Lideranças de comunidades que integram a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) protocolaram hoje (25), na Advocacia-Geral da União (AGU), um pedido para que a Portaria 303, da própria AGU, seja imediatamente revogada. A entidade, que reúne organizações indígenas de todo o país para lutar pela promoção e defesa dos direitos indígenas, também defende a exoneração do advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, que, para eles, atende aos interesses de ruralistas.
“A publicação da portaria [em 2012] alimentou e agravou o clima de tensão e de insegurança jurídica nos territórios indígenas. Sua publicação empoderou o setor ruralista, que reforçou os ataques aos interesses indígenas”, disse à Agência Brasil o assessor técnico da Apib, Paulino Montejo, antes de seguir para o Ministério da Justiça com o grupo de representantes de sete etnias. Os índios também planejam ir ao Palácio do Planalto para apresentar suas reivindicações.
Publicada em julho de 2012, a Portaria 303 da AGU estabelece que advogados e promotores de Justiça devem observar o cumprimento das mesmas condições impostas à Terra Indígena Raposa Serra do Sol em qualquer processo demarcatório, inclusive nos já finalizados. A assessoria de imprensa do órgão informou que deve divulgar ainda hoje uma nota sobre o assunto.
Quando da publicação da Portaria 303, a AGU entendeu que as 19 condicionantes impostas pelo STF para manter a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol em área contínua, em 2009, seriam extensivas aos demais processos de demarcação de terras indígenas, inclusive aos já finalizados. Essas condicionantes proíbem a ampliação das reservas já homologadas e estabelecem que o “relevante interesse público da União” no uso de riquezas minerais se sobrepõe ao direito das comunidades indígenas ao usufruto da terra. Uma das condicionantes fixa que o usufruto indígena da terra não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, nem a pesquisa, lavra e garimpagem de riquezas minerais.
A portaria causou protestos de índios e de organizações indigenistas. No ano passado, índios chegaram a ocupar o plenário do Congresso Nacional em protesto contra a Portaria 303 e outras medidas que consideram contrárias aos seus interesses. A pedido da Fundação Nacional do Índio (Funai), em setembro de 2012, a AGU suspendeu os efeitos da portaria até que o STF decidisse sobre o assunto.
Na última quarta-feira (23), a maioria dos ministros do STF decidiu que as regras valem apenas para a Raposa Serra do Sol, não podendo ser automaticamente aplicadas a outros processos demarcatórios. A secretária-geral de Contencioso da AGU, Grace Maria Mendonça, declarou que o Poder Executivo analisaria a eventual reedição da Portaria 303.
“Entendemos que a decisão do STF é suficiente para anular a Portaria 303. Só que, logo após a decisão da Corte, o próprio ministro Adams declarou a intenção de publicar uma nova portaria, semelhante, ou simplesmente reeditar a 303. Qualquer atitude nessa direção é uma afronta à decisão do STF e aos povos indígenas. Seria uma decisão política que demonstraria que o ministro tem compromissos com os representantes do agronegócio”, comentou Montejo.
Para Márcio Kokoj, liderança do povo Kaingang, após a decisão do STF dessa quarta-feira, a simples menção à possibilidade de a AGU reeditar a Portaria 303 é uma “afronta aos povos indígenas”.
“O STF conseguiu resolver em parte o problema. A questão agora é do Poder Executivo. E a AGU, na figura do ministro Adams, está prejudicando os posicionamentos indígenas, dificultando também o andamento dos processos de demarcação de terras indígenas”, frisou Kokoj.
Na AGU, o grupo indígena se reuniu com o subprocurador-geral federal, Antonio Roberto Basso. Ele reiterou que a AGU vai aguardar a publicação do acórdão do julgamento dessa quarta-feira, “para estudar a implementação da Portaria 303”, conforme já informado em nota divulgada ontem (24), pela AGU.
Na nota, a AGU destaca que aguarda que o Ministério da Justiça defina novos critérios para a demarcação de terras indígenas como forma de garantir maior segurança jurídica aos processos demarcatórios. Hoje, a assessoria de imprensa da AGU informou à Agência Brasil que as colocações que tem a fazer sobre o assunto já estão na nota.
FONTE : Agência Brasil
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