A redução do impacto ao clima devido ao uso da terra, principalmente pela agropecuária e produção florestal, depende de um fator econômico básico: a valorização monetária das árvores mantidas em pé ou plantadas para recompor o que foi destruído. Além do equilíbrio climático, está em jogo o fornecimento de alimento, madeira, fibra, biomassa para energia, químicos naturais e outros insumos na escala necessária à população global projetada para as próximas décadas. No rastro das oportunidades de mercado que surgem a partir da urgência na mitigação de gases do efeito estufa, começa uma corrida – no mundo e no Brasil – para se definir a conta da restauração florestal, quem a pagará, como e com qual retomo financeiro.
A recuperação da floresta em 12 milhões de hectares para diversos usos até 2030 está embutida no compromisso brasileiro de reduzir as emissões de carbono em 37% em 2025 com base nos índices de 2005. Ao se considerar os atuais valores médios do plantio de árvores nativas em mosaicos intercalados com eucalipto (RS 10 mil/ha), o custo da empreitada poderia atingir algo em tomo de R$ 120 bilhões, superior a todos os investimentos realizados pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC, de R$ 114,3 bilhões) entre janeiro e junho deste ano, segundo balanço do Ministério do Planejamento.
“O custo é monstruoso e o dinheiro não virá do bolso dos proprietários rurais, nem de linhas de crédito do governo, mas do mercado financeiro, se a atividade gerar retomo para o capital”, afirma o empresário Roberto Waack, liderança da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura. A organização iniciou estudo econômico inédito para saber em que condições o recobrimento do país com árvores pode se tomar um investimento atrativo. Além da questão climática, a demanda do Código Florestal soma entre 10 milhões e 20 milhões de hectares de passivos de reserva legal para recuperação nas propriedades rurais, “o que acontecerá se for bom negócio”.
Fazer a conta com maior precisão depende da implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), previsto no Código, e da aprovação do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg) – – marco legal que definirá como as reservas legais poderão ser exploradas economicamente, hoje no Ministério do Meio Ambiente para ajustes após consulta pública entre janeiro e julho.
Conduzido pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade, da Fundação Getúlio Vargas, e Instituto Escolhas, o estudo contabiliza as oportunidades com o manejo florestal. Para o suprimento da demanda brasileira, estima-se a necessidade de se multiplicar por dez a atual área de produção de madeira rastreada, até 2030. Hoje, apenas 10% a 20% das toras extraídas na Amazônia têm origem legal e sustentável, segundo dados da Coalizão. Essa pequena parcela compete em desigualdade com a produção ilegal, que tem custos 40% inferiores porque não adota práticas para redução de impactos e não paga impostos. Os pesquisadores pretendem medir quanto a legalização de 100% da madeira refletirá no desenvolvimento econômico e na quantidade de emissões de carbono evitadas devido à menor degradação florestal.
“O caminho é criar um programa nacional de fomento à pesquisa e desenvolvimento de silvicultura de espécies nativas para o Brasil repetir nesse campo o sucesso mundial obtido com a produtividade do eucalipto”, sugere Waack. O objetivo é tornar o modelo rentável e autofinanciável, a partir de uma escala de restauração variando entre 10 milhões e 20 milhões de hectares, ao custo atual de R$ 50 bilhões a R$ 100 bilhões, que precisaria ser reduzido ou compensado pela geração de receita. O montante máximo necessário para o conserto dos estragos no Brasil equivale a 20% da produção florestal mundial, de US$ 150 bilhões ao ano, considerando o valor das árvores e não dos seus subprodutos industrializados, conforme dados de 2014 da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO).
“O custo da degradação pode ser muito maior que o da restauração e é preciso mudar a crença de que criar reservas florestais significa perder área de produção”, alerta Miguel Calmon, especialista da área na International Union for Conservation of Nature (IUCN). Para ele, “é necessário analisar modelos e criar planos de negócio para testar o apetite dos investidores”. Uma saída é compensar passivos no formato de condomínios florestais, associados a diferentes setores produtivos e a fundos de investimento: “A estratégia envolve inteligência territorial”, sugere o consultor Arnaldo Carneiro, diretor da Agroicone.
Na busca por viabilidade, projetos acadêmicos chegam a novos resultados: “Na Mata Atlântica e Amazônia, a redução de custo atingiu 50%, em média, com uma combinação de espécies nativas e adubação verde”, revela Ricardo Rodrigues, pesquisador da Universidade de São Paulo, em Piracicaba (SP). “O desafio agora é entender o valor de todos os serviços ecossistêmicos da restauração – como o controle climático – para que sejam pagos”.
“Bancos públicos e privados começam a se interessar pela nova agenda, sinal de que o cenário poderá de fato mudar de escala”, analisa Rubens Benini, supervisor de restauração da The Nature Conservancy (TNC). Rachel Biderman, diretora do World Resources Institute (WRI) no Brasil, reforça: “Precisamos criar no país uma cultura de restauração, inclusive para fins de segurança hídrica”.
O estudo internacional “New Climate Economy”, liderado pela organização, contabilizou a existência de investimentos de US$ 50 bilhões por ano em restauração florestal, metade nos países em desenvolvimento – bem abaixo da necessidade global, estimada em US$ 200 bilhões a US$ 300 bilhões por ano. Segundo dados do WRI, o planeta já perdeu um terço da cobertura florestal e mais de 20% foi degradada. Na iniciativa The Bonn Challenge, lideranças globais estabeleceram o objetivo de recuperar 150 milhões de hectares até 2020. Os projetos apresentados até o momento cobrem 39% da meta, com geração de US$ 16 bilhões em benefícios econômicos por ano.
Por: Sergio Adeodato
Fonte: Valor Econômico
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