A situação crítica do abastecimento hidrelétrico e a queda progressiva da fatia dessas usinas na matriz de energia fizeram o governo tirar da gaveta um plano polêmico, congelado há anos: a construção de hidrelétricas com grandes reservatórios d’água. Discretamente, esse modelo de usina, praticamente banido do planejamento do setor há uma década, tem sido retomado pelo governo.

Levantamento feito pelo Estado indica que pelo menos três empreendimentos – dois em construção e um na fase de estudos – estão projetados para operar com os chamados “reservatórios de regularização plurianual”. São eles as usinas de Sinop, de 400 megawatts (MW), em construção em Mato Grosso; São Roque (135 MW), que será erguida em Santa Catarina; e Arraias (93 MW), prevista para Tocantins.

Cada uma dessas usinas será alimentada por barragens que permitam um acúmulo maior de água. Apesar de não serem megausinas em termos de geração, elas terão condições de garantir a oferta regular de energia por todo o ano, inclusive nos períodos de seca, por causa do volume que poderão acumular durante a época das chuvas. Como serão instaladas próximas da cabeceira de seus rios, permitirão que outras hidrelétricas previstas para ser construídas rio abaixo também se beneficiem do mesmo recurso.

O problema é a fatura ambiental que essa escolha impõe, dada a grande área alagada necessária para os projetos. Na tentativa de contornar as críticas pelo impacto ao meio ambiente, o governo decidiu apostar em usinas de médio porte, mas com condições técnicas de garantir o resultado esperado.

“Vamos fazer tudo o que for possível, erguendo essas usinas onde tivermos condições técnicas e ambientais para isso”, diz o secretário de Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia, Altino Ventura Filho. “Há outras possibilidades em rios no Norte do País. Estamos estudando esses projetos.”

Inundação

O impacto causado por um empreendimento com reservatório de acumulação, como será feito na hidrelétrica de Sinop, fica mais visível quando comparado ao de outras usinas baseadas no modelo de fio d’água, como Belo Monte, no Rio Xingu, por exemplo. Nesse caso, a hidrelétrica opera com um reservatório menor e não tem acumulação de água. Ou seja, todo o volume que chega à barragem passa diretamente pelas turbinas, sem possibilidade de armazenamento.

Sinop, que terá potência máxima de 400 MW, será dona de um reservatório de 337 km² no Rio Teles Pires, o que significa inundar uma área equivalente a todo o município de Belo Horizonte. No Xingu, Belo Monte vai deixar embaixo d’água uma área um pouco maior, de 503 km². Mas sua potência chegará a 11.233 MW – ou seja, 28 vezes a capacidade instalada de Sinop.

Apesar da grande potência de geração, usinas como Belo Monte são prejudicadas na época de seca, justamente por não ter meios de guardar água. Por essa limitação, Belo Monte terá de ficar praticamente desligada cerca de quatro meses, todos os anos, em razão do baixo volume de água que terá à disposição para acionar suas turbinas mais potentes, instaladas na casa de força principal da hidrelétrica.

Térmicas. A retomada de empreendimentos com grandes reservatórios atende a um desejo da presidente Dilma Rousseff, que no ano passado aproveitou o Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas para defender a construção desse tipo de usinas.

“Temos de enfrentar o fato de que, se nós continuarmos a fazer hidrelétricas a fio d’água, se nós continuarmos a ter essa arquitetura de hidrelétricas, teremos aumento das térmicas”, disse Dilma na época.

A dificuldade do governo em implantar usinas com barragens de regularização está refletida no Plano Decenal de Energia (PDE), relatório da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) que apresenta as prioridades de expansão do sistema elétrico brasileiro para os próximos dez anos. O planejamento aponta que, até 2023, a capacidade instalada das hidrelétricas vai subir 36% em relação à potência atual, que chegou a 87,6 mil MW no mês passado.

Por outro lado, o aumento da capacidade de armazenamento dos reservatórios neste mesmo período será de apenas 2% em relação à atual. Como o PDE é reavaliado uma vez por ano, é grande a possibilidade dessa capacidade de armazenamento aumentar.

O sistema elétrico brasileiro tem hoje capacidade total de 130,8 mil MW de energia, dos quais 67% têm origem hidrelétrica, 30,1% são providos por térmicas e 2,9% por eólicas.

Por: André Borges
Fonte: O Estado de São Paulo 

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