Segundo a mídia nacional, em algumas cidades da Região Norte indígenas foram cooptados por candidatos a se deslocarem das aldeias e compareceram as seções eleitorais em 07 de outubro. A mídia tem destacado o fato que os candidatos a vereador teriam oferecido algum tipo de vantagem para que os índios votassem nas últimas eleições. Dois episódios tem se destacado no noticiário, um em Boa Vista/RR e o outro em Atalaia do Norte/AM.– Boa Vista – Roraima

Índios Yanomami denunciam que foram trazidos para votar na Capital

O Ministério Público Eleitoral e a Polícia Federal investigam a suposta prática de crime eleitoral envolvendo indígenas Yanomami da comunidade do Baixo Mucajaí, no Município de Alto Alegre, e dois candidatos a vereador de Boa Vista nas eleições 2012, dentre eles um vereador eleito no pleito de domingo.

Conforme depoimentos dos indígenas, formalizado em documento encaminhado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) ao Ministério Público Federal em Roraima, o grupo de cerca de 30 Yanonami com várias crianças foram trazidos para a Capital no dia 1º de outubro em um ônibus cedido por um candidato que não foi eleito.

O candidato teria fornecido alimentação para os indígenas, que ficaram alojados na casa de um “parente”, supostamente em troca de voto. A vinda do grupo à Capital, que mora em Alto Alegre, seria com a clara “intenção que os mesmos votassem no último pleito eleitoral, com a promessa de regresso à Terra Indígena Yanomami”, consta no documento.

“Relatam também que receberam no local onde estavam dormindo a visita da mãe do candidato […] onde a mesma distribuiu santinhos do candidato e deu rancho composto de arroz, farinha, frango e carne. Em troca a mesma pediu para que votassem no filho dela”, detalharam os indígenas no documento.

Segundo os Yanomami, os votos foram divididos entre os dois candidatos denunciados. Eles detalharam o número de cada um dos candidatos e ainda apresentaram os santinhos distribuídos para o grupo.

No documento elaborado pela Funai consta que, por não ter se elegido, um dos candidatos se negara a fazer o deslocamento de volta dos indígenas para a comunidade, apesar de essa ter sido uma das promessas feitas aos Yanomami.

Sem meios para voltar à comunidade localizada na Terra Indígena Yanomami, na tarde de ontem os indígenas procuraram a sede regional da Funai para pedir apoio no retorno para casa. Apesar de receosos devido à presença de um dos indígenas apontado como suposto cabo eleitoral dos candidatos, alguns relataram a situação que ocorrera.

Eles informaram que já estariam passando por dificuldades, até mesmo sem alimentação. A Folha esteve na chácara em que o grupo foi alojado, localizada no bairro Raiar do Sol. As condições precárias do local são visíveis. Adultos e crianças se apertavam no espaço improvisado.

Servidores da Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami e Ye`kuana colheram os depoimentos e encaminharam o documento assinado por 17 indígenas aos órgãos competentes. O retorno do grupo à comunidade do Baixo Mucajaí deve ocorrer hoje.

Indígenas são ouvidos pela Polícia Federal e MP Eleitoral diz que caso será investigado

Ao tomar ciência do fato envolvendo os índios Yanomami, o procurador regional eleitoral Leonardo de Faria Galiano orientou que o grupo de indígenas fosse levado à sede da Superintendência da Polícia Federal para prestar depoimento. 

Cerca de 20 pessoas foram ouvidas e reafirmaram as informações repassadas a servidores da Funai. Quatro delegados da PF colheram os depoimentos dos indígenas durante a tarde de ontem. Outros detalhes sobre o suposto crime eleitoral foram colhidos.

Galiano e promotores de Justiça do Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR) acompanharam parte dos depoimentos. O diretor da Hutukara Associação Yanomami, Dário Kopenawa Yanomami, foi chamado para auxiliar na tradução.

“Surgiu denúncia referente ao pleito municipal. Está sendo feita investigação, mas os detalhes eu não posso revelar por conta do sigilo que está sendo necessário agora enquanto se investiga o fato. Vamos verificar o conteúdo dos depoimentos e o que existe de provas e, a partir dessa análise, os promotores e delegados vão decidir qual será o caminho da investigação”, informou o procurador regional eleitoral.

O coordenador da Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami e Ye`kuana, João Batista Catalano, ressaltou que os Yanomami são índios de recente contato com brancos e não têm obrigação de votar. Muitos não possuem título de eleitor.    

“É estranho o caso porque eles são índios que moram dentro da reserva Yanomami, falam pouco português e como um grupo grande desse fez para tirar o título de eleitor aqui em Boa Vista? Não é que não tenham direito de votar, mas eles moram em Alto Alegre, isso por si só já caracteriza crime eleitoral”, destacou Catalano.

– Atalaia do Norte – Amazonas

Índios que ganharam gasolina para votar não têm como voltar

Centenas de índios que receberam combustível de candidatos para viajar de barco e votar em Atalaia do Norte (1.036 km de Manaus) estão abandonados na cidade, sem recursos para voltar.

Sem ter como abastecer as 94 canoas, ao menos mil índios, incluindo crianças e adolescentes, estão vivendo em barcos, barracos improvisados no porto, galpões cedidos pela prefeitura e em casas de parentes, segundo a Funai (Fundação Nacional do Índio).

Dar ou oferecer dinheiro ou vantagem para obter voto é crime previsto no Código Eleitoral, punido com pena de até quatro anos de prisão.

“Candidatos indígenas e não índios estimularam a vinda mandando gasolina para as aldeias, depois os largaram. Uma coisa abominável”, disse Bruno Pereira, coordenador regional da Funai.

A Justiça Eleitoral deverá apurar os candidatos responsáveis pelo aliciamento.

Os índios são da terra indígena Vale do Javari, fronteira do Amazonas com o Peru.

Há vinte dias, os indígenas se deslocaram com as famílias para a votação. As viagens duraram de oito a dez dias pelo rio Javari.

Cerca de 600 índios votaram na cidade, disse o líder marubo Jader Franco, 30, da organização Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari). “Os caciques estão revoltados com os políticos.”

O município teve três candidatos a prefeito e 85 a vereador. Compareceram às urnas 4.899 eleitores.

Pereira, da Funai, disse que uma comissão com participação da Justiça Eleitoral tenta solucionar o problema.

Para providenciar o retorno serão necessários 35 mil litros de combustível ou R$ 140 mil, além de alimentação. Segundo ele, a Funai colaborou com R$ 75 mil.

Morrem crianças de grupo indígena sem dinheiro para voltar para aldeias após votação

Duas crianças do grupo de índios do sudoeste do Amazonas que está sem dinheiro para retornar às suas aldeias depois das eleições de domingo morreram nesta quinta (11) após quadro de diarreia.

Ao menos mil índios estão acampados há quase uma semana em condições precárias de higiene em canoas e barracos em Atalaia do Norte (1.036 km de Manaus).

Eles receberam de alguns candidatos apenas o combustível para o trajeto entre a terra indígena e a cidade.

Como os políticos foram derrotados nas urnas, sumiram da cidade, e os índios agora estão sem dinheiro para comprar o combustível da volta, segundo a Funai (Fundação Nacional do Índio).

Para abastecer as 94 embarcações, seriam necessários cerca de R$ 140 mil.

A viagem de barco pelo rio Javari até a terra dos índios, na fronteira com o Peru, leva de oito a dez dias.

Heródoto Jean, coordenador do Dsei (Distrito Sanitário Especial Indígena), do Ministério da Saúde, disse que as crianças mortas têm menos de dois anos de idade e são das etnias canamari e maiuruna.

Elas adoeceram nas canoas e chegaram ao hospital da cidade em “estado gravíssimo”. Outras 33 crianças estão internadas em tratamento na Casa do Índio.

Duas estão hospitalizadas, uma com pneumonia e outra com diarreia grave.

“Quando as crianças chegaram ao hospital elas estavam muito mal, morreram com vômito e diarreia”, disse Jean.

“Os índios vieram para votar e os políticos jogaram eles por aí. Todo mundo foi embora, o juiz e o promotor”, completou Heródoto Jean.

À Folha o coordenador local da Funai, Bruno Pereira, disse que candidatos indígenas e não índios estimularam a viagem dos índios. Os nomes dos candidatos, porém, não foram divulgados.

O município teve três candidatos a prefeito e 85 a vereador. Compareceram às urnas 4.899 eleitores.

Dar ou oferecer dinheiro ou vantagem para obter voto é crime previsto no Código Eleitoral, punido com pena de até quatro anos de prisão.

Nesta quinta (11) o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Amazonas informou que a Funai precisa denunciar os políticos para que seja aberta uma investigação de crime eleitoral.

Segundo o tribunal, o juiz eleitoral Bismarque Leite e a promotora Ynna Breves Maia não receberam denúncias sobre a doação de combustível.

Pereira, da Funai, disse que não divulgou nomes dos candidatos por temer represálias. “A Justiça sabia do problema, houve uma campanha suja e a Justiça virou as costas, quer empurrar com a barriga.”

O Cimi (Conselho Indigenista Missionário), da Igreja Católica, alertou órgãos federais sobre o problema.

Em nota enviada na véspera das eleições, o conselho disse que os “os índios foram incentivados por candidatos, ávidos por assegurar suas vagas na Câmara e prefeitura”.

FONTE : Folha de Boa Vista e Folha de São Paulo

http://www.folhabv.com.br/Noticia_Impressa.php?id=137817  –  http://www1.folha.uol.com.br/poder/1168271-morrem-criancas-de-grupo-indigena-sem-dinheiro-para-voltar-para-aldeias-apos-votacao.shtml