Uma criança indígena, com poucos dias de vida, foi internada no Hospital da Guarnição em São Gabriel da Cachoeira/AM, após um trabalho de convencimento de seus familiares em uma aldeia localizada na região Noroeste do Amazonas.

Fonte: CFRN – 5º BIS


A narrativa a seguir foi feita pela esposa do oficial comandante do 3º Pelotão Especial de Fronteira (3º PEF), sediado em São Joaquim, no Amazonas, na fronteira com a Colômbia, horas antes da transferência da criança, em aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB), para o Hospital do Exército, em São Gabriel da Cachoeira/AM.

“JEFFERSON, criança indígena, recém-nascida, com apenas 23 dias, está morrendo à míngua com quadro de desnutrição gravíssima no PELOTÃO ESPECIAL DE FRONTEIRA DE SÃO JOAQUIM!

JEFFERSON não tem músculos, não reage, não chora, não abre os olhos: Só pele e osso! Os enfermeiros do PEF o colocaram no soro glicosado. Demoraram 1h para conseguir achar uma veia e injetar a agulha. No fundo, ninguém acreditava que a criança sobreviveria. A mãe não o amamenta há mais de duas semanas. A criança só se alimentou de leite materno durante uma semana após nascer.

A criança estava sendo amamentada e apresentou fezes esverdeadas, diferentes do que estão acostumados a ver. Diante da falta de explicações para o fato, o pajé atribuiu o distúrbio ao leite da mãe, afirmando que seu alimento materno está amaldiçoado. Acrescentou que a criança morreria se continuasse mamando no peito. A mãe, confiando no pajé, passou a alimentar a criança com água de coco e xibé (mistura de água com farinha).

A mãe olhava para a criança sem esboçar nenhum sentimento materno. Olhava-nos cuidar de seu filho com uma certa distância. As esposas dos militares; todas, como eu; procuramos ajudar como podíamos. Uma dava leite na mamadeira, outra limpava o bumbum cheio de escaras e em carne viva, outra buscava roupas usadas para cobrir o bebê à noite. 

Tentamos sensibilizar a mãe e convencê-la a amamentar, mas como ela não fala português, apenas curipaco, instalou-se uma distância intransponível, tanto de comunicação quanto cultural.

Oferecemos a ela um prato de feijão, arroz, carne e farinha. Ela rejeitou os alimentos e somente comeu a farinha. Tinha sobrevivido a vida toda à base de farinha de mandioca e água; pesca e caça, só com muita sorte.

Esta comunidade é completamente isolada. A pátria deles é o solo pobre em que vivem e só!  Conseguimos convencê-la a amamentar a criança. Ainda achávamos que ela queria que a criança morresse, por isso a acompanhamos durante 24h.

A criança, depois de descobrir na mãe o leite, sugou como um bezerrinho. Tão frágil, colocou todas as suas forças naquele ato de mamar. Chorou (uma imensa alegria para nos!). E dormiu, como uma criança que acabava de receber a vida de volta. Depois disso, nossas esperanças renasceram. Pensamos que sim, ela ia sobreviver. Não perderíamos o Jefferson!

Durante os dois dias em que eles ficaram conosco, buscamos providenciar o deslocamento deles para São Gabriel, onde há um hospital em que o bebê pode ser mais bem tratado. Segundo os enfermeiros, o menino precisa ir para a UTI com urgência! Conseguimos acionar o órgão responsável pelo atendimento médico das comunidades indígenas: DSEI (DISTRITO ESPECIAL DE SAÚDE INDÍGENA – do Min. Da Saúde).

Vieram numa voadeira, após 24 h de viagem, e partiram. No entanto, ao chegar em sua comunidade, a mãe se recusou veementemente a continuar a viagem e descer para São Gabriel. A única alternativa para salvar JEFFERSON seria forçar a mãe a viajar, arrastá-la pelo braço, obrigá-la a ir. MAS SOMENTE A FUNAI PODE FAZER ISTO!

Diante da notícia de que a mãe havia retornado a sua comunidade, não pensamos duas vezes e fomos até lá, tentar trazê-la conosco. Estávamos com a previsão da vinda de um avião do EB, e imaginamos que poderíamos deslocá-los nele. Uma hora e meia de viagem numa voadeira. Uma comunidade minúscula no meio da selva Amazônica. Nenhum contato com o Brasil!

Depois de conversar com o capitão (cacique) da comunidade e de tentar convencer a mãe de que Jefferson precisa de cuidados médicos e que poderá morrer se não for socorrido, a mãe, com o menino nos braços e com uma mamadeira de xibé ( água amarela, rala) permanecia firme na decisão de ficar na comunidade.

Conversamos com a avó da criança, em espanhol, pois não falam português, apenas curipaco. Ela nos disse que eles, índios, não são como nós. Eles têm inimigos e muitas coisas que acontecem são por causa de feitiços; as enfermidades dos índios não são iguais às dos brancos: são fruto do pecado; os remédios de brancos não curam índios e concluiu dizendo que, se a criança sobrevivesse ou morresse, seria por conta da vontade de Deus.

Conseguimos, com a ajuda do General Duarte (Cmdt da 2ª Brigada de Infantaria de Selva de São Gabriel da Cachoeira), a intercessão de funcionário da FUNAI, o qual conseguiu convencer a mãe a tomar o avião da FAB. Ela impôs a condição de que o Cacique fosse com ela.

Hoje, domingo, 14/10/212, a nossa esperança de que Jeferson receba socorro se renova!!!!
JEFERSON, QUEREMOS VC ENTRE NÓS!!! FIQUE AQUI!”

Nas fronteiras da Amazônia Brasileira estão instalados os Pelotões Especiais de Fronteira e as comunidades adjacentes acabam por se tornar dependentes dessas unidades militares.

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