O brasileiro Paulo Adario, diretor da Campanha da Amazônia do Greenpeace no Brasil, recebeu hoje da ONU – Organização das Nações Unidas o Prêmio Heróis da Floresta, concedido a pessoas de todo o mundo que ajudaram a proteger florestas e suas comunidades. A cerimônia de entrega foi realizada dia 09 de fevereiro de 2012, em Nova York, e marcou o encerramento do Ano Internacional das Florestas, comemorado em 2011, como designado pela ONU.
Paulo coordena uma equipe de pesquisa sobre a indústria madeireira na Floresta Amazônica e que trabalha contra a devastação florestal que o setor causa na região. Ele foi o eleito do Prêmio Heróis da Floresta na América Latina. Os ambientalistas representantes de outras regiões foram:
– Paul Nzegha Mzeka, do Camarões (África);
– Shigeatsu Hatakeyama, do Japão (Ásia);
– Anatoly Lebedev, da Rússia (Europa), e
– Rhiannon Tomtishen e Madison Vorva dos Estados Unidos (América do Norte).
Além de Paulo Adario, outros dois brasileiros foram homenageados na cerimônia da ONU: José Cláudio da Silva e Maria do Espírito Santo, casal de líderes extrativistas que foi assassinado no ano passado, no Pará, depois de receber ameaças de morte por conta do trabalho de proteção da floresta que desempenhava na região.
Integra do discurso do diretor da Campanha Amazônia do Greenpeace, Paulo Adario, na cerimônia de entrega do Prêmio Herói da Floresta, da ONU
Agradeço a você, Jan, e ao júri da ONU por conceder a mim e aos meus colegas vencedores do prêmio por suas contribuições à luta para salvar nossas florestas. Eu posso dizer que nós podemos ir para casa agora sabendo que somos mais fortes do que éramos antes.
Primeiro de tudo, eu quero compartilhar este momento com minha esposa, Amélia, e minhas filhas Julia e Luana, que apoiaram com inacreditável paciência o fato de que nos últimos 15 anos eu passei muito do meu tempo com outro amor: a Amazônia.
Eu também quero compartilhar essa honra com aqueles com quem eu tenho trabalhado, tanto dentro como fora do Greenpeace, para proteger a Amazônia e, portanto, o nosso futuro. Eu vivo em uma região onde o afastamento, a governança insuficiente, a injustiça social e a disputa dramática por recursos naturais e áreas de floresta geram heróis e vítimas quase todos os dias.
Pessoas como Chico Mendes, a irmã Dorothy Stang ou Zé Claudio e sua esposa Maria, que lutaram e morreram para manter viva a ideia fundamental de que as florestas e as pessoas são interdependentes e interconectadas, e pessoas anônimas que estão agora protegendo suas terras no meio da floresta com toda a energia possível.
Muitas dessas pessoas são heróis e deveriam estar aqui no meu lugar esta manhã. Receber este prêmio é uma honra e irá ajudar-nos – os vencedores aqui presentes hoje – a continuar a nossa missão. Devemos admitir que o título de “herói” traz um reconhecimento intrínseco pela ONU de que as florestas ainda estão em grande perigo.
Meus amigos, a queda de árvores gigantes em florestas densas como a Amazônia é uma experiência aterrorizante. É um massacre diário, principalmente o resultado da expansão da pecuária, da agricultura industrial, da exploração predatória de madeira, de estradas, barragens e mineração sobre a floresta.
Um caminho semelhante está sendo trilhado também no Sudeste Asiático, onde as florestas estão cedendo espaço a plantações de óleo de palma e produção de celulose e papel, bem como na Bacia do Congo, sob intensa pressão de exploração madeireira ilegal.
O desmatamento responde por 12 a 20% do volume de gases do efeito estufa na atmosfera, causadores das mudanças climáticas. E colocou o Brasil na lista dos cinco maiores inimigos do clima.
Quando abrimos nosso escritório em Manaus, em 1999, o desmatamento estava disparado. A boa notícia é que agora as taxas de desmatamento na Amazônia brasileira têm caído ao longo dos últimos anos. Uma outra boa notícia é o fato de a economia brasileira estar indo bem, a produção e exportação de alimentos e commodities continua a crescer, provando que não há oposição entre proteção ambiental e desenvolvimento econômico.
A chave para a queda do desmatamento foi uma melhor governança na região e os recentes mas muito bem-vindos acordos corporativos para não negociar produtos provenientes da destruição florestal. Isto não teria sido possível sem a mobilização da opinião pública dentro e fora do Brasil por ambientalistas, cientistas, comunidades locais, populações indígenas e um pequeno número de corajosos políticos.
O Greenpeace teve um papel fundamental em alguns destes momentos. Estou orgulhoso de fazer parte disso e estou muito honrado em estar aqui compartilhando as boas novas com vocês. Mas ainda estamos longe de salvar as florestas tropicais. E nós não vamos salvar o clima se não salvarmos as florestas.
Cada pedaço de floresta amazônica perde, reduz sua capacidade de regular o ciclo das chuvas, o abastecimento de água necessária para gerar energia e impulsionar a agricultura não só no Brasil. São essas chuvas que também irrigam a maioria dos solos férteis da América do Sul até o centro-oeste dos Estados Unidos.
O desmatamento é um péssimo negócio para qualquer um. Não podemos mais aceitar a destruição das florestas, e eu quero convidar todos vocês para unirmos nossas forças e dar um fim ao desmatamento até, no máximo, 2020.
Nos últimos anos, o Brasil tem dado um bom exemplo de que isso é viável. Porém, ao mesmo tempo, tem tomado várias medidas contrárias à proteção das suas florestas: áreas protegidas estão sendo reduzidas, enormes projetos de infraestrutura estão ameaçando a região amazônica, e a presidente Dilma Rousseff está se omitindo nas discussões que estão enfraquecendo o Código Florestal – e que estão sendo puxadas pelo lobby do agronegócio no Congresso Nacional.
O debate do Código Florestal evidenciou um enorme gargalo entre políticos e a população que eles representam. Cerca de 90% dos brasileiros são contra uma nova lei florestal que abra espaço para mais desmatamento e que anistie aqueles que desrespeitaram a legislação. E, no entanto, isso está sendo fortemente apoiado pelos parlamentares.
A presidente Dilma está numa encruzilhada. Ela precisa escolher entre o futuro e o passado. A menos que ela aja, o Brasil será a nação que poderia ter parado o desmatamento, mas que não o fez. Quero aproveitar essa oportunidade para pedir à presidente Dilma que dê um passo para o futuro, vetando todas as medidas perversas que reduzem a proteção das florestas no Brasil.
Este ano, o mundo vai se encontrar na Rio +20, a Conferência de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Eu estava presente na Rio 92 e testemunhei: os governos do mundo inteiro sabem o que precisa ser feito, sabem que está faltando ação, urgência e liderança. Essa falta de ação está, não só custando vidas, mas ameaçando nosso futuro.
Enquanto eu recebo esse prêmio, há gente – principalmente jovens – pedindo justiça, igualdade, paz, governança, emprego e um futuro sustentável. E essas são as mesmas demandas que eu ouço quando vou para o meio da floresta amazônica.
Todo mundo concorda que o sistema econômico atual falhou – para as pessoas. E nós precisamos de novos modelos. Novos modelos que permitam que o planeta suporte não só essa geração mas as outras que vêm pela frente.
Em tempos de crise financeira global, mudanças climáticas e guerras, a última coisa que podemos perder é a esperança. A Rio +20 precisa e deve ser o espaço onde iremos dar uma resposta ao apelo das pessoas por um novo paradigma de desenvolvimento, baseado na preservação das florestas, em energias limpas, em empregos verdes e, enfim, em um planeta sustentável.
Quero aproveitar essa oportunidade para convocar os jovens do mundo inteiro a abraçar a luta pelas nossas florestas e pelo nosso futuro. Vocês podem começar indo ao Rio de Janeiro em junho, para dizer aos líderes mundiais o que precisa ser feito.
E eu espero que, até 2020, um de vocês esteja aqui no meu lugar para anunciar ao planeta que, finalmente, superamos o desmatamento. E que a Amazônia, que eu amo, escapou de se tornar uma vaga lembrança de um paraíso perdido.
Desmatamento zero: uma batalha encarada pela juventude e alcançada até 2020. Hoje, esse é o meu sonho.
E termino com uma frase de Jerry Garcia em ‘Greatful Dead’: “Alguém tem que fazer alguma coisa. E é incrivelmente patético que tenha de ser a gente”.
Obrigado!
FONTE: GREENPEACE.ORG e ABRIL.COM.BR
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