Um dos temas menos comentados durante as eleições e que ficou fora do discurso da re-eleição da Presidente Dilma Rousseff, foram os direitos indígenas e também o meio ambiente. Em um momento em que as mudanças do clima estão cada vez mais frequentes, a temática ambiental e as políticas públicas para a proteção e gestão das Terras Indígenas precisavam ser tratadas com maior atenção.
Uma carta divulgada pelo IPAM no dia 22 de outubro, mostra que a Amazônia precisa ser preservada, pois desempenha um papel fundamental na estabilização das concentrações dos gases de efeito estufa e na minimização dos efeitos das mudanças climáticas globais. “Para que o Brasil alcance a extinção do desmatamento na Amazônia brasileira e usufrua dos serviços ambientais prestados por suas florestas será crucial a manutenção de grandes extensões contínuas de florestas. O elemento essencial para que isto aconteça são as áreas protegidas, em especial as Terras Indígenas e suas populações”, aponta a carta “A Amazônia Indígena e as Mudanças Climáticas: recomendações aos Presidenciáveis”, elaborada pelo IPAM.
Apesar de existir uma legislação vigente no país que trata dos direitos dos povos indígenas, existe ainda um grande abismo entre a teoria e a prática. O processo de demarcação, regulamentado pelo Decreto nº 1775/96, é o meio administrativo para identificar e sinalizar os limites do território tradicionalmente ocupado pelos povos indígenas, porém a crescente resistência dos proprietários rurais vem sendo uma das principais razões na diminuição do ritmo de regularização, determinada pelo Art. 225 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Existem hoje no Brasil quase 900 mil índios e mais de 690 Terras Indígenas. As lideranças indígenas reivindicam o reconhecimento de cerca de 1000 áreas. De acordo com um levantamento feito pela Folha de São Paulo, no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) foram homologadas 145 áreas (41 milhões de hectares), o governo Lula (2003-2010) retrocedeu para 84 áreas (18 milhões de hectares). e por fim, a presidente Dilma Rousseff homologou apenas 10 áreas (966 mil hectares), sendo o governo que menos demarcou terras indígenas desde a redemocratização do país.
Outro ponto polêmico na temática é a PEC 215/00, em tramitação na Câmara dos Deputados, que diminui o poder da a Fundação Nacional do Índio (Funai) sobre as demarcações e torna a homologação das Terras Indígenas dependente da aprovação do Congresso. Para o deputado Padre João (PT-MG), um dos principais defensores da causa indígena na Câmara, a PEC 215 significa um retrocesso. “A gente percebe a organização de uma bancada, formando uma maioria, indo a voto e que se torna, de fato, uma ameaça a um direito constitucional sagrado, reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal”, afirmou.
Em diversos casos, a justiça precisa interferir e estipular um prazo para a finalização do processo de demarcação, que podem ultrapassar 10 anos. É o caso da Terra Indígena Sawré Muybu. No dia 29 de outubro a Justiça Federal estipulou o prazo de 15 dias para que Funai dê sequência ao processo de demarcação da TI, que fica na região de Itaituba, oeste do Pará. O processo que já ocorre há 13 anos, foi paralisado sem explicações no ano passado. A Terra Indígena está localizada em uma região onde o governo pretende construir a Usina Hidrelétrica de São Luiz do Tapajós. Com a construção da usina, aldeias, florestas e cemitérios da terra indígena serão alagados.
Para demonstrar a importância dos Territórios Indígenas, tanto para os povos que nela habitam quanto para a preservação dos recursos naturais, foi lançado no dia 30 de outubro o relatório “Violações de direitos humanos dos indígenas no Estado do Mato Grosso do Sul”, resultado de uma missão realizada em agosto de 2013 pela Relatoria do Direito Humano à Terra, Território e Alimentação.
O documento destaca a complexidade das violações aos direitos dos povos indígenas Guarani e Kaiowá, como a negação do seu território, a exclusão social (da qual resulta todo o processo de confinamento) e até a negação dos direitos básicos à realização da vida com dignidade (alimentação adequada, ao acesso à educação intercultural, à saúde que considere a medicina tradicional, entre outros).
Porque demarcar?
De acordo com a carta do IPAM, as taxas de derrubada de florestas no interior das Terras Indígenas são inferiores a 2% (1999-2008), um valor bem abaixo das regiões ao redor destas terras (de 25 a 30%) e menor do que o encontrado para Unidades de Conservação sem gente dentro. Isso mostra a importância da demarcação das terras indígenas para a redução do desmatamento da Amazônia.
“Ao manter florestas intactas dentro dos territórios indígenas, nós estaremos reduzindo os prejuízos globais que a população mundial terá no futuro com a mudança do clima”, enfatiza o Diretor-executivo do IPAM, Paulo Moutinho.
A demarcação das Terras Indígenas favorece a sociedade mundial, já que preservação dessas regiões contribui para a proteção do meio ambiente e da biodiversidade, bem como para o controle climático global. Esta medida é urgente para a população brasileira, uma vez que o país está sofrendo os impactos causados pelo demantamento e pelo desenvolvimento econômico insustentável. A garantia e a efetivação dos direitos territoriais dos povos indígenas, tanto no Pará como no Mato Grosso, contribuem, para a construção de uma sociedade que valoriza a identidade étnica e cultural dos seus povos.
Marcela Bandeira | IPAM
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