Os Awá-Guajá são um povo de língua tupi-guarani presente em três terras indígenas no estado do Maranhão – TI Caru, TI Awá e TI Alto Turiaçu -, com uma população considerada de recente contato de mais de 400 pessoas, além de outros grupos que vivem isolados.
Desde meados do século XIX, ocupam a região próxima aos vales dos rios Turiaçu, Capim, Pindaré e Gurupi, nos estados do Pará e do Maranhão. No início do século XX, por conta da pressão colonizadora, eles se movimentaram em direção aos rios Turiaçu, médio Gurupi e alto Caru, no estado do Maranhão, espaço de seus inimigos tradicionais Kaa’por e Tenetehara (Guajajara e Tembé). Na tentativa de consolidação de seus territórios, e tendo características belicosas, esses inimigos entraram em conflito com os Awá-Guajá, contribuindo para a redução da população.
Na década de 1940, com o incremento das plantações de algodão no estado, os Awá-Guajá foram forçados a descer os vales dos rios, expondo-se ao contato com colonizadores que ocupavam a região. Passaram a ser vistos nos afluentes do rio Caru, mas recusaram, por um longo tempo, qualquer tipo de atrativo das Frentes de Contato do antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), órgão que antecedeu a Funai.
O fluxo migratório das frentes de expansão aumentou após a abertura das Rodovias BR-316 e 222, na década de 1970, forçando a Funai a estabelecer contato com os Awá-Guajá. Em 1979, a Funai contatou o primeiro grupo Awá-Guajá, que atualmente vive na Terra Indígena Alto Turiaçu. Desde 1987, a política indigenista brasileira de proteção e promoção dos direitos indígenas busca garantir aos povos isolados o exercício de sua liberdade e de suas atividades tradicionais sem a obrigatoriedade de contatá-los. A proteção dos direitos desses grupos se dá a partir da proteção territorial das áreas por eles ocupadas.
Os Awá-Guajá são caçadores e coletores. A caça é mantida como base de sua vida social e determina o padrão de ocupação tradicional do território, de grande dispersão. Ainda hoje, os Awá-Guajá recém contatados conhecem e dominam o território com base nos caminhos de caça. Precisam, portanto, de florestas vastas e ambientalmente íntegras, sem as quais não poderão manter sua reprodução física e cultural.
A posse plena da Terra Indígena Awá
A “desintrusão” da Terra Indígena Awá, no estado do Maranhão, está em fase de planejamento pelo governo federal e deverá ser executada até o fim do ano. A retirada dos não índios atende a um direito do povo indígena Awá-Guajá, de recente contato e isolados, além de ser uma determinação Judicial.
No ano passado, vinte anos depois da publicação da Portaria do Ministério da Justiça, que, em 1992, declarou a Terra Indígena como de uso permanente do povo Awá-Guajá, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região julgou improcedentes as ações judiciais impetradas por posseiros para permanecerem na área.
Não cabem mais recursos à decisão, que confirmou a validade da Portaria do Ministério da Justiça e declarou nulos todos os títulos de domínio concedidos pelo poder público em relação às propriedades inseridas no perímetro da Terra Indígena, determinando a retirada dos ocupantes não índios. Entre as medidas determinadas pela decisão da Justiça está o “desfazimento de construções, cercas, estradas ou quaisquer obras no interior da terra indígena e que sejam tidas como incompatíveis com a utilização das terras pelos indígenas e a colocação de placas ao longo de todo o perímetro da terra indígena com indicações didáticas de a área indígena ter sido demarcada por determinação da Justiça Federal no Maranhão, com proibição do ingresso de pessoas naqueles locais sem autorização da Funai”.
A Terra Indígena Awá foi homologada em 2005 e registrada no Secretaria do Patrimônio da União (SPU) em 2009. No entanto, vinha sendo alvo de contestação judicial por ocupantes ilegais desde a publicação da Portaria Declaratória. As ações protelaram a conclusão da regularização fundiária e, consequentemente, a extrusão dos ocupantes irregulares, impedido a posse plena do território pelos Awá-Guajá.
Com o passar do tempo, a Terra Indígena foi alvo de intenso desmatamento. A retirada de madeira e as invasões de posseiros devastaram mais de 30% da área, confinando o povo Awá, que vive exclusivamente da caça e da coleta, em pequenos trechos que ainda restam de mata. A análise, feita por meio de um conjunto de dados disponíveis sobre desmatamento, focos de calor, levantamento fundiário, denúncias documentais e dados obtidos em trabalhos de campo, demonstra que aproximadamente 36 mil hectares foram desmatados na TI Awá entre os anos de 2000 e 2009.
Entenda o caso
A Terra Indígena Awá, localizada entre os municípios de Centro Novo do Maranhão, Governador Newton Bello, São João do Caru e Zé Doca, no estado do Maranhão, é um território de ocupação do povo indígena Awá-Guajá, onde vivem grupos isolados e uma comunidade de recente contato.
O direito de permanência dos índios nessa região é reconhecido pelo Estado brasileiro desde 1961, época em que foi criada a antiga Reserva Florestal Gurupi, com artigo específico para a proteção dos indígenas que ali estivessem. Quando fossem estabelecidos contatos, terras indígenas deveriam ser reconhecidas para uso exclusivo dessas comunidades.
A Criação da Reserva Florestal do Gurupi definiu uma área de domínio Federal, cujos limites deveriam ter sido preservados, o que não foi cumprido. Grupos inteiros de indígenas foram exterminados, vítimas do contato com não índios a partir dos anos 1970, processo intensificado com os impactos advindos da construção de rodovias e, depois, da ferrovia Carajás.
Na década de 1980, a Funai reconheceu as Terras Indígenas Alto Turiaçu e Caru, que se encontravam no perímetro da Reserva Florestal do Gurupi, e a Reserva foi desmembrada. Uma área foi interditada para a proteção dos Awá-Guajá, que já estavam em número bastante reduzido à época, e foi criada a Reserva Biológica Gurupi.
Embora a TI Awá seja a única das três destinada à posse exclusiva dos Awá-Guajá, há aldeias desse povo na TI Alto Turiaçu, coabitada por Ka’apor e na Caru com a presença dos Guajajara. A contiguidade das terras faz com que elas formem um complexo de áreas disponíveis para a posse de grupos Awá-Guajá, que dão condições mínimas para manterem as formas tradicionais de ocupação territorial.
Mesmo após a interdição, a Terra Indígena Awá foi invadida por posseiros e madeireiros, que passaram a ocupar áreas e a explorar irregularmente os recursos naturais, com grave prejuízo para a sobrevivência dos Awá, que vivem exclusivamente da caça e da coleta. Em 1992, a TI Awá foi declarada de posse permanente dos indígenas, por meio de portaria do Ministério da Justiça, e homologada em 2005, por decreto presidencial.
Proteção
Desde 2007, a Funai, vem realizando ações de vigilância nas terras indígenas Araribóia, Carú, Awá e Alto Turiaçu, de ocupação tradicional do povo indígena Awá-Guajá. Operações em conjunto com o Ibama, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal resultaram em prisões e apreensão de produtos florestais ilegais, equipamentos e veículos utilizados pelos madeireiros. Como ainda há grupos Awá isolados, a Funai intensificou a realização de expedições com o objetivo de atualizar as informações sobre a presença e situação desses indígenas.
Com a reestruturação da Fundação Nacional do Índio, em 2009, e levando em consideração a extrema vulnerabilidade do povo Awá-Guajá, recém contatados e isolados, a Funai instituiu a Frente de Proteção Etnoambiental Awá-Guajá. A Frente é responsável, por meio da Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato, por executar ações de vigilância, fiscalização, localização de índios isolados e promoção dos direitos dos Awá-Guajá de recente contato em articulação com outras coordenações do órgão indigenista.
A Funai elaborou diagnósticos e planejamentos para a proteção do povo Awá-Guajá e iniciou a formulação do Programa Awá. O Programa tem o objetivo de realizar ações de cunho educacional, gestão e proteção territorial, mobilizando pesquisadores e organizações da sociedade civil, instituições federais que atuam na região. O intuito é desencadear ações, de forma articulada, que garantam a promoção dos direitos desses povos e a proteção territorial das terras indígenas tradicionalmente habitadas pelos Awá-Guajá.
O Processo de regularização fundiária
1961 – Presidente Jânio Quadros cria a Reserva Florestal do Gurupi, no estado do Maranhão, com 1,6 milhão de hectares, por meio do Decreto n.º 51.026 de 25/07/1961, sendo reconhecido o direito de ocupação dos indígenas que nela habitavam.
A Reserva era constituída pelos territórios dos povos Guajajara, Ka’apor e Awá-Guajá. A área reconhecida hoje como Terra Indígena Awá, assim como as terras indígenas Caru e Alto Turiaçu, encontravam-se dentro dos limites da extinta Reserva Florestal.
1976 – Funai constitui Grupo de Trabalho (GT) para propor limites de áreas indígenas para os Ka’apor, Guajajara e Awá-Guajá. Ao mesmo tempo, o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF realiza viagem de campo com objetivo de definir a divisão da Reserva Florestal do Gurupi entre terras indígenas, reserva biológica e devolução das áreas remanescentes ao governo federal.
1977 – Como resultado do trabalho acima, o GT propõe a definição das áreas das TIs Caru e Alto Turiaçu e a interdição da área ocupada pelos Awá-Guajá. Apesar da proposta clara dos técnicos da Funai e do IBDF sobre a importância de se interditar a área para os Awá-Guajá, esses habitantes tradicionais da região não tiveram, na oportunidade, suas terras demarcadas.
1982– As duas outras terras indígenas que estavam dentro dos limites da Reserva Florestal do Gurupi são demarcadas e homologadas. A TI Carú, coabitada por grupos Awá-Guajá e Guajajara; e a TI Alto Rio Turiaçu; coabitada por grupos Awá-Guajá e Ka’apor.
1985 – Funai constitui Grupo Técnico de Identificação e Delimitação da TI Awá, destinada exclusivamente à posse permanente dos Awá-Guajá.
1987 – Funai e IBDF estabelecem os limites da TI Awá e da Reserva Biológica do Gurupi. A área interditada para uso exclusivo dos Awá-Guajá passou a ser contestada por fazendeiros que se diziam legítimos proprietários, apesar da ocupação histórica e tradicional indígena e do fato de ser, desde 1961, área de proteção ambiental federal, portanto, terra da União.
1992 – A Terra Indígena Awá é declarada como de posse permanente dos Awá-Guajá, para efeito de demarcação, por meio da Portaria nº 373 de 27.07.1992 (DOU 29/7/1992, p. 10.116), com uma superfície aproximada de 118.000 ha (cento e dezoito mil hectares), e perímetro aproximado de 190 km (cento e noventa quilômetros), considerando que a declaração de ocupação tradicional indígena e definição de limites propostos visavam assegurar a proteção territorial ao povo indígena Awá-Guajá.
1994 – A Funai inicia o trabalho de consolidação dos limites físicos da TI Awá. No entanto, o trabalho é suspenso por falta de segurança. A exploração ilegal da Terra Indígena Awá pela pressão de frentes de expansão econômicas, entre madeireiros, posseiros, empresas agropecuárias, somada à intensa mobilização da opinião pública regional e ingerências políticas regionais contrárias à demarcação impediram a equipe de continuar, mesmo após o órgão ter recebido liminar favorável à continuidade do processo, em ação impetrada pela Cia. Agropecuária Alto Turiaçu e outros, ainda em dezembro de 1994.
2003 – A demarcação dos limites físicos é concluída em 10 de junho de 2003 com área de 116.582ha e perímetro de 204,8 Km, após aferimento com equipamento de maior precisão.
2005 – A TI Awá tem os limites homologados pelo Presidente da República. O Decreto de Homologação, é assinado em 19 de abril de 2005 e publicado no Diário Oficial da União de 20 de abril de 2005, seção 1, pág. 7 e 8.
2012 – Após vários anos de disputa judicial, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região julga todos os recursos improcedentes e confirma a validade da Portaria 373/92 do Ministério da Justiça, que declarou a Terra Indígena Awá como de uso permanente do povo Awá-Guajá. A decisão, de março de 2012, confirma ainda a nulidade de todos os títulos de domínio concedidos pelo poder público em relação às propriedades inseridas no perímetro demarcado, restabelecendo os efeitos da sentença e determinando que a Funai/União promova a retirada de todos os ocupantes não indígenas da TI Awá.
FONTE : www.funai.gov.br
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