O Ministério Público Federal (MPF) devolveu ao povo indígena Yanomami, nesta segunda-feira, 21 de setembro, sangue de seus antepassados, colhido sem autorização, no fim da década de 60, por cientistas norte-americanos. A repatriação das amostras foi possível com a assinatura de acordo entre o MPF/RR e o Instituto Nacional de Câncer dos Estados Unidos, com intermediação do Ministério das Relações Exteriores, da Câmara do MPF que atua na defesa dos povos indígenas e de comunidades tradicionais e da Secretaria de Cooperação Internacional (SCI).        
As 474 amostras de sangue foram entregues pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao líder da tribo, Davi Kopenawa, em cerimônia na Procuradoria-Geral da República. No total, mais de 3 mil amostras já foram devolvidas ao povo indígena, sendo 2.693 frascos em março deste ano. Na cultura da etnia yanomami, as amostras constituem restos mortais que precisam seguir cerimônias funerárias apropriadas. Para o povo, a realização desses rituais é imprescindível tanto para a paz de espírito dos parentes dos mortos, quanto para o respeito de sua cultura.

Davi Kopenawa manifestou emoção e agradeceu a luta do Ministério Público, que ajudou a buscar o sangue, levado para os Estados Unidos “sem consulta a ninguém”. Segundo ele, agora o sangue será levado para aldeia, onde cerca de 200 pessoas esperam. “Vai ser outra choradeira. Quando Yanomami vê, se lembra e chora muito. Depois do choro, pequena festa para agradecer nosso sangue que retornou ao Brasil. Vamos fazer buraco na mãe terra, devolver sangue de onde viemos. Nascemos da terra, então temos que devolver esse sangue”, disse.

Rodrigo Janot agradeceu o trabalho conjunto de todos os envolvidos. “Gostaria de lembrar que nós temos, segundo a Constituição e a organização do Ministério Público, o dever de cuidar e proteger o patrimônio cultural e natural do nosso país; preservar e proteger as tradições e os costumes indígenas”, disse. E lembrou que isso mostra o caráter multifacetário do Ministério Público. “A vida do Ministério Público não se esgota na [Operação] Lava Jato, mas nessa enorme diversidade de atribuições que nós temos e desempenhamos com igual perspicácia e tenacidade”, disse.

A coordenadora da Câmara do MPF que atua na defesa dos povos indígenas e de comunidades tradicionais, Deborah Duprat, lembrou da relação especial que tem com o povo yanomami, pois a definição do território yanomami nos estados de Roraima e Amazonas foi sua primeira ação a favor dos povos indígenas, assim que entrou no Ministério Público. “Há mais de 15 anos, eles tinham esse  pleito de retorno do sangue: os yanomamis têm cerimônias fúnebres importantes e esse sangue era absolutamente indispensável pra fazer a passagem dos mortos”, informou.

Duprat ressaltou a contribuição do secretário de Cooperação Internacional, Vladimir Aras, para o processo. Intermediado pela SCI, o acordo possibilitou a chegada ao Brasil das amostras biológicas sem que fosse necessário acionar a Justiça. Aras acredita que, com a finalização de outros três acordos com instituições norte-americanas, todas as amostras de sangue yanomami terão sido restituídas ao Brasil. “Para os índios, a importância é cultural, está ligada à religião, à preservação da cultura e do sinteresses daquela comunidade”, afirmou.

O diretor do Departamento de Direitos Humanos do Itamaraty, Marco Túlio Scaperlli Cabral, falou da alegria ao ver concluída mais uma etapa do processo de repatriação do sangue Yanomami. “Em primeiro lugar é um compromisso com o povo Yanomami, mas, do ponto de vista diplomático, é interessante lembrar que há um compromisso internacional por meio da Declaração das Nações Unidas sobre direitos dos povos indígenas de repatriação de objetos simbólicos e restos humanos de povos indígenas que, em momentos anteriores, tenham sido idnevidamente retirados”, disse.

FONTE:  Procuradoria-Geral da República    /    Secretaria de Comunicação Social