No momento em que aumentam as pressões no Congresso contra as reivindicações indígenas por mais terras, a Fundação Nacional do Índio (Funai), cuja missão é proteger e promover os direitos dessa população, vive um processo de enfraquecimento no governo Dilma Rousseff. A presidente encerrou o primeiro mandato com a menor área de terras indígenas demarcada desde a redemocratização e começou o segundo período no Palácio do Planalto sem indicar mudança no desinteresse pelo órgão.   

Há 20 meses, a Funai está sob comando interino. Desde que a demógrafa Marta Azevedo pediu demissão, em junho de 2013, Dilma não nomeou oficialmente nenhuma pessoa para o cargo. O atual presidente interino, Flávio de Azevedo, é um procurador vinculado à Advocacia-Geral da União (AGU) que prestava serviços à área jurídica da Funai até outubro, quando assumiu o posto temporário.    

Para organizações que atuam na defesa dos indígenas, essa situação é mais uma demonstração do desinteresse de Dilma pelo órgão. A presidente é a que manteve a fundação sob comando interino pelo período mais longo desde sua criação, em 1967. Nesses 48 anos, a Funai teve 33 presidentes – média de 1 ano e 4 meses de mandato para cada um. Nos dois governos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, a instituição teve dez presidentes. Com Luiz Inácio Lula da Silva, foram três.

Na avaliação de Cleber Buzatto, secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o enfraquecimento da Funai está se agravando. “A manutenção de interinos no cargo de presidente é um dos reflexos mais visíveis desse processo”, disse. “Existem enormes pressões políticas para que não sejam aprovados relatórios de delimitação e demarcação de novas terras, uma das principais responsabilidades do presidente da Funai. Como ele pode levar adiante essa função se está interino no cargo?”

Esse enfraquecimento da Funai apontado pelo dirigente do Cimi ocorre em paralelo à maior pressão no Congresso para aprovação de uma emenda constitucional que delega ao Legislativo o poder de demarcar terras indígenas. Hoje, essa prerrogativa é exclusiva do Executivo.

No governo Dilma, essa atribuição foi pouco efetiva. A petista homologou em quatro anos a criação de 11 terras, um total de 2 milhões de hectares, mais baixa marca dos governos pós-ditadura militar. Em metade do tempo, Itamar Franco homologou 16 áreas e 5,4 milhões de hectares.

Quedas

Para Buzatto, outros indicadores de enfraquecimento são a redução do quadro de funcionários, especialmente os que atuam nas demarcações, e do orçamento. Segundo a Funai, o quadro de funcionários permanentes caiu de 2.396 em 2010 para 2.238 em 2014. O grupo dedicado à delimitação e demarcação de terras foi reduzido de 21 para 16 funcionários fixos. O número de antropólogos na equipe baseada em Brasília baixou de seis para dois.

O encolhimento também é visível no orçamento. Em 2013, a verba da Funai (a soma de custeio e investimento, em valores já corrigidas pela inflação) chegou a R$ 174 milhões. Em 2014, segundo o órgão, foram R$ 154 milhões.

Fora isso, hoje há 13 processos de demarcação parados no Ministério da Justiça, onde precisam de uma Portaria Declaratória para seguirem tramitando no governo. Outros 21 processos de demarcação já estão na mesa de Dilma, à espera da assinatura da presidente. Segundo levantamento da Assessoria Especial de Participação Especial, essas terras indígenas totalizam 1,4 milhão de hectares.

Para André Villas-Bôas, secretário executivo do Instituto Socioambiental (ISA), o esvaziamento da Funai começou no governo Lula e se agravou com Dilma. “Diante de obras como as hidrelétricas que estão sendo construídas e que afetam populações indígenas, o óbvio teria sido o fortalecimento de instituições que cuidam dessas populações. O que se vê é o oposto, com licenciamentos a toque de caixa e desenvolvimento a qualquer preço.”

Por: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo

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