Para especialistas em direito, Constituição e regulamentações podem resolver dúvidas.

Se a presidente Dilma Rousseff vetar pontos da medida provisória do Código Florestal que foram alterados pela Câmara dos Deputados, isso não necessariamente causará os temidos vácuos jurídicos sobre a questão. A opinião é de especialistas em direito ambiental.

Para o jurista Paulo Affonso Leme Machado, um dos criadores do direito ambiental no Brasil e autor do livro Novo Código Florestal, que traz comentários à Lei 12.651, aprovada em maio deste ano com vetos de Dilma, a solução para o principal ponto de discórdia – a recomposição de mata ciliar desmatada ilegalmente – está na Constituição Federal.

“Na questão da recomposição, não se pode negociar. O governo não é proprietário do ambiente para definir isso”, diz. Ele se refere ao Artigo 225, que define que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado” e que é dever público defendê-lo e preservá-lo.

O terceiro parágrafo desse artigo também aponta que condutas lesivas ao meio ambiente são sujeitas a infrações, “independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Ou seja, diz ele, “ninguém tem o direito de não recompor” e não faria sentido discutir o tamanho que tem de ter essa restauração. “É uma discussão que, a meu ver, é inadequada. Todos têm obrigação de recompor. Ponto final.”

Para o jurista, o grande problema é fazer uma correspondência da obrigação com o tamanho da propriedade, em vez de levar em conta as necessidades hídricas e geológicas da região, que é o que delimitam a capacidade das áreas de preservação permanente (APPs) de proteger solo e água – sua principal função.

“O que deveria estar sendo analisado é quais proprietários rurais que têm problemas econômico-financeiros para manter ou recuperar sua APP e o governo deveria dar um montante para recuperar APP. Do contrário, estamos produzindo seca.”

Escadinha – A MP editada por Dilma tinha como principal destaque a chamada “escadinha”, que definia critérios diferentes de obrigação de restauração das chamadas áreas consolidadas desmatadas até 2008 conforme o tamanho da propriedade. Assim, pequenos proprietários teriam de recompor menos, os médios um pouco mais e os grandes, mais ainda. Na Câmara, foi reduzida a obrigação para médios (de 20 para 15 metros) e grandes (de 30 para 20 metros).

O governo manifestou em várias ocasiões que considerava a proposta o melhor equilíbrio entre as questões sociais e ambientais e que não aceitaria uma flexibilização maior que essa. Portanto, é de se esperar que Dilma vete as mudanças. O que gera dúvidas é se isso poderia deixar um vazio sobre a obrigação dos médios e grandes produtores.

Para André Lima, consultor jurídico do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia e SOS Mata Atlântica, uma saída seria vetar inteiramente o Artigo 61-A, que define a questão.

“Se vetasse inteiro, poderia resolver, em alguma medida, as anistias e poderia repor o interesse social e público relacionado aos pequenos produtores com um ou mais decretos que definissem algumas atividades de interesse social ou baixo impacto para fins de consolidação de uso de áreas desmatadas. Resolveria 80% dos problemas sem necessariamente expandir a anistia para médios ou grandes proprietários”, afirma. Para os demais, ficaria valendo o Artigo 4.º, que delimita o que é APP.

Essa possibilidade é proposta desde que começaram as discussões para reformular a lei. Os ruralistas sempre alegaram que pequenas propriedades ficariam inviabilizadas se tivessem de cumprir a lei, assim como algumas culturas, como café, uva e arroz, que se desenvolvem melhor justamente em APPs como topo de morro e margens de rio. “Isso colocaria algum equilíbrio na lei, mantendo a regra, mas explorando as exceções.”

FONTE  : O Estado de São Paulo – http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=84414