De Norte a Sul do Amazonas, focos de incêndio de todas as proporções estão destruindo mata e plantações, numa situação insustentável para proprietários e autoridades.

“Já entreguei nas mãos de Deus. Só ele pra salvar alguma coisa. Ainda não perdi a fé. De hoje (quinta-feira) para amanhã ele vai mandar chuva”. A declaração é do agricultor Sildomar Barros Martins, 62, que já perdeu toda plantação dele de açaí, cupuaçu e mandioca, além das árvores nativas como castanheiras e tucumãzeiros espalhadas no terreno.

Parodiando o termo “fogo amigo”, usado durante os conflitos de guerra, em que, por erro de cálculo, parceiros atingem parceiros, as matas da Amazônia estão queimando, destruindo a produção dos ruralistas e contaminando todo o Estado com fumaça tóxica.

A todo momento surgem denúncias de grandes focos de incêndio, inclusive em Manaus. Mas, é no interior, onde o Corpo de Bombeiros Militar do Amazonas não tem condições de cobrir que, literalmente, a coisa pega fogo.

Em apenas dois dias, o fogo consumiu quase toda a vegetação dos 54 hectares de Sildomar, no igarapé do Ajará, uma das muitas ramificações do Paraná do Janauacá, no Município de Manaquiri (a 110 quilômetros de Manaus).

É a segunda experiência desastrosa do agricultor Sildomar Barros. Há três anos, outro incêndio acabou com toda a vegetação. Nas duas situações ele não sabe a origem do fogo. “Não sei onde começou. Eu e meus filhos tentamos apagar o fogo com água e abafador, mas fomos vencidos e agora é só esperar pela providência divina. Lá dentro do fogo eu falei com meu Deus, ‘Pai, perdi as forças, a partir daqui deixo nas suas mãos, agora vou pra casa e esperar por sua providência’”, relatou, emocionado, o agricultor.

A esposa dele, Mari Jane, tem consciência de que a família ainda vai ter que esperar muito tempo para voltar a produzir a principal fonte de renda, que é a agricultura de sobrevivência . “Agora é plantar de novo as mudas de açaí e esperar mais cinco anos para colher. Enquanto isso, a gente vai tentar fazer outra coisa pra sobreviver. Meu marido é pedreiro e acho que vamos voltar pra Manaus”, supõe Mari Jane.

O agricultor Francisco Oliveira de Souza, 36, que teve mais sorte na proteção de sua propriedade. “Eu e um amigo conseguimos conter o fogo. Como ainda não estava grande, pegamos enxadas e fizemos valas (escavações na terra) e deu pra evitar que o fogo se alastrasse”, afirmou.

Na última quinta-feira à tarde, quando A CRITICA retornava da região do Janauacá, em frente à refinaria de Manaus, era impossível visualizar a frente da capital amazonense devido ao grande volume de fumaça.

Manoel Urbano

Na comunidade Maniquara, no quilômetro 43 da rodovia AM-070, a Manaus- Manacapuru (município a 84 quilômetros de Manaus), são fortes as cenas de animais que não conseguiram escapar do poder do fogo. Bichos preguiças e cobra foram, dentre outros, literalmente assados no próprio habitat. Relatos de moradores indicam que as labaredas do fogo chegaram a mais de quatro metros de altura.

Um problema não localizado

Na rodovia BR-174, que liga Manaus a Boa Vista (RR) o 2ª tenente reformado do Exército Ramiro Alves Marques, 73, teve dificuldades em dirigir, vindo de Boa Vista (RR) a Manaus, pelo excesso de fumaça provocada pelos inúmeros focos de incêndio. Ele foi apanhar o filho na capital roraimense e se espantou com o que viu no retorno, na última quarta-feira.

A pior situação que Marques enfrentou foi exatamente no trecho de 127 quilômetros de extensão da reserva indígena Waimiri-Atroari, a 200 quilômetros a partir de Manaus. “Lá está pegando fogo nos dois lados da rodovia. Tenho dúvidas se é acidental ou de propósito. Neste País estão acontecendo tantas coisas estranhas. Está tudo torrando, numa situação descontrolada. Vi até casa pegando fogo. Vou voltar a Boa Vista no domingo e confesso que estou com medo”, afirmou o militar.

Manoel Urbano

Segundo o Coronel da Polícia Militar, Davi Barbosa, o fogo já fez estragos também na rodovia AM-070, que liga Manaus a Manacapuru. Um dos focos está destruindo tudo próximo à comunidade Maniquara, que fica no quilômetro 43 da via. A iniciativa teria sido de pretendentes invasores de uma área. “Já foram mais de 30 hectares de floresta queimada, mil pés de açaizeiros produzindo, dois mil pés de mudas, cem pés de abacaxi, duzentos de cupuaçu e outras, tudo queimado”, relata o coronel.

Difícil

O Corpo de Bombeiros Militar do Amazonas, entidade especializada no assunto, não consegue monitorar o número de focos de incêndio que está ocorrendo em Manaus e em todo o interior do Estado.

Toda semana, a jornalista Magali Amed vai ao seu sítio, no ramal Sangaua, no quilômetro 222 km da AM-010 (Manaus-Itacoatiara). Na última viagem, ela se surpreendeu com o que viu. “É fogo em vários trechos da estrada. A maioria parece que é provocada. Os agricultores aproveitam para preparar a terra para o plantio quando chegar o inverno e não tem noção das consequências”, supõe a jornalista.

Em números

30 hectares de floresta já foram consumidos pelo fogo na rodovia AM-070 (Manaus-Manacapuru), na comunidade Maniquara, que fica no quilômetro 43 da vias. Segundo o Coronel da Polícia Militar, Davi Barbosa. Já foram queimados mil pés de açaizeiros produzindo, dois mil pés de mudas, 100 pés de abacaxi, duzentos de cupuaçu.

FONTE: Jornal A Crítica – http://acritica.uol.com.br/amazonia/Manais-Amazonas-Amazonia-Focos-incendios-Amazonas-preocupa-populacao_0_1442255767.html (disponível em: outubro 2015)