Corte aponta desrespeito a rito de medida provisória no Congresso. Executivo e Legislativo deverão se adequar, disse advogado-geral.
Por 7 votos a 2, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) julgaram inconstitucional nesta quarta-feira (7) a lei que criou o Instituto Chico Mendes (ICMBio), em 2007, por meio de medida provisória apresentada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O órgão tem a missão de administrar as unidades de conservação ambiental no Brasil.
O STF, no entanto, estabeleceu o prazo de dois anos para que o Congresso possa analisar e aprovar uma nova lei que mantenha a existência do instituto. Nesse período, o órgão continuará em funcionamento.
A lei foi contestada no Supremo pela Associação Nacional dos Servidores do Ibama (Asibama), que apontou uma irregularidade na tramitação da MP que criou o instituto. A entidade afirmou ainda que o ICMBio “fraciona” e “enfraquece” a gestão do meio ambiente.
A lei que criou o órgão foi derrubada pela maioria dos ministros do STF por ter desrespeitado regra, prevista na Constituição, que exige a análise das medidas provisórias por uma comissão mista, formada por parlamentares do Senado e da Câmara. Só depois da aprovação nessa comissão a MP poderia ser votada no plenário do Congresso.
Esse ritual não vem sendo obedecido na aprovação de medidas provisórias, porque um resolução do Congresso estabelece que a MP deve ser analisada em 14 dias pela comissão mista e, caso isso não ocorra, poderá seguir diretamente para análise em plenário. A maioria do STF não concorda com essa regra.
“É difícil imaginar a soberania do Congresso Nacional quando o parecer é fruto de uma voz unívoca, quando a comissão não se instalou. Percebe-se assim que o parecer da comissão representa garantia de que o legislativo seja, realmente, o fiscal da função legiferante do Executivo”, afirmou o relator do caso, ministro Luiz Fux.
Segundo o ministro Fux, o Supremo sinalizou para o Congresso com uma orientação sobre como devem ser analisadas as MPs. A decisão vale apenas para esta norma, mas é um precedente que pode ser aplicado se outra lei com o mesmo problema for contestada.
O ministro disse que o tema será avaliado caso a caso. “O Supremo não vai validar leis que não cumpram o rito constitucional”, disse Fux.
Mudança nas MPs
Para o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, o Congresso e o governo deverão se adequar ao novo entendimento do STF sobre a tramitação das MPs para que outras leis não sejam contestadas.
Segundo ele, o Supremo fixou que o processo de aprovação das medidas provisórias deve respeitar o que está escrito na Constituição, que prevê a análise por parte da comissão mista.
“A solução é instalar a comissão e fazer funcionar. Toda mudança de rito é uma preocupação. O ministro Fux foi cuidadoso, pelo que entendi, em dar um prazo de 24 meses de adaptação do próprio rito no sentido de garantir que esse processo legislativo se adapte. É possível fazer”, afirmou Adams.
Durante o debate, os ministros criticaram os chamados “penduricalhos” incluídos nas MPs para legislar sobre diversos temas em uma só norma.
“O que se quer é o mínimo de democracia deliberativa e participativa por parte do parlamento. Talvez com isso se esteja aviando um remédio contra esses abusos notórios que são a negociação a partir de um relator, a possibilidade de pendurar essas causas todas”, argumentou o ministro Gilmar Mendes.
“Temos uma confusão de interesses que nada tem a ver com o objetivo da medida provisória e nem da constituição legislativa. Lá em Minas, a gente chama de lei Frankstein, que é a lei que tem de tudo dentro”, lembrou a ministra Cármen Lúcia.
O ministro Ricardo Lewandowski foi o único a votar pela manutenção da lei. Para ele, é preciso ter cuidado ao tratar o rito de aprovação das MPs, porque estas são o mecanismo pelo qual o governo pode dar respostas “rápidas” a situações urgentes.
“As medidas provisórias vieram para ficar. São instrumentos que o Executivo tem, num mundo globalizado, em que precisa reagir rapidamente para fazer face aos desafios. Compartilho da ideia que a analise desse requisito deve ser feita em gradações”, ponderou.
Urgência
A maioria dos ministros do STF, no entanto, concordou que havia urgência que justificasse a criação do instituto por meio de medida provisória. A justificativa foi a relevância da preservação do meio ambiente.
“Meio ambiente hoje é tão importante que ao lado da moralidade na vida pública e ao lado da democracia se tornou uma questão planetária”, ressaltou Ayres Britto.
“Tudo parece urgente em termos de meio ambiente na conjuntura que vivemos hoje”, completou a ministra Rosa Weber.
O presidente do STF, ministro Cezar Peluso, argumentou que a assinatura de um convênio, após a aprovação da MP, devolvendo as atribuições do novo órgão ao IBAMA, demonstraria a falta de urgência. “Se o próprio IBAMA reconheceu a possibilidade de trazer de volta as atribuições é porque a delegação não era urgente”, afirmou o presidente do Supremo.
Não participaram do julgamento os ministros Dias Toffoli e Joaquim Barbosa.
FONTE: G1
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