A mudança climática motiva dezenas de cientistas de universidades públicas mexicanas a pesquisar seus efeitos e descobrir formas de enfrentá-los. A escassez de água, a produção de agrocombustíveis, a degradação do solo e a perda de biodiversidade são alguns itens do menu de pesquisas dentro e fora dos claustros deste país latino-americano muito vulnerável ao aquecimento global.
“Se faz a ciência que a mudança climática necessita. Temos de gerar ciência rígida para quando tivermos o problema podermos apresentar soluções”, disse ao Terramérica o engenheiro Gerardo Sánchez, da Faculdade de Engenharia da Universidade Autônoma de Tamaulipas, no Estado de mesmo nome. Sánchez encabeça a pesquisa “Modelação hidrológica e disponibilidade da água diante da mudança climática na região”, cujo objetivo é traçar padrões de disponibilidade hídrica e de usuários mais vulneráveis, estimar indicadores de vulnerabilidade, avaliar o custo econômico dos impactos e das políticas públicas para usar o recurso de forma sustentável.
A Comissão Nacional da Água estima que Tamaulipas, que este ano sofreu uma grave seca, possui disponibilidade de 5.145 metros cúbicos por habitante ao ano, bem maior do que o índice mínimo de segurança hídrica, necessário para garantir um desenvolvimento adequado e estimado em 1.500 metros cúbicos por pessoa. “O recurso água é o mais importante, por ser transversal a todos os demais”, ressaltou Sánchez. As manifestações do aquecimento global se expressam no México com secas intensas, maior quantidade de furacões fortes, inundações e elevação do nível do mar.
O trabalho científico é vital para decidir medidas de adaptação e mitigação. No Estado de Yucatán, o doutor em parasitologia de peixe, Víctor Vidal, do Centro de Pesquisa e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional, realiza o estudo “Sensibilidade e vulnerabilidade dos ecossistemas costeiros do sudeste do México diante da mudança climática global”, junto com sete colegas de universidades públicas e a organização não governamentais Yaax Beh.
O trabalho é desenvolvido em quatro fases. Na primeira, em 2009, foi integrada a Rede Interinstitucional de Mudança Climática do Sudeste do México, foram analisados dados de longo prazo e gerada informação geográfica e estatística, explicou Vidal, que é mestre em ciências marinhas. Até agora, observou-se que a comunidade de parasitas se recupera em sete anos do impacto dos furacões e que a costa do Estado de Tabasco é a mais vulnerável à elevação do nível do mar, que nessa área avançou 3,5 metros entre 1995 e 2008.
Também se constatou que a recuperação dos mangues afetados por furacões na costa de Yucatán consegue capturar por ano entre uma e sete toneladas de carbono por hectare. Na região, “a mudança climática nos preocupa pela elevação do nível do mar, migração dos peixes para os polos e pela seca, o problema mais grave. No pior cenário, a segurança alimentar estará em risco”, disse Vidal ao Terramérica.
No Estado de Oaxaca, no sul do país, Fidencio Sustaita, diretor do Instituto de Hidrologia da Universidade Tecnológica da Mixteca, dirige desde janeiro a pesquisa “Prevenção e controle da desertificação na região mixteca” sobre uma área de 1,5 milhão de hectares na região montanhosa desse território. “Buscamos integrar um programa de preservação na região, onde a água é insuficiente e o ciclo hídrico está muito alterado”, contou Sustaita ao Terramérica.
Trata-se do território dos indígenas mixtecos, um dos povos mais importantes do país no Estado de Oaxaca, caracterizado por sua pobreza e aridez. A degradação dos solos se deve ao desmatamento, à superexploração do pastoreio e a práticas agrícolas inadequadas, afirmam os pesquisadores. Este ano se conseguiu avaliar o efeito dos reflorestamentos nas propriedades do solo e a eficiência de práticas de conservação de terra e água. Também foi feita a análise espacial e temporal do uso do solo e um planejamento rural sustentável da área estudada.
O projeto atraiu a Planet Action, uma iniciativa sem fins lucrativos que apoia seis pesquisas no México, fundada em 2007 pela provedora francesa de imagens obtidas por satélites e informação geográfica Spot Image e pela norte-americana Environmental Systems Research Institute, fabricante de programas computadorizados especializados. Estas pesquisas precisam atrair as comunidades afetadas e chegar aos ouvidos dos governantes para que fundamentem suas políticas, embora o fazer científico leve tempo. “Notamos predisposição dos governos de Tamaulipas em considerar o trabalho, mas não se pode generalizar”, afirmou Sánchez.
A Rede Interinstitucional de Mudança Climática do Sudeste, formada por 61 cientistas que estudam a sensibilidade, a vulnerabilidade, a mitigação e a adaptação à mudança climática, obtive US$ 460 mil – provenientes da Grã-Bretanha e dos governos federal e estadual – para sete projetos. “O enfoque adaptativo deve considerar a sociedade, é necessário gerar evidência sólida com base nos dados marinhos existentes. O passo seguinte é correlacionar os cenários das mudanças climáticas produzidas pelos modelos de circulação global com dados em nível local”, explicou Vidal.
Ele e mais dois colegas publicarão na revista australiana International Journal for Parasitology a pesquisa “Comunidades de trematódeos em caracóis podem indicar impacto e recuperação de furacões”. Para Sustaita, “é necessário definir com clareza as prioridades dos habitantes e envolver os beneficiários ativamente nas ações do projeto”. O passo seguinte da pesquisa em Oaxaca será definir mais detalhadamente o uso atual do solo mediante imagens via satélites fornecidas pela Planet Action.
Fonte: IPS
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