Diferente do que alegam entidades indígenas, os proprietários de fazendas situadas na Perimetral Norte, região do Ajarani, no Município de Caracaraí, negaram à Folha a resistência em deixar as terras. Eles afirmam que exigem apenas indenização prévia e justa, além do reassentamento garantido pelo Governo Federal.

Em entrevista exclusiva à Folha, o produtor Ermilo Paludo, que possui uma área com três mil cabeças de gado, explicou que o distrito onde ficam as terras foi criado ainda na década de 70, exatamente para o fomento da pecuária e, àquela época, a Funai (Fundação Nacional do Índio) informou ao Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) não ter interesse na área, uma vez que não existiam indígenas na região. Ele apresentou à equipe de reportagem um documento que comprova a informação.

De acordo com Paludo, as terras foram vendidas por meio de licitação pública aberta pelo próprio Incra, com consentimento da Funai, no início da década de 80. As fazendas possuem título definitivo emitido pela União. No local ficam grandes aéreas de pastagens destinadas à criação de milhares de cabeças de gado.

Paludo disse que apenas na década de 9, teve conhecimento, por meio de matérias veiculadas em jornais, de que havia pretensão por parte da Fundação Nacional do Índio em ampliar a reserva Yanomami. “Em nenhum momento fomos comunicados de nada. Não recebi notificação sobre esse aumento de área”, disse.

Já em 1992, o produtor ajuizou uma ação junto à Justiça Federal. Em primeira instância, no ano de 2001, houve uma decisão favorável à Funai, com a condicionante de que as benfeitorias seriam de boa-fé. A demanda tramita em segunda instância. “Apesar da ação, estamos tentando buscar um acordo com a Funai para uma saída pacífica. E nossa reivindicação é que os proprietários sejam indenizados conforme manda a lei. O juiz determina que o perito faça o levantamento das benfeitorias e determine o valor da propriedade. E que nós sejamos reassentados previamente. Quero continuar produzindo, não quero me tornar mais um sem-terra na periferia, vendendo espetinho, como está acontecendo com os produtores que saíram da Raposa Serra do Sol”, disse.

Paludo desconfia da perícia nas terras feita pela Funai para o pagamento da indenização. Segundo ele, a cada novo levantamento, o valor das benfeitorias tem apresentado reduções significativas. Em 1993, por exemplo, o órgão teria chegado ao valor de R$ 2.844.948,00, conforme consta em processo. Já em 2008, um laudo chegou a R$ 4.421.000,00.

No mesmo ano, sem ir a campo, mas apenas por meio de avaliação utilizando imagem de satélite, o valor teria caído para R$ 2.488.000,00. O último levantamento feito, no mesmo ano, segundo Paludo, culminou com a proposta de pagamento de R$ 1.283.990,00 de indenização.

“O cara tem que sair só com a roupa do corpo. Essa é uma tradição pela qual passam as pessoas que estão em áreas indígenas, mesmo com título definitivo: ficar na rua. O que queremos é fazer parte de uma nova história, na qual as pessoas têm seus direitos respeitados”, declarou.

O produtor afirmou ter contratado um perito profissional que acompanhou o levantamento feito pela Funai, sem interferir nos trabalhos, e que chegou a um valor aproximado de R$ 5.500.000,00. “Aceito a perícia nomeada por um juiz, como manda a lei. Se der R$1 milhão ou R$ 20 milhões, vamos acatar. Contestar, se for necessário. Só quero que se aplique a lei”, comentou.

Pecuarista nega conflitos entre índios e não índios na região

O produtor Ermilo Paludo negou à Folha que existam conflitos entre índios e não índios na região, apesar da cobrança de entidades por celeridade na resolução da questão. “Há respeito no local, considero que os índios são tão vítimas como nós. Gostaria que fossem tratados com a dignidade de qualquer cidadão brasileiro”, registrou.

Ele criticou a atenção dada aos indígenas pelo governo brasileiro e disse que há casos de morte por malária, fome e inanição (debilidade extrema causada por falta de alimento) entre os índios.

“Como brasileiro tenho vergonha de como os nossos indígenas são tratados. O modo como o governo brasileiro trata o indígena, transferindo a responsabilidade sobre saúde, educação e inclusão social do indígena para as organizações não governamentais, transferindo verba pública com o intuito de fugir do controle de órgãos fiscalizadores do Estado brasileiro. As ONGs não precisam prestar conta, isso é uma forma de desviar. Deixam o índio morrer e o governo cruza os braços diante disso. Os índios não passam de massa de manobra para essas instituições”, criticou.

O produtor negou ser contrário ao trabalho de todas as ONGs, e ressaltou o trabalho de algumas delas, todas financiadas por instituições privadas. “Gostaria de frisar o quanto é criminosa a política indigenista. Exclui o índio dos avanços sociais e medicinais, trata os índios como se fossem animais em uma grande reserva”, concluiu.

FUNAI – A equipe de reportagem procurou o coordenador da Funai, André Vasconcelos, na manhã de ontem, mas recebeu a informação de que ele estava na região do Ajarani, onde foi realizado um protesto, e que retornaria apenas no início da noite de ontem.

FONTE : Folha de Boa Vista (disponível em: abril 2013)