Sete mil moradores de duas cidades mato-grossenses serão obrigados a abandonar as suas terras, em razão de mais um desdobramento da equivocada política indigenista do governo federal. Os dois municípios estão no interior de uma área de 165 mil hectares, que será destinada a compor a terra indígena Maraiwãtsédé, de um a tribo xavante que reclama o território desde 1992. Com a presença da Força Nacional de Segurança, Polícia Federal e promotores de justiça, para assegurar a expulsão dos não-índios, a situação na região está cada vez mais tensa.
Segundo reportagem do Jornal Nacional, exibida em 17 de novembro, os sete mil residentes de Alto Boa Vista e São Félix estão desesperados com o iminente despejo de suas terras, muitos dos quais as ocupam há mais de duas décadas. “Plantamos 50 hectares e não querem deixar a gente colher. Gastamos 90 mil reais, e simplesmente não vão deixar a gente colher”, afirmou a empresária Delcrestiana Moresco, uma das moradoras que já recebeu notificação para abandonar a área em até 30 dias.
Diante da situação, os produtores rurais têm promovido uma série de ações, para tentar sensibilizar as entidades públicas. No início do mês, um grupo formado por mulheres da região em litígio realizou uma manifestação na Praça dos Três Poderes, em Brasília, na tentativa de reverter a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que derrubou a liminar do Tribunal Regional Federal (TRF 1ª Região), que, por sua vez, determinou a suspensão da retirada dos produtores rurais da área em disputa, no Mato Grosso (CIMI, 14/11/2012).
Além dos protestos, os produtores rurais, motivados pela crescente tensão social na região, realizaram uma série de ações violentas, chegando a tombar uma caminhonete da Força Nacional e a incendiar um posto policial desativado. Por outro Lado, os índios também se mostram tensos e fazem ameaças aos produtores locais, que resistirem à demarcação da terra indígena. Em agosto, o cacique xavante Damião Paridzané declarou que “quem não é índio tem que sair fora da área. Os brancos que invadiram essa área sabiam que a área era dos índios (Diário de Cuiabá, 20/11/2012)”.
Em visita à região, para averiguar a situação, o senador Cidinho Santos (PR-MT) acusou o governo federal de agir de forma complacente, juntamente com a Força Nacional, ao permitir que as forças de segurança bloqueiem as rodovias federais de acesso à Gleba Suiá-Missú (parte das terras em disputa, situada no município de Alto Boa Vista), na tentativa de forçar os moradores a assinarem o termo de desocupação. Na ocasião, o parlamentar afirmou: “O que me parece é que temos os índios, que merecem toda a atenção do Governo Federal, e, do outro lado, brancos que mal fazem parte da pátria brasileira, e que, nem mesmo no Brasil do século XXI, tiveram o seu direito de ir e vir cerceados pela força policial (Gazeta Digital, 19/11/2012).”
Histórico do conflito
Os 168 mil hectares em disputa eram habitados pelos índios xavantes até a década de 1960, quando, então, foram removidos pelo governo militar para outra reserva, a 400 km do local, enquanto as terras foram vendidas, com títulos de propriedade registrados junto às autoridades públicas locais.
Entretanto, desde 1992, os indígenas, incentivados pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e pelo Ministério Público Federal (MPF), têm brigado pela posse da região e pela expulsão de todas as famílias não indígenas que se instalaram na região nas últimas décadas. A Justiça Federal, por sua vez, invalidou todas as escrituras dos imóveis rurais situados na região e determinou a remoção dos não-índios: no dia 6 de dezembro, as primeiras famílias terão que abandonar as suas propriedades.
Em uma tentativa de resolver o contencioso de forma menos traumática, o governo de Mato Grosso ofereceu aos cerca de 900 xavantes uma área de 250 mil hectares, no Parque Estadual do Araguaia, além da promessa de levar asfalto e telefone para a nova área. Entretanto, os indígenas, instigados pelo aparato indigenista, se recusaram a aceitar qualquer permuta e mantiveram os planos originais de desalojar os residentes de Alto Boa Vista e São Félix.
Apesar de o processo principal que determinará a legalidade da demarcação de Marãiwatsédé ainda transitar na Justiça Federal, as remoções estão sendo realizadas com base em uma antecipação de tutela. Para tentar reduzir os impactos sociais de tal decisão, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), sob a supervisão do MPF, está cadastrando famílias “com perfil” para serem incluídas no Programa Nacional de Reforma Agrária – perspectiva, no mínimo, degradante, para quem está sendo obrigado a abandonar terras produtivas e cultivadas há anos. A previsão é de que as famílias sejam reassentadas em quatro outras regiões do estado, dentre as quais o municio de Água Boa, onde há uma área de 12.486 hectares destinada ao reassentamento.
Além dos problemas causados pela violência da remoção dos residentes de terras ocupadas há décadas, com o respaldo da legislação vigente na época da posse, a medida poderá repetir alguns problemas da desastrosa desocupação da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, de onde foram expulsos todos os não índios, inclusive, os produtores de arroz irrigado, que proporcionavam uma das poucas atividades econômicas da área. Com a saída deles, centenas de pessoas, inclusive indígenas, ficaram desempregadas e hoje vivem de atividades de subsistência e esmolas, na periferia de Boa Vista.
Igualmente, não ao poucos os relatos de famílias expulsas de outras áreas, para compor reservas indígenas, que até hoje não receberam as terras prometidas pelo Incra.
Como observou um oportuno editorial do Diário de Cuiabá (12/11/2011): “O que salta aos olhos na questão é que, se por um lado as agências governamentais se mostram bastante preocupadas e zelosas com os índios, o mesmo tratamento não é estendido à população não indígena.”
De fato, como ficou patente no deplorável episódio de Roraima, em nome dos questionáveis “compromissos internacionais” assumidos com o aparato indigenista internacional, o governo brasileiro, uma vez mais, se presta ao papel de desarticular a vida de brasileiros a quem deveria proporcionar os direitos mais elementares da cidadania.
FONTE : Alerta Científico e Ambiental é uma publicação da Capax Dei Editora Ltda. Alerta Científico e Ambiental é uma publicação da Capax Dei Editora Ltda. Rua México, 31, s. 202, CEP 20031-144, Rio de Janeiro-RJ; telefax 0xx-21-2532-4086; www.alerta.inf.br; [email protected] – Conselho editorial: Geraldo Luís Lino, Lorenzo Carrasco e Silvia Palacios.
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