Em 1988, quando o ambientalista britânico Norman Myers descreveu pela primeira vez o conceito de um “hotspot de biodiversidade” – uma área com pelo menos 0,5% ou 1,5 mil plantas endêmicas que perdeu 70% de sua vegetação primária – ele poderia estar pintando um retrato da altamente ameaçada Cordilheira dos Andes Peruanos. Atualmente, os Andes são um presságio do destino iminente da floresta amazônica peruana.

Neste ano, o Peru marcou 45,05 no Índice de Desempenho Ambiental (EPI), ficando em 110º do mundo. O EPI é um sistema de medição que analisa o desempenho de um país em relação a questões ambientais prioritárias, principalmente a proteção da saúde humana devido a danos ambientais e a proteção dos próprios ecossistemas.

Com aproximadamente 30 milhões de pessoas espalhadas em 1,3 milhão de quilômetros quadrados, o Peru teve alta pontuação (70,36, ou 68º no mundo) na questão específica de biodiversidade e habitat, cerca de 14% a mais do que a média dos países na América Latina e no Caribe. Recentes avaliações de desmatamento, contudo, indicam que a biodiversidade continua ameaçada por uma ampla gama de fatores.

O Global Forest Watch, um sistema online de monitoramento florestal criado através de uma parceria com o Instituto de Recursos Mundiais (World Resources Institute), estima que 58% de toda a terra no Peru tem mais de 75% de cobertura florestal, e 61% do país tem pelo menos 10% de cobertura florestal, o que se resumia em 76,8 milhões de hectares de cobertura florestal em 2012. Dessa floresta, 89% é floresta primária, fazendo do Peru o nono país mais florestado do mundo.

Novos mapas ecossistêmicos do Peru que combinam dados de satélite com o sistema de laser avançado do Instituto Carnegie para a Ciência revelam que a vegetação armazena 6,9 bilhões de toneladas métricas de biomassa sobre o solo, com florestas de terra firme armazenando duas vezes mais carbono do que planícies de inundação.

Entre 2001-2012, entretanto, o Peru perdeu mais de 241 mil hectares de floresta. Perturbadoramente, a maioria da perda florestal estava concentrada em áreas que tinham mais de 75% de cobertura florestal. Isso significa que as terras mais florestadas no Peru, com maiores valores de biodiversidade e riqueza de espécies, também são as áreas que enfrentam as maiores ameaças de desmatamento.

Esses dados refletem uma pressão cada vez maior sobre as florestas no mundo todo. De 2000 a 2012, segundo o EPI, um total de 2,3 milhões de quilômetros quadrados de cobertura florestal foi perdido globalmente devido à agricultura em pequena escala (40%), pasto para gado (25%), agricultura em grande escala (20%), operações de exploração florestal (10%), e outras causas (5%).

O desmatamento também gera 4% a 14% das emissões de dióxido de carbono do mundo a cada ano. Comparada com a extensão da cobertura florestal em 2000, no entanto, a perda florestal do Peru nos 12 anos subsequentes ocupa apenas o 115º lugar no mundo.

Ameaças que as árvores enfrentam

Apesar da abrangente reforma florestal em 2000, quando um sistema de concessão florestal foi adotado, até 90% da madeira extraída das florestas no Peru provavelmente é retirada ilegalmente. Isso é explicado por uma burocracia complexa por trás do consentimento de permissões e concessões, aliada a um sistema hierárquico de ‘habilitação’ ou permissão.

Um estudo recente na seção de relatórios científicos do periódico Nature, conduzido por Matt Finer e seus colegas da Associação de Conservação da Amazônia, examinou os resultados do monitoramento da concessão de extração de madeira pelo OSINFOR, um grupo apontado pelo governo que analisou 64% de todas as concessões ativas.

Finer reporta que, a partir de 2013, 43,5% das 609 concessões de extração de madeira foram ou canceladas ou estavam sob investigação por grandes violações, e apenas 20% foram declaradas em condições regulares. Um problema surpreendentemente comum descoberto pelo OSINFOR foi o uso de permissões para a extração de madeira em áreas fora da concessão, indicando que a reforma florestal continua a não ter sucesso no Peru.

“Essas descobertas nos levam a concluir que os documentos regulatórios criados para promover a extração sustentável de madeira estão, ao invés disso, permitindo a extração ilegal”, declaram Finer e seus colegas em um relatório publicado neste ano.

O Peru também não escapou do óleo de palma. Um estudo em 2011 de Victor Gutierrez-Velez, da Universidade de Colúmbia, usou dados de satélite e de campo para examinar plantações de alto e baixo rendimento no distrito peruano de Ucayali, e descobriu que 72% de todas as novas plantações se expandiram para áreas florestadas na década de 2000.

Embora plantações de baixo rendimento, administradas por pequenos agricultores, tenham se expandido mais (80% do total), 75% das ampliações de plantações de alto rendimento envolveram conversões de florestas. Para um interessado, era mais simples obter permissões para grandes extensões de terra pertencentes ao Estado do que negociar as complexidades de obter uma terra desmatada pertencente a várias pessoas.

Um dos usos mais desenfreados e alarmantes da floresta tropical amazônica peruana atualmente é para a concessão de mineração. Apenas em 2008, o governo peruano deveria arrendar 64 blocos petrolíferos, que cobriam 72% da Amazônia peruana (490 mil quilômetros quadrados).

Apenas 12% da Amazônia peruana é protegida, e essa parte não se sobrepõe a blocos petrolíferos. Mas possivelmente, a pior ameaça para a floresta é indireta: a instalação de estradas conectando áreas anteriormente inacessíveis.

Segundo Finer, em um estudo sobre blocos petrolíferos publicado no periódico de acesso aberto PloS One, “novas estradas de acesso causam impactos diretos consideráveis – tais como fragmentação de habitat – e muitas vezes estimulam impactos indiretos ainda maiores, como a colonização, extração de madeira ilegal e caça insustentável”.

Essas estradas e rios desprotegidos têm dado origem a uma crescente indústria de mineração de ouro, que traz consigo uma destruição incalculável da Amazônia peruana. Na última década, as taxas de desmatamento aumentaram rapidamente, e a mineração de ouro cresceu 400% ao longo do rio Madre de Dios, no Peru.

Esses fatores – extração de madeira, mineração e conversão florestal – têm prejudicado severamente as florestas tropicais no Peru, mas não passam despercebidos. Os departamentos governamentais de florestas, agricultura e proteção da vida selvagem ainda se esforçam para proteger seus extensos recursos naturais.

Na verdade, apesar desses níveis de desmatamento, a pontuação de biodiversidade do Peru atribuída pelo EPI aumentou mais de 15 pontos desde 2002, quando o Peru se classificou em apenas 90º do mundo, indicando um progresso em comparação com outros países.

Possíveis soluções para o desmatamento incluem a extração de produtos florestais não madeireiros, a reforma da lei florestal para incluir a complexa estratificação social na indústria da madeira e uma ênfase crescente sobre o ecoturismo e concessões de conservação, que têm mostrado ser muito eficientes em deter o desmatamento.

Por: Mrinalini Erkenswick Watsa
Fonte: Mongabay
Tradução: Carbono Brasil 

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