Instalada no fim de 2013, a Comissão Especial que vai analisar a proposta (PEC 215/00) que transfere para os parlamentares o poder de decidir sobre a demarcação de áreas indígenas, de quilombolas e reservas ambientais deve estabelecer já em fevereiro seu cronograma de trabalho.   

De acordo com o deputado Celso Maldaner (PMDB-SC), devem ser realizadas audiências públicas em quase todos os estados da Federação. Ele afirmou que quase todos têm problemas de conflitos de terra entre fazendeiros e indígenas. Segundo o parlamentar, apenas seis estados não têm esse tipo de problema.

Maldaner acredita que a situação atual, em que o Poder Executivo determina sozinho quais são as áreas indígenas, causa insegurança jurídica, não atende o que querem os índios e desconsidera a situação de milhares de produtores rurais que ocupam suas áreas de boa fé. “Fizemos uma pesquisa e apenas 1% dos índios querem mais terra. 99% dos índios hoje querem educação, querem saúde, querem ter uma melhor qualidade de vida. Os agricultores familiares, eles compraram de boa-fé 80, 90 anos atrás. Estão cumprindo com a finalidade social, produzindo alimentos. Se nós temos uma dívida com a nação indígena, a Nação tem que pagar, mas não à custa do pequeno agricultor rural.”

Para o deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), o Poder Executivo age de modo arbitrário, sem transparência. Ele afirma que não é razoável a demarcação se apoiar unicamente no laudo antropológico elaborado pelos técnicos para determinar se a área é ou não historicamente de uma tribo. “Não pode ter um documento, um laudo antropológico que seja feita unilateralmente e esse documento substituir a escritura pública e o registro. Cada documento que mexe no direito pétreo da propriedade precisa ser construído à luz dos olhos de todos os interessados.”

Posição do governo
O governo federal é contra a mudança e o Ministério da Justiça já se comprometeu a enviar para o Congresso no início do ano uma proposta que permita mais participação da sociedade no processo de demarcação.

Para o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), a proposta é duplamente inconstitucional. Ele acredita que ela fere direitos e garantias fundamentais dos povos indígenas porque iria praticamente inviabilizar novas demarcações de áreas indígenas, quilombolas e ambientais.

Revisão das demarcações
Ele também afirma que é uma tentativa de tirar uma atribuição do Poder Executivo, prejudicando o equilíbrio entre os poderes. Molon assinala que até hoje o País tem violado os direitos de seus primeiros habitantes e que isso não pode continuar. “Hoje nós temos o desafio de resgatar, de saldar essa dívida e não de torná-la ainda maior, dificultando a demarcação de suas terras e, ainda mais, correndo o risco de rever demarcações como alguns dos que defendem a PEC 215 no fundo querem: desfazer demarcações já feitas pelo Poder Executivo.”

O deputado Dr. Rosinha (PT-PR) chama a proposta de criminosa porque ameaça direitos adquiridos ao ameaçar rever o que já foi homologado. Na opinião do parlamentar, a proposta ampliaria os conflitos no campo por considerar que hoje não há um equilíbrio de forças dentro do Congresso, que teria uma maioria de representantes dos proprietários rurais. “É chamar para dentro do Congresso Nacional todo conflito agrário do Brasil. Se toda questão de terra passar a ser decidida no Congresso, o conflito será longo. Aqui nada será decidido porque a correlação de forças será muito difícil chegar a uma conclusão; pela própria correlação política de forças dentro do Congresso Nacional.”

No ano passado, um grupo de parlamentares pediu ao Supremo Tribunal Federal a suspensão da tramitação da proposta com o argumento de que ela seria inconstitucional, mas o pedido foi negado pelo ministro Luiz Roberto Barroso, que considerou precipitado interferir no funcionamento de uma comissão do Congresso.