Os óleos e fibras do cupuaçu, babaçu, açaí, pracaxi, da flora brasileira, começam a fazer parte da fórmula de cosméticos e produtos da L”Oréal. Os insumos de origem vegetal respondem por 55% dos utilizados pela empresa francesa e o próximo passo é o uso do bagaço de cana-de-açúcar.

O uso das matérias-primas naturais da Amazônia vem sendo desenvolvido pelos laboratórios da subsidiária brasileira. E a vice- presidente de comunicação científica da L”Oréal, Patricia Pineau, diz que a estratégia para o Brasil é ampla: buscar novos insumos para fórmulas dos cosméticos e produtos para cabelos a partir do centro de pesquisas que será inaugurado até meados de 2014, na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro.

“O centro de pesquisas no Rio não será uma história de marketing. A meta é inovar. O Brasil tem uma natureza generosa. O bagaço de cana, por exemplo, tem alta concentração de fibras e proteínas. São ingredientes naturais que permitem o uso em vários produtos cosméticos”, diz Patricia.

A área de pesquisas da L”Oréal responde por 613 patentes, reúne 3,7 mil especialistas, de 60 diferentes nacionalidades. Em 2011, contou com orçamento de € 721 milhões. São 18 centros de pesquisas, na França, Estados Unidos, Índia, China e Japão.

O mais novo deles é o inaugurado no final de março em Saint-Ouen, ao norte da capital francesa. Neste bairro misturam-se escritórios modernos e prédios residenciais clássicos, de quatro a cinco andares, na região da Porte de St-Ouen. O novo centro é exclusivamente dedicado à criação e busca de novas tecnologias e para coloração e tratamento de cabelos.

Com investimentos de € 100 milhões, o prédio foi desenhado para abrigar laboratórios que testam cabelos de diferentes origens étnicas. As pesquisas consideram cores e texturas de cabelos de homens e mulheres dos 130 países onde a empresa atua, diz Patricia.

Multinacional já usa óleos e fibras de cupuaçu, babaçu, açaí e pracaxi – próximo passo é explorar o bagaço de cana

Com 20 mil metros quadrados, trabalham em Saint-Ouen 500 pesquisadores, vindos das unidades da empresa em diversas partes do mundo, inclusive do Brasil. Há químicos, metrologistas, especialistas em novos materiais, em pesquisas ópticas, computação.

A razão de um centro de pesquisas voltado exclusivamente para criar produtos capilares é óbvia: o segmento responde por cerca de metade do faturamento da L”Oréal, ou € 10 bilhões.

A unidade de pesquisa e desenvolvimento que vai ser construída no Rio também terá como foco principal a pesquisa capilar. A brasileira está entre as mulheres que mais lavam os cabelos no mundo – uma a duas vezes ao dia – e as que mais gastam com coloração.

Dados da Euromonitor mostram o Brasil como o segundo no mundo em gasto per capita, de € 17 ao ano, com cabelos em 2011. Perde apenas para a Noruega, com € 28. Mas o tamanho do mercado dispensa comparações, como observa o presidente mundial da divisão de mercado de grande público da L”Oréal, Jean-Jacques Lebel: “Não me perguntem a razão da Noruega estar em primeiro lugar. Deve ser devido aos preços mais altos dos produtos”, comentou com bom-humor, deixando claro que o importante na pesquisa é o peso do Brasil. Japão e França empatam em terceiro lugar, com € 13 per capita. O gigante, Estados Unidos, entra com € 8 per capita.

Segundo Patricia, tanto os cremes e xampus da linha Kiehl”s, originária da Nova York e voltada ao consumidor de alta renda, como a linha Garnier Fructis, para consumo de massa, beneficiam-se da biodiversidade brasileira. Ela diz que as pesquisas e as inovações realizadas a partir do Brasil podem ser utilizadas em vários países. “É por meio da biofísica que estamos buscando plantas que mostrem resistência ao sol, para utilizar ingredientes naturais em produtos adequados ao Brasil, à Índia, países asiáticos onde a pele e o cabelo são mais expostos a grande luminosidade e calor”, disse.

O Brasil é um grande centro para testes, tem diferentes tipos de peles e cabelos, devido a migrações e miscigenação. A base dos produtos pode ir para Índia, com adaptações. “Lá, as mulheres gostam de odores diferentes, como frutas. Na China, a opção é por cheiros de flores. A brasileira gosta de cheiros que lembrem limpeza”, diz Patricia.

“Tivemos uma experiência muito interessante na Índia. Entendíamos que precisavam de um produto que reduzisse a oleosidade da pele. Lançamos e não deu certo. Depois, verificamos que não bastava combater a oleosidade. Havia também o suor da pele, coisa que não temos aqui na Europa. Nosso clima é seco”, diz a executiva. O Brasil tem “umidade, sol, luz intensa, e pode nos ajudar na criação de protetores solares” para brasileiros e outros mercados.

Caminhar pelo centro de pesquisas de Saint-Ouen dá a sensação de se estar ora numa fábrica ora em um laboratório de análises clínicas. Máquinas voltadas para a indústria têxtil – usadas originalmente, por exemplo, para estamparia e testar cores em tecidos naturais – foram adaptadas pelos pesquisadores da L”Oréal. Robôs imitam aplicações de produtos nos cabelos ou preparam fórmulas economizando tempo. Outro tipo de equipamento avalia fórmulas virtuais para que sejam desenvolvidas apenas aquelas que irão realmente atender às necessidades dos consumidores.

Uma parte do centro é destinada a testar mechas de cabelo natural. Após receberem produtos de coloração, por exemplo, são submetidas a calor, frio, pressão, luz, lavagens que podem demorar até por 40 horas seguidas. Assim, é avaliado o desempenho de xampus, produtos pós-xampu, cremes, óleos e musses de tratamento além dos produtos para coloração. É um trabalho demorado. Há produtos que demoram de seis a sete anos para serem desenvolvidos. (HM)

Fonte: Valor Econômico – A jornalista viajou a convite da L”Oréal – http://amazonia.org.br/2012/11/lor%C3%A9al-amplia-pesquisa-de-insumos-da-flora-brasileira/