Mulheres e crianças indígenas, da etnia Yanomami, oriundos da Venezuela, voltaram a pedir esmola aos condutores de veículos e pedestres em semáforo no cruzamento das avenidas Ataíde Teive e Imigrantes, no bairro Caimbé, zona Oeste. A situação já foi relatada pela Folha no mês de maio, quando a Fundação Nacional do Índio (Funai), Conselho Tutelar e Polícia Federal afirmaram que os indígenas retornariam ao seu país de origem. 

Conforme os comerciantes da Feira do Passarão, localizada em uma das esquinas do cruzamento entre as avenidas, os indígenas estão no local há cerca de um mês. Um vendedor de uma loja de artigos para celular relata que as índias colocam crianças com cerca de 5 anos para pedir esmola. “Elas são submetidas a um trabalho escravo, pois não comem, não estudam e não brincam, como as demais crianças na mesma idade. Ficam aqui, enfrentando sol, chuva, fome e pedindo dinheiro a quem passa”, disse.

O vendedor ressaltou que as crianças pedem esmola no local sem problema algum, apesar de a poucos metros, no Terminal João Firmino Neto, mais conhecido como Terminal do Caimbé, funcionar uma unidade do Conselho Tutelar, órgão encarregado de garantir o cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. “Com certeza este semáforo é caminho de algum conselheiro tutelar que trabalha no terminal, mas eles preferem ficar acomodados em suas salas do que resolver este problema”, criticou.

O artigo 403 da Lei 10.097, de 19 de dezembro de 2000, proíbe qualquer trabalho a menores de 16 anos de idade, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos. O artigo 7 ainda diz que a criança e o adolescente têm direito à proteção, à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam “o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”.

Foto: Raynere Ferreira

Famílias de indígenas com crianças estão acampadas em um terreno baldio

A Folha foi até a unidade do Conselho Tutelar no Terminal do Caimbé, mas estava fechada devido ao feriado municipal de ontem em comemoração ao aniversário de Boa Vista.

GRUPOS – Uma feirante relatou que os indígenas andam em grupos e que revezam as atividades, enquanto um descansa outro pede esmola. As mulheres e crianças vão para o semáforo pedir esmola e os homens ficam nas proximidades do Terminal do Caimbé. “Os homens são espertos, usam os mais fracos para realizar o serviço, pois as pessoas quando veem uma mãe com uma criança pedindo dinheiro na rua logo se compadecem”, disse.

Segundo a feirante, quando as mulheres juntam uma quantia boa em dinheiro, elas entregam para os homens e retornam ao semáforo para pedir mais. “Eles já são acostumados a fazer isso, as pessoas devem se conscientizar e pararem de dar esmolas para esses indígenas”, disse.

Apesar de serem retirados do local, eles sempre retornam. “As autoridades já tiraram eles daqui uma vez, mas eles retornaram. Eles chegam em um ônibus, que os deixa aqui e vai embora. Se alguém não reclamar, a Feira do Passarão e o Terminal do Caimbé serão a residência fixa deles”, disse a feirante.

Durante o dia, os indígenas descansam nas proximidades do terminal. Uma senhora, dona de uma residência na localidade, cedeu a garagem de sua casa para os indígenas descansarem. “Eles chegaram hoje [ontem] de manhã pedindo para ficarem no meu terreno. Como não tem muro, é mais fácil para eles entrarem e saírem”, disse.

A dona de casa afirmou que assume um risco ao abrigar os indígenas em sua propriedade. “Não os conheço, não sei do que eles são capazes de fazer, mas não gosto de ver pessoas desabrigadas e passando fome. O mínimo que pude fazer foi ceder a minha garagem para eles”, disse.

Um dos indígenas, que preferiu não se identificar, afirma que chegou a Boa Vista na segunda-feira, dia 7, em um ônibus que trouxe cerca de 20 índios de uma cidade próxima de Santa Elena de Uairén, cidade na fronteira com a Venezuela, Norte do Estado. “Nós viemos para o Brasil, pois não há emprego em nosso país, passamos fome lá. Aqui pelo menos podemos comer com o dinheiro que conseguimos pedindo esmola”, disse.

FUNAI – O coordenador da Frente de Proteção Etno Ambiental Yanomami Yekuana da Funai, João Catalão, afirmou que, devido aos indígenas serem de origem venezuelana, a responsabilidade é da Polícia Federal.

POLÍCIA FEDERAL – A Folha entrou em contato com a assessoria de comunicação da Polícia Federal, mas não houve retorno.

ISAQUE SANTIAGO
Colaborador da Folha

FONTE :  FOLHA DE BOA VISTA  www.folhabv.com.br