Daqui a exatamente dois anos, se não houver qualquer atraso no cronograma da obra, a hidrelétrica de Belo Monte ligará a sua primeira turbina para tirar energia das águas do Xingu, no Pará. Bem antes disso, porém, a Norte Energia, responsável pela construção da maior usina do país, precisa entregar compromissos que assumiu quando iniciou o empreendimento, em junho de 2011, e que ainda não cumpriu.  

O Ibama acaba de notificar o consórcio Norte Energia por conta de medidas condicionantes que deveriam ter sido atendidas, mas que ainda não saíram do papel. Essa notificação, que se baseia em um parecer técnico do instituto ambiental concluído em dezembro, tem caráter de alerta à companhia e pode levar a novas penalidades caso os problemas não sejam resolvidos no prazo de até 60 dias.

Na lista de atrasos estão itens básicos, como a conclusão do cadastro das milhares de famílias que terão suas casas e vidas atingidas pelo empreendimento. Um ano e meio depois de iniciadas as obras, o banco de dados ainda não foi entregue, aponta o relatório do Ibama. Sem as informações, ficam comprometidos projetos que dependem desses dados, como o programa de incentivo à pesca sustentável e o plano de conservação e de uso do entorno do reservatório da hidrelétrica.

O Ibama aponta atrasos em definições de áreas para reassentamento urbano, além de problemas na definição de locais para a construção das residências dos trabalhadores e demora na execução do plano de requalificação urbana de Altamira, município mais atingido pela hidrelétrica. Os analistas revelam ainda atraso no tratamento de milhares de toneladas de madeira de áreas desmatadas.

Esse é o segundo relatório realizado desde o início das obras. No primeiro levantamento, feito um ano atrás, o Ibama chegou a multar a Norte Energia em R$ 7 milhões pelos atrasos. O consórcio apresentou defesa administrativa contra a multa e o processo encontra-se em fase final de julgamento pela autoridade de 1ª instância.

Em seu novo parecer, o Ibama sinaliza que o “atendimento às condicionantes evoluiu”. Por meio de nota, o instituto informou que, no primeiro relatório concluído em dezembro de 2011, foram constatadas pendências na execução de 66% dos 87 projetos e 23 condicionantes estabelecidas. Desta vez, o Ibama constatou pendências na execução de 5% dos programas. Ainda assim, conclui o novo relatório, a situação “evidencia que há programas que não estão sendo implementados a contento.”

Desde junho de 2011, o Ibama realizou 19 vistorias na região, totalizando 87 dias de atividades em campo. Foram elaborados 33 pareceres e 44 notas técnicas, além da realização de três seminários técnicos entre Ibama e empreendedor. “O Ibama analisa a adequação das medidas adotadas frente aos impactos constatados e registrados nos relatórios de monitoramento. Na hipótese de não atendimento de condicionantes, são avaliadas quais as medidas administrativas têm sua aplicação recomendada”, informou o instituto.

As estimativas apontam que cerca de 20 mil pessoas vivem às beiras do Xingu em Altamira, em barracos de madeira erguidos sobre palafitas em condições absolutamente precárias. Há ainda cerca de 3 mil ribeirinhos que devem ser atingidos pela usina.

Na semana passada, a Justiça Federal atendeu pedido do Ministério Público Federal, e poderá multar a Norte Energia em R$ 500 mil por dia se a empresa não comprovar que cumpriu o acordo celebrado com indígenas em outubro de 2012, relativo a medidas compensatórias. O MPF afirmou à Justiça que medidas essenciais do acordo não foram cumpridas. Agora, a empresa tem 30 dias para comprovar o contrário. Depois desse prazo, informou o MPF, a multa diária de R$ 500 mil passa a valer.

O pacote de ações compensatórias de Belo Monte soma R$ 3,88 bilhões. Por meio de nota encaminhada ao Valor, a Norte Energia informou que R$ 722,7 milhões foram aplicados nos onze municípios da área de influência da usina, dos quais R$ 302 milhões foram injetados em Altamira. Segundo a empresa, o cadastramento fundiário de Altamira está concluído e será enviado ao Ibama.

Em relação ao reassentamento urbano coletivo de Altamira, a Norte Energia informou que “tem se empenhado por efetuar uma aquisição amigável das terras necessárias para a realocação das famílias, o que, em alguns casos, não tem se mostrado possível”.

A empresa alegou que o plano de requalificação urbana está em andamento, com obras iniciadas em Vitória do Xingu e Altamira. As obras de esgotamento sanitário, drenagem e pavimentação já estão iniciadas em Vitória do Xingu. Em Altamira, os projetos de abastecimento de água e saneamento básico estão em fase final de elaboração para o início das obras nos próximos dias, informou a empresa.

A Polícia Federal investiga casos de prostituição infantil em Vitória do Xingu (PA), a cerca de 20 km de um dos canteiros de obra da usina. Na semana passa, um estabelecimento que funcionava na região foi interditado.

Por: André Borges
Fonte: Valor Econômico 

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