O protagonismo da mulher indígena é cada vez mais presente no cotidiano de luta dos povos indígenas no Brasil. Em Roraima, simbolicamente, esse protagonismo se reafirma a cada conquista de espaço nas mais variadas funções, tanto nas instâncias no âmbito do movimento indígena como em espaços no âmbito governamental.
Os povos indígenas de Roraima, em especial as mulheres indígenas podem comemorar mais uma conquista. Trata-se da conquista pela composição da Coordenação Geral do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol (CIFRSS) composta por duas jovens mulheres indígenas, Maria Alcinda Mota Constantino (Coordenadora Geral), do povo indígena Sapará e Maria Deolícia Monteiro (Vice-Coordenadora) do povo indígena Macuxi, eleitas na primeira reunião do Conselho Diretivo do ano letivo do CIFCRSS realizada nos últimos dias 28 e 29, no Centro Indígena, localizado na comunidade indígena Barro, região do Surumu, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol.
Fazendo parte da composição junto à coordenação geral, também foram eleitos os professores e ex-aluno do Centro Indígena de Formação que passam a assumir as coordenações de base, administrativa, pedagógica e técnica. O Conselho aprovou o professor Euclides Pereira (Macuxi) para assumir a coordenação administrativa, o professor Ulisses Monteiro da Silva (Macuxi) a coordenação pedagógica e o ex-aluno do Centro Indígena de Formação, Alesson Silva (Macuxi) na coordenação técnica. Edinho Batista da coordenação anterior irá assumir assessoria técnica pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) na região do Surumu.
A reunião do Conselho Diretivo, instância máxima de representatividade do Centro Indígena formada por representantes de cada região, principalmente das quatro regiões da Terra Indígena Raposa Serra do Sol – Serras, Surumu, Baixo Cotingo e Raposa, nesta ocasião apontou importantes avanços para o futuro do Centro. Para as deliberações, estiveram presentes os coordenadores das quatro regiões, a coordenação geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e os alunos indígenas do CIFCRSS, membros do Conselho Diretivo.
No primeiro dia, 28, houve uma avaliação da situação do Centro Indígena. Os estudantes e professores apresentaram as dificuldades na estrutura física, setores de projetos, corpo docente, logística e demais dificuldades enfrentadas no cotidiano do Centro.
Diante da problemática apontada o Conselho Diretivo apresentou propostas para a melhoria e funcionamento do Centro Indígena. Entre as propostas, o primeiro passo foi à alteração no Regimento Interno, abrindo novas possibilidades de organização estrutural dos representantes, principalmente no que se refere à própria composição do Conselho Diretivo. A composição da coordenação (coordenador, vice-coordenador, coordenador administrativo, pedagógico e técnica) faz parte da mudança no organograma do CIFCRSS conforme aprovada pelos membros.
Outras aprovações importantes são às contribuições ao apoio logístico (alimentação e limpeza). Os coordenadores membros definiram que as comunidades indígenas vão contribuir mensalmente com alimentação destinando produtos agrícolas, cestas básicas e contribuição bovina.
Além disso, haverá também contribuição das regiões na parte da infraestrutura, tanto elétrica quando estrutura física do Centro para construção de alojamento aos estudantes. As regiões assumiram as despesas com o serviço de mão-de-obra e materiais de construção.
O acidente fatal de carga elétrica ocorrido no mês de março no Centro Indígena que vitimou o estudante indígena Rivaldo da Silva de Sousa, 17 anos, também foi discutido pelo Conselho Diretivo. A coordenadora do Departamento Jurídico Joenia Wapichana esteve na reunião prestando orientação, além disso, o Conselho formou uma comissão para acompanhar o caso. Medidas de acordo com as decisões das lideranças indígenas devem ser tomadas junto a família do estudante.
De acordo com as expectativas de apontarem resultados positivos para a continuidade das atividades do CIFCRSS, resultados a partir das deliberações e aprovações dos membros do Conselho Diretivo, a coordenadora geral Maria Alcinda considerou a reunião como um momento de fortalecimento do Centro Indígena, principalmente o fortalecimento dos estudantes; em relação à gestão da coordenação, a coordenadora destaca que é uma oportunidade de mostrar e dar retorno aos tuxauas realizando os trabalhos de acordo com as demandas apresentadas pelas próprias lideranças. “Primeiramente, a reunião foi um momento de fortalecimento do Centro Indígena, principalmente dos jovens estudantes, e assumir a coordenação além de ser uma experiência muito boa, também é uma oportunidade de mostrar e dar retorno aos coordenadores, tuxauas e demais lideranças, conforme a confiança depositada em cada um de nós.”
O estudante do 3º ano, Cirilo Roberto de Sousa, do povo indígena Macuxi, da comunidade indígena Raimundão, região do Taiano, destaca que os principais motivos de escolher o Centro Indígena de Formação se devem ao valor histórico, as lutas das lideranças tradicionais e do movimento indígena de Roraima e, sobretudo, do compromisso próprio frente à formação. “Para mim, o mais importante apesar das dificuldades que passamos no Centro são as lutas das nossas lideranças tradicionais, a luta do movimento indígena de Roraima, o valor histórico de resistência e conquista que o Centro representa para nós, além do nosso próprio compromisso junto às lideranças da nossa região e comunidade que nos encaminham em busca de uma formação voltadas para nossas demandas.”
Cirilo reforçou que o Centro é um patrimônio cultural dos povos indígenas de Roraima e relembrou do lema que marcou fortemente a resistência da escola particular e diferenciada, CIFCRSS, quando em setembro de 2005, covardemente foi atacada, incendiada e destruída por jagunços a mando do fazendeiro Paulo Cesar Quartiero. “Queimaram nossas casas, queimaram nossas roupas, mas não destruíram nossos sonhos”.
Nessa perspectiva de sonhos dos jovens estudantes indígenas é que as lideranças indígenas também continuem a sonhar com um futuro de mais avanços e conquistas oriundas do Centro. O coordenador regional do Baixo Cotingo, Agnaldo Constantino, tendo a oportunidade de participar pela primeira vez da reunião do Conselho Diretivo, falou da contribuição que a região dará para continuar o funcionamento do Centro. “Participando pela primeira da reunião do Conselho Diretivo dessa escola, nós da região vamos nos fortalecer cada vez mais e ajudar os alunos, principalmente na parte das contribuições.”
O Conselho Indígena de Roraima (CIR), como organização proponente e base do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol (CIFCRSS) por meio do Conselho Diretivo formado pelas oito regiões, também se mostra bastante compromissada e empenhada em contribuir para a melhoria do funcionamento do Centro Indígena, seja na parte estrutural, pedagógica, técnica ou na coordenação geral, assim como na articulação e diálogo junto às comunidades indígenas.
Para o coordenador geral do CIR, Mario Nicacio, a expectativa para os próximos anos é que a organização possa contribuir cada vez mais com o Centro. “A nossa expectativa é que para os próximos anos o CIR possa contribuir mais com o Centro, pois já temos formados 77 técnicos indígenas, além de fortalecer a política de atuação sem tirar o foco e o objetivo pela criação do Centro Indígena.”
Com o lema de luta e resistência, “sabedoria, trabalho e paciência”, os jovens estudantes, professores, tuxauas, coordenadores regionais, mulheres indígenas e demais lideranças indígenas que compõe o corpo do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol seguem na caminhada por dias melhores e com foco no objetivo de formação e capacitação de jovens indígenas para que possam contribuir com suas comunidades indígenas e regiões através de uma atuação na área territorial, ambiental, agropecuária, sustentabilidade e sempre respeitando os próprios costumes e valores tradicionais, uma prática que é secular dos povos indígenas.
Na mesma ocasião da reunião do Conselho Diretivo, na noite no dia 28, um veículo do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol “pegou fogo” quando estava estacionado na garagem.
De acordo com os estudantes que realizavam a noite cultural no salão de reunião que fica próximo a garagem, o veículo tipo caminhoneta de placa NAK 6026, que estava estacionada após prestar um serviço à escola começou a pegar fogo, literalmente.
Não há indícios de motivos que levaram o incêndio, porém, suspeita-se que deve ter sido mais um incêndio criminoso, já que o Centro sempre foi alvo de ameaças e perseguições, inclusive, por ainda conviver com pessoas estranhas que circulam nas mediações do Centro Indígena e na comunidade indígena Barro.
No dia seguinte, 29, a coordenação geral do CIFCRSS prestou ocorrência na Delegacia de Pacaraima, onde aguarda os procedimentos. O veículo era de grande utilidade para as atividades diárias do Centro, principalmente atividades de campo.
FONTE: CIR
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