O clima de tensão predomina no povoado de Posto da Mata, em Alto Boa Vista, a 1.064 km de Cuiabá, no nordeste de Mato Grosso, onde vivem as famílias que precisarão deixar a área reconhecida território Marãiwatsédé. Desde a última semana os agentes da Justiça Federal deram início às notificações e a população tem 30 dias para deixar a região de forma voluntária.
Força Nacional de Segurança, Exército, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal e demais membros do serviço federal já estabeleceram bases na área para garantir o cumprimento da determinação judicial. O coordenador-geral de Movimentos do Campo e Território, da Presidência da República, Nilton Tubino, chegou ao local nesta sexta-feira para acompanhar a condução dos trabalhos.
Moradores da área afirmam que vão resistir à desocupação, mesmo com a autorização da Justiça Federal de uso da força pelo serviço policial. “Só saio daqui morto. Cheguei aqui com um ano de idade e tudo o que construí foi fazendo farinha, com o pai trabalhando para um dia conseguir ter uma vida próspera”, desabafou o morador Eliezer Moreira Rocha. “Não somos marginais, mas sim pessoas trabalhadoras”, disse Carla Camelo, de 22 anos, moradora da comunidade.
O acesso ao povoado e também a saída em direção a outros municípios da região foram fechados pelo serviço federal de segurança, de acordo com os moradores. Não é possível deslocar-se, por exemplo, entre os municípios de Ribeirão Cascalheira e Confresa, via BR-158, passando por Posto da Mata. Pontes que dão acesso às fazendas da região foram queimadas.
Nesta semana, em Cuiabá, o prefeito de São Félix do Araguaia, a 1.159 quilômetros da capital Cuiabá, Filemon Gomes Limoeiro, reconheceu a tensão existente na área. O município é vizinho da terra indígena. “Juridicamente não temos mais como apelar”, afirmou o prefeito. A fala é uma referência à decisão do Supremo Tribunal Federal, que derrubou as liminares concedidas em favor da Associação dos Produtores Rurais de Suiá Missú.
Mesmo o governo federal não estimando de maneira oficial quantas famílias precisarão deixar a região, a associação que representa os moradores da área diz haver na localidade pelo menos 7 mil pessoas, número este questionado pelas entidades e organizações sociais.
A reserva
A extensão supera 165 mil hectares. De acordo com a Fundação Nacional do Índio, o povo xavante ocupa a área Marãiwatsédé desde a década de 1960. Nesta época, a Agropecuária Suiá-Missú instalou-se na região. Em 1967, índios foram transferidos para a Terra Indígena São Marcos, na região sul de Mato Grosso, e lá permaneceram por cerca de 40 anos, afirma a Funai.
No ano de 1980 a fazenda foi vendida para a petrolífera italiana Agip. Naquele ano, a empresa foi pressionada a devolver aos xavantes a terra durante a Conferência de Meio Ambiente no ano de 1992, à época realizada no Rio de Janeiro (Eco 92). A Funai diz que neste mesmo ano – quando iniciaram-se os estudos de delimitação e demarcação da Terra Indígena – Marãiwatsédé começa a ser ocupada por não índios.
O ano de 1998 marcou a homologação, por decreto presidencial, da TI. No entanto, sucessivos recursos impetrados na Justiça marcam a divisão de lados entre os produtores e indígenas. A Funai diz que atualmente os índios ocupam uma área que representa “apenas 10% do território a que têm direito”.
O território está registrado em cartório na forma de propriedade da União Federal, conforme legislação em vigor, e seu processo de regularização é amparado pelo Artigo 231 da Constituição Federal, a Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio) e o Decreto 1.775/96, pontua a Funai.
Em 2010 uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região confirmou a decisão de primeiro grau reconhecendo a legalidade do procedimento administrativo de demarcação da terra indígena. Para a Funai, “a posse de todos os ocupantes não índios foi considerada de má-fé, sobre bem imóvel da União”.
No entender dos desembargadores a comunidade Marãiwatsédé “foi despojada da posse de suas terras na década de sessenta, a partir do momento em que o Estado de Mato Grosso passou a emitir título de propriedade a não-índios, impulsionados pelo espírito expansionista de ‘colonização’ daquela região brasileira”.
De acordo com o Tribunal, ocupantes não índios não têm direito à Terra por se tratarem de “meros invasores da área, inexistindo possibilidade de ajuizamento de ação indenizatória”.
Em julho de 2011, em outra decisão, o Tribunal Regional Federal da 1º Região garantiu a permanência das famílias de não índios na TI. Contudo, em junho deste ano uma nova decisão revogou a decisão anterior do mesmo tribunal, autorizando a retirada dos ocupantes não índios.
O território situa-se entre os municípios de Alto Boa Vista, Bom Jesus do Araguaia e São Félix do Araguaia, respectivamente a 1.064 km, 983 km e 1.159 km de Cuiabá. De acordo com a Justiça, as famílias notificadas têm até 30 dias para deixarem a localidade de forma voluntária. Os agentes da área de segurança foram autorizados a utilizarem a força – em caso de necessidade – no decorrer do processo de desintrusão.
VER REPORTAGEM COMPLETA EM : G1 – http://g1.globo.com/mato-grosso/noticia/2012/11/so-saio-morto-diz-morador-sobre-desocupacao-de-area-indigena-em-mt.html
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