Escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) como “Herói da Floresta”, devido aos 15 anos de trabalho para preservar a Amazônia, o diretor do Greenpeace no Brasil, Paulo Adario, afirma que durante este período já sofreu ameaças de morte e precisou de proteção.

Segundo ele, as mortes de pessoas que lutavam pela floresta, como a irmã Dorothy Stang e o casal de extrativistas, José Cláudio Ribeiro, e sua companheira, Maria do Espírito Santo, foram momentos difíceis. Porém, Adario afirma que a violência e a impunidade ainda existem no interior da Amazônia e pode piorar.

Em entrevista ao Globo Natureza, ele criticou o “desmonte de conquistas” e bons resultados para a floresta e disse que a aprovação do Código Florestal pode elevar os conflitos. “A sociedade está aceitando isto com naturalidade”.

Confira os principais trechos da entrevista a seguir:

Desde 1995, Paulo Adario realiza expedições de pesquisa e documentação na Amazônia (Foto: Divulgação / Greenpeace)Desde 1995, Paulo Adario realiza expedições de
pesquisa e documentação na Amazônia
(Foto: Divulgação / Greenpeace)

G1 – Quais foram os momentos mais difíceis nesses 15 anos de trabalho na Amazônia?
Paulo Adario –
Houve muitos momentos difíceis. Sofri ameaças de morte, em 2001 e 2002, que foram muito complicadas. Recebi proteção do governo brasileiro, durante 24 horas. A morte da Dorothy [Stang, missionária americana assassinada no Pará em 2005] foi outro momento duríssimo. A gente se sentiu muito tocado, porque ela estava condenada a morrer e nossa ajuda não chegou a tempo. Ia me encontrar com ela no dia que ela morreu. Foi um dia de desespero, de medo. Várias outras lideranças que eram nossos parceiros morreram, como o Dema e o Brasília. Agora, o Zé Cláudio [assassinado no Pará em 2011, junto com Maria do Espírito Santo].

G1 – Você trabalha no limite?
Adario –
O tempo todo foi sempre trabalhar no limite. Isso leva a um aprendizado sobre como manejar o risco. E isso estabelece recompensas. Em áreas madeireiras, por exemplo, me perguntam: você é o Paulo Adario, aquele que adora se amarrar na árvore? Uma vez, um madeireiro falou que ia me cortar junto com a árvore. Eu comecei a rir e disse: você vai estragar sua motosserra, porque minha cara é dura. Começamos todos a rir e pudemos dialogar. O ambientalista tem preconceito que o cara é bandido, que ele vai te matar. Já o cara pensa que você é um louco varrido, muitas vezes ele acha que você não é do Brasil, acredita que tem um discurso contra o desenvolvimento. Mas, de repente não é nada disso. Você senta e conversa. Somos todos brasileiros.

G1 – Além do senhor, José Cláudio e Maria do Espírito Santo também foram homenageados pela ONU. A irmã de Maria do Espírito Santo discursou que a Amazônia é manchada de sangue e essa mancha continua se espalhando. Ainda existe um clima de medo entre os “heróis da floresta”, inclusive os anônimos?
Adario –
Existe, principalmente nas áreas remotas da Amazônia. Hoje já está melhorando, existe uma governança crescente, o que faz você se sentir bem. Mas a violência ainda existe, porque ainda existem os mesmos problemas históricos que levam à violência. Como a disputa é resultado do avanço da expansão madeireira ou agropecuária, essas comunidades [tradicionais e povos indígenas] tendem a defender seu território e são as primeiras vítimas. Além disso, [a Amazônia] é uma área remota, distante da opinião publica. E existe a impunidade. A chance da pessoa que mata ser condenada é muito pequena. Então, vale a pena matar quem está na floresta. Os dados de violência no Pará são assustadores. Com o Código Florestal, a violência deve aumentar porque o conflito vai aumentar.

Bacia amazônica, área de atuação do projeto (Foto: Divulgação/UEA)Imagem aérea da floresta amazônica. Para Adario, mudança no Código Florestal pode aumentar a violência na floresta (Foto: Divulgação/UEA)

G1 – Quais são as maiores ameaças à Amazônia hoje?
Adario –
Está havendo um processo de desmonte de conquistas que estavam dando resultados muito bons para o Brasil e para a floresta. Uma série de legislações foi colocada em funcionamento, além do próprio Código Florestal, como o projeto pelo qual o Senado evoca para si a palavra final sobre a demarcação de terras indígenas. Outra grande ameaça é o aumento da ilegalidade na extração madeireira. Além disso, o agronegócio brasileiro ficou mais sofisticado do ponto de vista operacional, tomou comissões de meio ambiente do Congresso. E a sociedade está aceitando com naturalidade.

G1 – E quais foram as melhores notícias sobre a Amazônia nesses últimos 15 anos?
Adario –
São várias. Uma delas é que a sociedade civil passou a ter acesso a sistemas de monitoramento do desmatamento. Antes, o INPE [Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais] era uma caixa preta. Isso também ajudou a mídia brasileira a ficar muito mais consciente sobre o desmatamento, o tamanho do impacto, suas causas. Outras coisas positivas são o aumento da consciência dos setores empresariais, a criação de áreas protegidas e a demarcação de áreas indígenas, a melhoria da articulação entre grupos locais e lideranças comunitárias com os governos.

G1 – Ao receber o prêmio, o senhor disse “occupy Rio”. Há uma conexão entre os movimentos “occupy” e a pauta ambiental a ser tratada na Rio+20?
Adario –
O “occupy Rio” saiu na hora do discurso, não foi previsto. Mas acho que é isso mesmo. Os governos estão muito pouco envolvidos com o processo da Rio+20. Há um desânimo geral, ninguém está nem aí, porque o foco é a crise econômica. Então, não existe ainda uma mobilização suficiente para que a Rio+20 seja um sucesso. A gente tem que trazer as pessoas para a rua, levá-las para o Rio, para que digam aos governantes que eles sabem o que tem que ser feito e que elas estão lá para cobrar. Essa é a única maneira de levar importantes líderes mundiais para o Rio e de fazer com que eles levem a sério a agenda da reunião.

G1 – Em outro momento do seu discurso, o senhor falou que os governos sabem o que precisa ser feito, mas falta força e liderança. O que é preciso para que isso ocorra?
Adario –
Falta uma decisão coletiva. Cada país empurra o problema para o outro. Está faltando uma compreensão dos governos de que vivemos em uma comunidade global. Também faltam decisões concretas para priorizar medidas e recursos sustentáveis. É preciso parar de colocar dinheiro em energia nuclear e em carvão e investir em energias limpas.

FONTE: G1 – http://g1.globo.com/natureza/noticia/2012/02/violencia-na-amazonia-pode-crescer-afirma-diretor-do-greenpeace-brasil.html