A Secretaria de Biodiversidade e Florestas (SBF) do Ministério do Meio Ambiente (MMA) concluiu processo de remodelação dos departamentos, tornando-os mais integrados entre si. O processo foi finalizado pela atual titular do cargo, Ana Cristina Barros. Formada em Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz esperar que as “mudanças profundas” consigam externalizar as pautas positivas em andamento na Secretaria, com perspectivas de curto, médio e longo prazos.

Dona de uma experiência de 25 anos de trabalho em meio ambiente e desenvolvimento sustentável, a secretária da declarou: “É uma honra integrar a equipe de gestão do MMA, especialmente, num tempo de realizações tão significativas para o País, como a redução do desmatamento na Amazônia, a conciliação da biodiversidade com a produção agrícola e compromissos climáticos, por meio do novo Código Florestal e do Cadastro Ambiental Rural (CAR), e dos planos de conservação de espécies do patrimônio natural brasileiro”.

De sua base curricular, trouxe na bagagem, entre outras experiências, importante atuação pela redução do desmatamento e controle das queimadas na Amazônia, além de passagem marcante pela The Nature Conservancy, quando atuou como representante do Brasil e, depois, como diretora de Infraestrutura Inteligente dessa organização para América Latina. A seguir, os principais trechos da entrevista

A senhora assume o cargo com grande experiência no combate ao desmatamento e às queimadas na Amazônia, além do aspecto gerencial em políticas públicas. De que forma esse histórico influenciará no novo perfil da SBF?

Trabalho para que a SBF mostre sua própria cara, que é muito bonita e precisa aparecer. É a cara da biodiversidade brasileira e seu papel no desenvolvimento do país. A experiência que trago para ajudar nisso é diversa, vem das relações com a sociedade civil, da valorização do papel das empresas, de pragmatismo na gestão, de quem esteve fora do governo, com um olhar nacional e internacional e quer colaborar. Trago experiências da minha história na Amazônia; na agenda de conservação em outros biomas, como Cerrado e Mata Atlântica, com um viés dos recursos financeiros disponíveis para tal; da América Latina e das discussões sobre licenciamento e infraestrutura em que participei. Mais que tudo, ofereço minha motivação e espero que isso possa envolver diretores e servidores na revalorização do seu trabalho

É assim que os servidores e diretores estão enxergando a reestruturação da SBF?
Essa reestruturação não foi decisão minha. Cheguei tendo me comprometido com todos, inclusive meus superiores, na Secretaria-Executiva e no Gabinete da Ministra, de que eu não vinha para fazer grandes mudanças, nem de pessoal, nem de estrutura. Mas existia, aqui na SBF, uma indefinição sobre a forma como a Secretaria trataria das diferentes hierarquias do trabalho de conservação. E não tem receita pra isso. Existe uma forma de organizar os departamentos, identificados como patrimônio genético, espécies e ecossistemas. E seguimos essa lógica, que é a da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB); mantivemos o Departamento de Áreas Protegidas, porque, na visão de ecossistemas, já compreende uma área muito grande e tem uma agenda robusta o suficiente para ser um departamento. Ou seja, terminei de organizar um processo que já existia aqui dentro, com um benefício enorme, e, nesse processo, conseguimos ter mais clareza dos objetivos de cada um e engajá-los mais facilmente no processo de planejamento estratégico de todo o Ministério.

Como fica, agora, essa nova roupagem da SBF?

A mudança é profunda. E não é de roupagem. Temos, hoje, quatro departamentos: de Patrimônio Genético e Conhecimento Tradicional Associado; de Conservação das Espécies; de Conservação dos Ecossistemas; e de Áreas Protegidas. A reestruturação mudou, mais fundamentalmente, dois departamentos, os antigos DCBio (Departamento de Conservação da Biodiversidade) e o DMAR (Departamento de Biodiversidade Aquática, Mar e Antártica), que se organizaram, agora, em Departamento de Espécies e Departamento de Ecossistemas, respectivamente. E ambos olham para o ecossistema marinho. O novo esquema está funcionando muito bem, principalmente porque o processo e a formulação das entregas fluem rápido e bem. Agora, esperamos a consolidação dessa nova estrutura, na revisão da estrutura do Ministério, já preanunciada publicamente.

Os Departamentos de Espécies e de Ecossistemas olham para o bioma marinho. Isso não cria uma ambiguidade de tarefas?

Não, a distinção das agendas dos departamentos não é por geografias. A separação é por abordagens. Então, olho para o mar e tenho uma espécie ameaçada de extinção – e nós temos a lista de espécies ameaçadas de peixes –, e uma abordagem para conservar aquela espécie significa tratar dos seus planos de uso, incluí-la na lista de espécies ameaçadas, restringindo seu uso ou, em casos mais brandos, permitir seu uso sustentável. Essa agenda inclui um relacionamento com o Ministério da Pesca e é tocada pelo Departamento de Espécies. Uma outra abordagem complementar, e igualmente importante, em relação à área de ocorrência dessa espécie ameaçada de extinção, estabelece um critério para nossa visão de ecossistema e identificação de áreas prioritárias para conservação no mar. Numa terceira abordagem, essas áreas se tornam alvo de proteção e sejam transformadas em áreas protegidas. Ou seja, você tem aí três departamentos para resolver as questões relacionadas a uma espécie. É assim que se trabalha. Assim é a integração.

Ou seja, tem-se uma visão holística da espécie e se consegue dar uma proteção mais abrangente.

Nesse exemplo, sim. O que define cada departamento é o conjunto de políticas que eles têm em mãos. O alvo, na maioria das vezes, será comum. Isso dá unidade e integração à Secretaria, enquanto permite que cada um faça melhor o seu trabalho.

Qual é o seu maior desafio neste cargo?

É o tamanho da sua agenda. Tratamos, aqui, do veneno da jararaca aos temas ligados à Antártica. Isso tem uma envergadura muito maior do que a nossa capacidade instalada e o desafio está em reconhecer as prioridades e atacá-las, de uma forma otimizada, não esquecendo as demais ações que também são importantes, mas que devem ficar em segundo plano. Isso significa fazer escolha. O ser humano tem dificuldade em fazer escolha. Tudo é sempre muito importante. E é esse o nosso maior desafio: escolher o que é imprescindível ser feito e fazer avançar a política de conservação da biodiversidade no país, dentro das nossas capacidades e num tempo pré-determinado.

Então essa mudança na SBF, que não é só de nomenclatura, permitirá à senhora e à sua equipe trabalharem suas políticas de forma mais coesa.

Espero que sim. Espero que, com essa distinção de que políticas estão nas mãos de que departamentos e com a eleição das nossas prioridades, possamos trabalhar mais integradamente. Estamos vivendo um momento muito especial para a SBF. Temos, hoje, o deslanchar de um processo de regulamentação da lei do patrimônio genético; o avanço dos planos de ação das espécies, em curso; temos conflitos, ainda, na agenda de pesca, um desafio a enfrentar com a suspensão da INI MMA/MPA 445/2014, que trata das espécies de peixe ameaçadas de extinção… Mas temos mecanismos alternativos, que estão caminhando muito bem, e uma interlocução crescente com a comunidade acadêmica, com a sociedade civil e com outros órgãos de governo. A SBF, hoje, está aparecendo. E, voltando à pergunta inicial, a Secretaria está mostrando a sua cara, uma cara que ela já tinha. E eu estou aqui para colocar o holofote no caminho a seguir e em quem o percorre.

Haverá alguma alteração em relação às parcerias e à cooperação com organismos internacionais?

Nosso portfólio de cooperantes internacionais nos é muito caro. Ele permite que a Secretaria tenha a envergadura de ações atual devido às parcerias com a Alemanha, com o governo americano, com o Fundo Global para o Maio Ambiente (GEF), com os ingleses, para citar alguns, e que são vitais para a SBF. Nós estamos tratando, aqui no gabinete e nos demais departamentos, da estruturação de um ponto focal, de alguém que ajude os diretores e a secretária a fazer essa interlocução de maior qualidade com os nossos cooperantes. Temos tido um tratamento técnico e operacional com eles, muito eficiente, mas precisamos de uma visão estratégica, uma meta que queiramos alcançar para nortear o conjunto de projetos. A partir disso, podemos evoluir também para uma política de envolvimento dos atores, uma discussão de longo prazo, uma antecipação de possibilidades. Isso pode coroar mais o nosso relacionamento com os órgãos internacionais e é o que estamos buscando.

Que outros aspectos considera importantes destacar?

É importante destacar, na SBF, o que não muda. Temos, aqui, um corpo técnico fantástico. A cada grande tema que chega para mim e um diretor traz dois, três ou quatro membros da sua equipe para uma conversar comigo, eu aprendo sempre. É muito prazeroso. É muito bom poder contar com o interesse, a motivação e a robustez do conhecimento que temos aqui dentro. E a constância dessa equipe é a maior motivação. Uma reorganização de departamento é muito pouco em relação à força desse pessoal.

Por: Luciene de Assis – Editor: Marco Moreira

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