadas pelo desabastecimento. Com a confirmação do decreto, os três órgãos deverão centrar esforços na construção mais 800 cacimbas, além da construção de barragens para atender as localidades que estão inclusas no decreto.
“Hoje nós temos mapeado as áreas mais afetadas para então fazer essas cacimbas. No ano passado, nós executamos a construção de 2.800 cacimbas e, para 2016, há previsão para mais 800. Além disso, estamos pleiteando junto ao ministério recursos para escavação de poços e construção de cisternas e barragens para acumular água. Além de barragens, justamente para perenizar igarapés e aumentar o alcance do lençol freático”, frisou. (M.L)
Rios secos dificultam a pesca
A forte estiagem que assola o Estado vem secando rios e lagos que servem de local de pesca para quase 10 mil pescadores artesanais que vivem dessa profissão em Roraima. Segundo o presidente da Colônia de Pescadores Z1 de Boa Vista, Raimundo Sobrinho, a longa estiagem está dificultando a pesca artesanal. São três anos seguidos que o inverno é abaixo da média e isso vem diminuindo a reprodução dos peixes nos principais rios do Estado: Tacutu e Uraricoera.
“Sem chuvas, os rios não têm vazão e os peixes não sobem para se reproduzir na piracema. Sem peixe, não tem como o pescador sobreviver e o pouco que tem está sendo vendido mais caro nas bancas. O peixe regional que se vendia por R$ 6,00 ou R$ 7,00 está sendo vendido por R$ 10,00 ou R$ 12,00 nas feiras”, frisou.
Em média, o volume de pesca vem diminuindo em 30% a cada ano. “Hoje temos cerca de 40% do pescado que abastece Boa Vista vindo de Manaus, além dos peixes criados em cativeiro. Nossa produção caiu muito nestes últimos três anos”, afirmou.
Sobrinho disse que a longa estiagem tem prejudicado muito as pescas devido a pouca profundidade dos afluentes menores que dão acesso aos grandes rios, que impedem os barcos pequenos de rabeta navegarem. “Não é falta de peixe, mas falta de acesso até chegar onde está o peixe, devido a pouca profundidade dos rios para se chegar até a área pesqueira do Estado, no Baixo Rio Branco. De lá são nove dias para chegar em Caracaraí. E tem que chegar logo devido ao gelo estar acabando. Toda essa dificuldade está fazendo o preço do pescado regional subir”, frisou.
A Z1 tem aproximadamente 6. 800 pescadores associados nos 15 municípios, mas existem mais sete colônias de pescadores espalhadas pelos municípios do interior, oito sindicatos de pescadores e três associações de pesca.
GAIOLAS – Diante da dificuldade, o presidente da Colônia de Pescadores Z1 de Boa Vista, Raimundo Sobrinho, informou que está buscando desenvolver um projeto alternativo para melhorar a pesca para os pequenos pescadores no Estado. “Estamos em parceria com a Femarh [Fundação Estadual do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos] e o Banco do Brasil num projeto de criação de peixe em gaiolas dentro do próprio rio. O primeiro projeto será desenvolvido no Murupu, com aproximadamente 420 gaiolas. Cada pescador associado terá seis gaiolas para criar e, com isso, ter uma renda a mais para sustentar a família”, frisou.
Por Isaque Santiago – Jornal Folha de Boa Vista
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