Consultor técnico da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) para o Acampamento Terra Livre, que acontecerá na Cúpula dos Povos durante a Rio+20, Carlos Alberto Teixeira Nery, do povo Piratapuia, diz que a violação dos direitos indígenas, em consequência do atual modelo desenvolvimentista, da crise do capitalismo, da economia verde e seus impactos, é um dos principais temas de interesse dessas populações durante a Conferência da ONU. Presidente da Associação das Comunidades Indígenas do Médio Rio Negro, de Santa Isabel do Rio Negro, no Amazonas, Nery diz, nesta entrevista à Clima e Floresta, que os povos indígenas têm se reunido e preparado para o evento, mesmo que não tenham participação direta na programação oficial.
Clima e Floresta – Como os povos da floresta Amazônica, em especial os povos indígenas, pretendem participar da Rio+20? Por que essa participação é importante?
Carlos Nery – É importante destacar que Rio+20 é o apelido dado à conferência da ONU em si e, devido à grande restrição e burocracia da parte dos organizadores da conferência, os povos indígenas não terão participação direta na programação oficial, embora tendo uma representação de indígenas que levarão as propostas do movimento para debate e participação na programação oficial, pois o evento está motivando a organização de uma série de eventos e processos de discussão no Brasil e em todo mundo. Assim, vão ocorrer inúmeras atividades relacionadas também em outros lugares e em outras datas. Entre elas, destacamos a Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental, um evento organizado por redes de ONGs e movimento sociais do Brasil e do exterior, que acontecerá de 15 a 23 de junho no Aterro do Flamengo. No Acampamento Terra Livre (ATL), promovido pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), está estimada a participação de mais de 1.200 indígenas do Brasil, que se juntarão a lideranças indígenas de outros países do nosso continente e do mundo.
Clima e Floresta – Quais são os temas mais importantes para a população que vive na floresta e que precisam ser discutidos em um evento mundial como este?
Nery – A crescente violação dos direitos indígenas, em consequência do atual modelo desenvolvimentista, da crise do capitalismo, da economia verde e seus impactos. Debater propostas comuns, estratégias e agenda de lutas para o enfrentamento desse quadro; estratégias para a demarcação das terras indígenas; formas de pressionar o governo a aplicar a Convenção 169 da Organização Interacional do Trabalho (OIT) e o modelo de desenvolvimento da região amazônica, que inclui as grandes obras que afetam as terras indígenas.
Clima e Floresta – Os povos da Amazônia brasileira estão conectados com os demais povos amazônicos, os brasileiros de outras regiões e do resto do mundo? Como? O que estas agendas têm em comum?
Nery – No “1º Congresso Regional Amazônico: Saberes Ancestrais, Povos e Viva Plena em Harmonia com a Natureza”, realizado em Manaus nos dias 15 a 18 de agosto de 2011, com a participação de mais de 300 pessoas, integrantes de organizações nacionais indígenas amazônicas de nove países sul americanos, como são a AIDESEP (Peru), APA (República Cooperativa de Guiana), CIDOB (Bolívia), COIAB (Brasil), CONFENIAE (Equador), FOAG (Guiana Francesa), OIS (Suriname), OPIAC (Colômbia), ORPIA (Venezuela), e mais de 80 organizações indígenas amazônicas de nível regional e local, e 60 entidades sociais e ambientais aliadas; se debateu o processo da Rio+20, quando se estabeleceu uma série de atividades que culminarão com a realização do ATL/Cúpula dos Povos.
Clima e Floresta – Quais são suas expectativas e das instituições que representa em relação à Conferência?
Nery – Na Rio+20, é necessário fazer um esforço para avançar no melhor posicionamento de alternativas eficazes e eficientes, como em saneamento, consolidação, garantias e seguridade dos territórios integrais dos povos indígenas, nossos Planos de Vida Plena de Uso e Conservação, economia de reciprocidade e sustentabilidade, harmonia entre a natureza, sociedade e cultura.
Clima e Floresta – Em que o governo brasileiro deveria estar empenhado para que a sustentabilidade socioambiental fosse realmente uma meta prioritária no Brasil?
Nery – Dentro da Conferência oficial da ONU, incidir para a inclusão de propostas indígenas nas resoluções oficiais. As propostas preliminares e sujeitas à alteração com as organizações indígenas aliadas são: políticas e fundos públicos para a titulação de territórios indígenas e planos de Vida Plena, como o Fundo do Clima, FIP e outros. Ratificação do Convênio 169 e Declaração das Nações Unidas sobre Direitos dos Povos Indígenas (DNUDPI) e leis nacionais de consulta vinculante e de consentimento. Renovar o Protocolo de Kyoto, com compromissos de redução de gases de efeito estufa e sanções ao não cumprimento. Políticas e fundos públicos para o REDD+ Indígena fora o mercado de crédito de carbono e controle ao “Carbono Cawboys”. Corte Penal Ambiental, implementada com urgência e independente dos poderes globais, dentre outros temas.
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