Com pouco mais de 11 mil habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Município de Pacaraima, localizado ao Norte do Estado, na fronteira com a Venezuela, vive um clima de incerteza. Atualmente, pelo menos 50 processos tramitam na Justiça Federal pedindo a desocupação de pessoas que moram naquela localidade, já que o município fica dentro da Terra Indígena São Marcos.
Por conta disso, a Justiça Federal em Roraima organizou uma audiência pública para conhecer a realidade das partes do processo, sejam eles índios ou não índios. As ações foram movidas pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e pelo Ministério Público Federal (MPF). “São processos de 2002 e 2003 que estão parados ou suspensos porque existia a dúvida de se eles tocavam ou não no mesmo assunto da Ação Civil Originária (ACO) 499, que tramita no Supremo Tribunal Federal, que discute o município como um todo”, explicou a juíza titular da 2ª Vara da Seção Judiciária de Roraima, Clara Mota.
Aos poucos, segundo a juíza, o MPF pediu que os processos voltassem a tramitar e os tribunais entenderam que não havia conflito com a ação que tramita no STF. “Então, resolvemos levar a Justiça Federal para essa localidade para saber se ainda existe esse conflito, saber se os indígenas realmente querem que essas 50 famílias sejam retiradas de lá e sentir qual a atual situação do processo. Afinal, já se passou muito tempo. Vamos tentar uma posição conciliatória para realmente verificar se ainda existe a necessidade de que esses 50 processos tramitem, se ainda existe conflito em relação à permanência dessas pessoas na região”, explicou Clara Mota.
A ideia de realizar a audiência pública surgiu da Justiça Federal com objetivo de dar um tratamento igual aos 50 processos. “Identifiquei que já havia passado muito tempo do início deles, que não estávamos mais conseguindo localizar as partes dos processos e que uma hora íamos precisar ir ao local para saber a realidade. Há ação que o réu foi encontrado para ser citado, outra, não; há ação que citou e foi suspensa. São vários processos que acabaram caminhando cada um do seu jeito. Essa é uma oportunidade de unificar esses andamentos processuais”, afirmou.
Outro objetivo é verificar desde quando os moradores estão lá, se antes ou depois da criação do município. “Mas, em princípio, a terra indígena precede à ocupação dessas pessoas e à própria criação do município. Acaba sendo interessante ver qual é a opinião tanto dos habitantes quanto a dos indígenas para a gente conseguir uma composição, uma conciliação”, disse.
DESOCUPAÇÃO – Em entrevista à Folha, o vice-governador Paulo César Quartiero (DEM), que foi prefeito de Pacaraima por quase três anos, afirmou que esta é uma tentativa de organizações não governamentais em desocupar o município. “Estão querendo passar a perna, estão querendo ganhar na marra”, disse o vice-governador, que confirmou presença na audiência. Para ele, o prejuízo de uma possível desocupação é “acabar” com o município e com a única interligação entre o Brasil e a Venezuela.
Quanto à desocupação, a juíza Clara Mota tranquilizou todos: “Isso não vai acontecer! Essa decisão de desocupar o município só poderia ser tomada pelo STF, porque não é competência dessa Vara discutir a legalidade ou não de todo o município. O que vamos discutir são esses 50 processos, se os indígenas ainda têm o interesse em dar andamento. Esse alarde é falso”, frisou.
“A audiência é uma oportunidade de debate para a Justiça conhecer a realidade que eles estão vivendo. A audiência não implica na desocupação imediata de ninguém, não tem nada a ver com isso. A ação do STF continua tramitando e o que temos aqui são 50 processos específicos que a justiça, de um modo ou de outro, tem a obrigação de levar até o final”, reforçou.
Após pedido de moradores, audiência vai ser realizada em quadra coberta
Marcada para as 9h da próxima quinta-feira, 05, a audiência pública seria realizada na Câmara Municipal de Pacaraima. Por conta da quantidade de interessados em participar do debate, a Justiça Federal decidiu pela mudança do local. Moradores já haviam pedido que o evento fosse realizado em um local onde a população pudesse participar.
A audiência será no ginásio do município, próximo à sede do Legislativo municipal. “Por envolver toda a comunidade, haverá um comparecimento maior por parte da população”, afirmou a juíza Clara Mota.
Aberta à população, a audiência pública terá a participação de representantes do Ministério Público Federal, da Fundação Nacional do Índio, da União, da Prefeitura de Pacaraima, lideranças indígenas e das 50 pessoas que compõem os processos. “Todas as partes serão ouvidas durante a audiência, que deve terminar no final da tarde”, explicou.
A juíza destacou que a audiência pública tem uma pauta específica, que são os 50 processos e uma tentativa de conciliação e de respeito mútuo entre os envolvidos. “A gente não vai lá para fazer uma discussão de todos os problemas da cidade, do lixão ou para desocupar o município inteiro. Nossa pauta é específica e ela vai ter que se desenrolar ao longo desse dia”, esclareceu.
POR: VANESSA VIEIRA / Jornal Folha de Boa Vista
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