Doze lideranças do povo Paiter Suruí, da Terra Indígena (TI) Sete de Setembro, localizada no estado de Rondônia, afirmaram ao presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Flávio Chiarelli, em uma reunião realizada na manhã de ontem (24), que desejam que o projeto de Carbono Florestal Suruí seja suspenso. Os principais argumentos apresentados pelas lideranças foram: as graves divisões ocorridas no povo; o não cumprimento das promessas de melhoria de vida da comunidade (enquanto, por outro lado, afirma que algumas poucas famílias têm se beneficiado bastante); o afastamento de lideranças e a centralização da representatividade do povo; e as ameaças feitas a vários integrantes do povo que, atualmente, se posicionam contrários ao projeto.

Assinado com a maior empresa brasileira de cosméticos, a Natura, em setembro de 2013, este projeto previa o sequestro de 120.000 toneladas de créditos de carbono na TI Sete de Setembro, no período de 2009 a 2012, por um valor divulgado na imprensa de R$ 1,2 milhão. Por ser o primeiro projeto do mecanismo de Redução de Emissões por Degradação e Desmatamento (Redd) a ser realizado em terras indígenas com certificação internacional ganhou repercussão em todo o mundo, além de ser “vendido” pelas empresas que defendem a economia “verde” como um projeto modelo.

No entanto, desde que o atual cacique geral do povo, Henrique Iabaday Suruí, deu uma entrevista à edição de setembro do jornal Porantim sobre os severos impactos deste projeto, uma outra realidade foi desvelada. “As promessas foram muito boas: vida de maior qualidade, saúde, educação. Todo mundo contribuiu. Mas logo chegou conflito e faltou respeito. Somos todos culpados de aceitar isso, de assinar. Mas fomos enganados e estamos passando as consequências disso. Nosso povo cada vez mais sofre. Nos arrependemos. Este projeto não está dando certo para nós”, desabafou Jonaton Suruí, segundo cacique da aldeia Linha 14. Em seguida, ele afirmou que “se este projeto continuar, vão acontecer mortes, briga, cadeia. Não só entre os Suruí, mas com outros povos que também estão se envolvendo com estes projetos, como os Arara”.

Falando na língua Suruí, o ancião Joaquim, vice cacique geral, reforçou as preocupações de seus parentes Jonaton e Henrique. “Caímos na armadilha de uma proposta enganosa. Nós estamos aqui pedindo a suspensão deste projeto que a Funai também aprovou. Estamos aqui de frente com o presidente da Funai para que também assuma a responsabilidade com a gente. Não queremos mais este projeto no nosso povo”, declarou de modo enfático.

Em um documento entregue à Funai, indígenas de 10 povos de Rondônia afirmam:

“Exigimos urgentemente a suspensão e posterior cancelamento do Projeto de captura de Gás Carbono no território indígena Suruí e Cinta Larga e o impedimento de implementação de qualquer projeto que visa esse tipo de exploração em todos os territórios indígenas no estado de Rondônia e no Brasil;

Enfatizamos a responsabilidade da Funai pela implementação do Projeto Carbono no território Suruí, mesmo não havendo legislação que prevê tal iniciativa”.

Após explicar que a Funai deu parecer favorável ao projeto porque avaliou que o projeto beneficiaria a comunidade e devido à insistência de uma liderança do povo, Flávio Chiarelli, afirmou que os fatos relatados pelas lideranças Suruí presentes na reunião eram graves e que é preciso, primeiro, entender melhor o que está acontecendo. “Esta é a primeira vez que a comunidade diz que este projeto é um problema. Depois de ouvir mais vocês, podemos encaminhar para a Procuradoria para avaliar e, se for o caso, entrar com uma ação contra ele”, declarou.

A contínua luta pela terra

Após um debate sobre a necessidade de fortalecimento das coordenações regionais da Funai e do órgão como um todo, outro tema abordado durante a reunião da manhã foi a situação dos processos de demarcação de terras indígenas no estado de Rondônia e do Mato Grosso.

O diretor de Proteção Territorial da Funai, Aluísio Azanha, após fazer uma breve análise do difícil contexto político em que a Funai vem atuando, devido ao déficit de funcionários e ao contingenciamento e diminuição de recursos financeiros, para além das ofensivas contra os direitos indígenas, adiantou informações sobre alguns destes processos. Ele informou, por exemplo, que as terras indígenas Karitiana e Kaxarari enfrentam problemas judiciais e que em relação às terras Cujubim, Migueleno e Wajoro, não será possível instalar Grupos de Trabalho neste ano. Em relação à terra do povo Puruburá, em estudo, Azanha afirmou que será realizado o trabalho de campo na área reivindicada pelos indígenas ainda em 2015.

Como resposta, representantes do povo Puruburá, Antônio e Hosana, pediram agilidade da Funai em relação à demarcação desta terra e respeito ao povo. “A Funai tirou a gente da nossa terra original. Nunca tínhamos saído de lá. O sonho de nossos anciãos é ter a nossa terra demarcada, mas estão morrendo sem ver este sonho se realizar. Preciso viver escondida por conta das ameaças que sofremos”, declarou Hosana Puruburá.

As discussões sobre os processos de demarcação de terras indígenas dos povos de Rondônia foram aprofundadas na reunião à tarde. No entanto, ainda na parte da manhã, várias lideranças manifestaram suas preocupações em relação à grave, e infelizmente bastante comum, invasão dos territórios indígenas do estado por madeireiros. Uma queixa consensual dos 10 povos presentes foi em relação ao sentimento que têm de estarem abandonados pela Funai e da necessidade deste órgão se fortalecer para proporcionar o apoio que os povos indígenas precisam como, por exemplo, em relação à fiscalização e punição de quem rouba madeira.

Fonte: CIMI

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